Rio de Janeiro. Os proprietários de veículos envolvidos em recall vão ser comunicados diretamente sobre os riscos a que seus carros estão submetidos e como fazer para consertá-los. O aviso de recall ficará inscrito no documento do carro (Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo, o CRLV) até que a convocação seja atendida. Com essas medidas, o que se espera é aumentar o atendimento. Entre 2014 e 2018, dos 9,5 milhões de automóveis envolvidos nos recalls, apenas 4,6 milhões passaram pelo conserto.

Esses são os dois pontos principais da portaria interministerial que cria o Serviço Nacional de Notificação de Recall de Veículos, que será assinada hoje pelos ministérios da Justiça e Segurança Pública e da Infraestrutura. 

O Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), em conjunto com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), trabalha nas melhorias tecnológicas para implementar o serviço. Segundo o Denatran, o sistema utilizará todas as formas de comunicação que o governo tem com o cidadão, como Portal de Serviços (Gov.br)e o próprio Denatran, a Carteira Digital de Trânsito (CDT) e o Sistema de Notificação Eletrônica (SNE), além da remessa postal.

Sem conhecer o texto final da portaria, mas tendo participado da discussão nos últimos meses, Luiz Carlos Moraes, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), acredita que as regras vão aumentar a efetividade das campanhas de recall. “A expectativa é que as medidas façam com que os chamamentos atinjam algo próximo da totalidade dos veículos envolvidos nas convocações, o que sem dúvida aumentará o já elevado nível de segurança dos automóveis vendidos no país”, diz.

Segundo Luciano Timm, titular da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), responsável pelo monitoramento dos recalls no país, fazer o consumidor atender às convocações é um desafio mundo afora, e não só quando se trata de automóveis. Se contabilizados todos os produtos que tiveram chamados por trazer risco à vida, à saúde e à segurança do consumidor, nos últimos cinco anos, pouco menos de um quarto passou pelo reparo. Por isso, também será editada hoje uma atualização da portaria com as regras gerais para realização de recall no país.

As regras, diz o secretário, passam a seguir os parâmetros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Elas preveem que as convocações, a exemplo do que já acontece em outros países, passem a usar “indutores de comportamento” que ampliem o atendimento ao recall.

“Nos Estados Unidos, por exemplo, na convocação para a troca do airbag enviada ao consumidor há fotos reais de pessoas que se acidentaram devido ao problema relatado. Essa é uma estratégia que deixa mais claro os riscos e induz o consumidor a atender ao chamado para resolver o problema”, diz Leonardo Marques Albuquerque, coordenador de consultoria técnica e sanções administrativas da Senacon.

Monitoramento

A portaria que será assinada hoje pelos ministérios da Justiça e Segurança Pública e da Infraestrutura também abre a possibilidade de as convocações serem feitas em outras mídias que não as tradicionais, como redes sociais, mas estabelece o monitoramento do atendimento dos chamados, o que pode levar a uma exigência de mudança de estratégia. Pelas novas regras, a informação de recall deve ser feita em local destacado por ao menos cinco anos. Só após esse período, pode-se pedir que a Senacon avalie o encerramento do recall.

As edições das portarias serão acompanhadas por uma campanha educativa que entrará no ar nas redes sociais também hoje. “O consumidor precisa entender que recall não é brincadeira. É preciso que fique claro o risco a que ele está se submetendo. Estamos fazendo também um trabalho para que seja claro: se há risco de morte, não se pode fazer uma convocação dizendo que pode haver lesão”, diz Nicolas Eric de Souza, coordenador de consumo seguro e saúde da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon).

No pacote de medidas voltadas à segurança do consumidor está ainda um acordo de cooperação técnica entre a Senacon e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Para Paulo Coscarelli, coordenador da diretoria de avaliação da conformidade do Inmetro, órgão que mantém o maior banco de acidentes de consumo do país, o próximo passo para aumentar a segurança dos consumidores deveria ser a constituição de um sistema de alerta de acidentes que incluísse os hospitais, a exemplo do que existe em Estados Unidos e Canadá.

“Hoje nos baseamos nos dados que vêm de fora. Enquanto nosso banco de dados recebeu 309 relatos de consumidores em 2018, o do Canadá somou 1.770. Mas nossa realidade socioeconômica é diferente, e a melhor forma de mapear acidentes de consumo, além do relato do cidadão, é no atendimento médico”, explica.