No azul

Da lama ao lucro: após um ano da tragédia, Vale já recuperou valor de mercado

Um dia antes do rompimento, ações da mineradora valiam R$ 56,15. No último dia 17, os papéis chegaram a R$ 57

Por Queila Ariadne e Rafaela Mansur
Publicado em 26 de janeiro de 2020 | 03:00
 
 
 
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Passado um ano da tragédia em Brumadinho, Andresa Rodrigues, 42, ainda não se recuperou da perda do único filho, Bruno Rocha Rodrigues, 26, uma das 270 vítimas do rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão. “O que eles me levaram é irreparável. A Vale lucra, ela ganha. Quem perdeu fomos eu e as famílias das outras 269 vítimas”, lamenta. Para a mineradora, a recuperação já veio. Ela conseguiu tirar as finanças da lama e retomar o lucro.

Neste mês, as ações voltaram ao mesmo patamar de antes do desastre. Um dia antes do rompimento, elas valiam R$ 56,15. No último dia 17, os papéis ultrapassaram a marca, chegando a R$ 57. Mesmo com a produção menor em Minas e os gastos com a reparação, a empresa conseguiu chegar ao terceiro trimestre de 2019 com uma receita líquida 7,38% maior em relação ao mesmo período do ano anterior (antes da tragédia). Já a economia mineira ainda não conseguiu se recuperar da lama.

A barragem se rompeu em janeiro de 2019. Em março, a Vale já acumulava um prejuízo de R$ 6,46 bilhões. Nos três meses seguintes, as perdas caíram para R$ 384 milhões. No terceiro trimestre, a mineradora conseguiu reverter o déficit para um lucro de R$ 6,5 bilhões, 13,7% maior em relação ao mesmo período do ano anterior. Em Minas Gerais, a recuperação não seguiu o mesmo ritmo. Nesse mesmo período, o PIB encolheu 1,5%. Só a indústria extrativa mineral retraiu 24,4%, segundo dados da Fundação João Pinheiro (FJP).

O pesquisador da FJP Thiago Almeida explica que, para a Vale, os efeitos negativos se concentraram no primeiro trimestre, mas, depois, a empresa deu início à estabilização. No entanto, a economia do Estado ainda convive com os impactos porque, além do setor da mineração, toda a cadeia foi afetada. “No primeiro semestre de 2019, o Produto Interno Bruto (PIB) ficou nulo. Fizemos uma simulação e, se não fosse a tragédia, ele poderia ter crescido 1,1%. A indústria extrativa caiu cerca de 30% no primeiro semestre e impactou setores como o de transporte, principalmente o ferroviário”, afirma Almeida.

De acordo com a Vale, o principal motivo do aumento da receita é a variação do preço do minério de ferro de referência. “Mas é importante ressaltar que outros fatores, além do volume de produção, também influenciaram o lucro, como custos, despesas, variação cambial, despesas não-recorrentes, etc.”, diz a mineradora, por meio de nota. No terceiro trimestre do ano passado, quando a Vale conseguiu reverter o prejuízo, cada tonelada de minério era comercializada por US$ 102 no mercado internacional. O valor é 53% maior do que o preço médio do mesmo período de 2018.

Outra explicação para o avanço da receita da Vale é o aumento da produção da Vale na região Norte do país, nas minas de Carajás e S11D, no Pará. “A Vale já vinha desenvolvendo a produção no sistema Norte, que iria ganhar peso de qualquer forma por causa dos investimentos que vinham sendo feitos. E, no mesmo período em que a produção caiu bruscamente em Minas, a do Norte cresceu muito, o que compensou o resultado em termos nacionais”, afirma o diretor de estudos e políticas macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Ronaldo de Castro Souza Júnior, ressaltando também a importância do aumento do preço do minério de ferro no mercado.

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