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Guerra na Ucrânia: 4 meses e impacto catastrófico no orçamento dos brasileiros

Desde o início da invasão russa, brasileiro observa o encarecimento nos preços de combustíveis e alimentos sem previsão de melhora no cenário

Por Simon Nascimento
Publicado em 24 de junho de 2022 | 03:00
 
 
 
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Mesmo ocorrendo do outro lado do oceano, a guerra entre Rússia e Ucrânia tem efeito catastrófico sobre o orçamento das famílias brasileiras. O conflito completa quatro meses nesta sexta-feira (24) desde a ordem de invasão do presidente Vladimir Putin às cidades ucranianas, e encareceu do pãozinho do café da manhã aos legumes e hortaliças que chegam à mesa dos brasileiros, já que houve um grande desequilíbrio no comércio mundial de commodities. 

A Organização das Nações Unidas (ONU) estima quase 8 milhões de refugiados e cerca de 4 mil mortes nos embates no leste europeu. Além das severas consequências humanitárias no perímetro de confronto entre as tropas russas e ucranianas, a ONU também alerta para risco de escalada da fome em todo o planeta por reflexo do conflito. 

O cenário é aventado em função das inúmeras sanções econômicas aplicadas à Rússia e empresários russos. Também pesa o desequilíbrio de preços de combustíveis, fertilizantes, grãos e alimentos que interferem diretamente na rotina diária da população não só do Brasil, mas em outros países. Se considerado apenas o cenário nacional, exemplos de produtos que tiveram os preços encarecidos por consequência da guerra vão desde a gasolina e o diesel até o óleo de soja utilizado nos preparos de refeições diárias. 

 

O diesel, impactado pelo desequilíbrio em torno do custo do barril de petróleo, que deixou o patamar de U$S 93 e ultrapassou U$S 120 no mercado internacional, registrou um encarecimento de 23%, enquanto a gasolina subiu 10%. Já o óleo de soja encareceu 21% e o litro pode ser comprado por valores acima de R$ 10 atualmente. O aumento ocorreu porque a Ucrânia, potência mundial na produção de óleo de girassol, reduziu o abastecimento ao mercado.

Neste contexto, países que utilizam o insumo, como a China, voltaram as atenções ao óleo de soja gerando uma pressão de demanda. Outra matéria prima em que a Ucrânia é protagonista no abastecimento mundial é o trigo. O avançar do conflito limitou os trabalhos no campo e o escoamento do grão a outros países como o Brasil, que buscaram mercados alternativos como a Argentina. 

O resultado foi um custo 26,8% maior na tonelada de trigo cotada no mercado internacional, segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Na mesa, o brasileiro nota o impacto pagando quase R$ 20 no quilo do pão francês.

Agronegócio

Além do incremento de custos adicionais com transporte frente a alta do diesel, no agronegócio, a dificuldade para obter fertilizantes também pressiona a produção no campo. Cerca de 81% dos fertilizantes utilizados no Brasil vêm de outros países. Deste total, 28% do cloreto de potássio aplicado no campo e 31% dos fosfatados partem da Rússia em direção às terras brasileiras.

Levantamento da área de custos agrícolas do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da USP, aponta que o cloreto de potássio, utilizado em larga escala no campo, subiu 153% no primeiro trimestre deste ano, em relação ao mesmo período de 2021. Na ureia, o crescimento foi de 97,3%, enquanto os fosfatados foram elevados em 63,6%.

Por que os brasileiros foram tão impactados? 

Na avaliação do professor da Fundação Dom Cabral Paulo Vicente, a dependência brasileira, escancarada com os desdobramentos da guerra, evidencia erros de gestão nos últimos 30 anos e nas relações de mercado. “Sempre se ignorou riscos e as atenções para matérias primas eram voltadas apenas para o custo baixo. Mas um dia esse risco chega, principalmente quando se compra de ditaduras”, afirmou o docente sobre os problemas enfrentados com fertilizantes vindos da Rússia. 

O pesquisador do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da Fundação Getúlio Vargas Leonardo Paz afirma que os impactos poderão ser ainda mais severos ao agronegócio no segundo semestre. Ele cita possibilidades de mais pressão sobre preços de fertilizantes por dificuldades de escoamento dos químicos, cenário semelhante ao dos grãos.  

“Já há silos de grãos na Ucrânia prontos para serem exportados, mas não conseguem sair porque os russos bloqueiam o Mar Negro”, explicou Paz. Para ele, a alta de preços no Brasil, que também é verificada em todo o mundo, pode ser amenizada por políticas públicas. “Se o Brasil tivesse ainda uma política de estoque de grãos para momentos de flutuação de preços, os efeitos seriam menores hoje, por exemplo. Mas esse estoque você faz ao longo dos anos, não se constrói de um dia para o outro”, afirma. 

Paz também sugere criação de subsídios, que poderiam vir a partir da arrecadação extra de impostos pelo peso da inflação, mas também da distribuição de lucros da Petrobras, já que a União recebeu, nesta semana, mais de R$ 8 bilhões em dividendos. 

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