REFLEXOS

Teto do ICMS pode retirar R$ 4,5 bilhões do Fundeb anualmente nos municípios

Cálculo é da Confederação Nacional dos Municípios que estima uma perda anual de R$ 18 bilhões com a redução das alíquotas nos estados

Por Simon Nascimento
Publicado em 07 de julho de 2022 | 10:00
 
 
 
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A limitação das alíquotas do ICMS nos Estados entre 17% e 18%, que entrou em vigor em junho para frear o aumento no preço dos combustíveis, energia elétrica e telecomunicações no Brasil, pode retirar até R$ 4,5 bilhões da educação pública nos municípios brasileiros anualmente. A verba faz parte da participação municipal no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). O programa tem 60% da sua composição orçamentária oriunda do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). 

De acordo com números do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), entre 2019 e 2022, o Fundeb distribuiu R$ 666,4 bilhões aos municípios no Brasil. Deste montante, R$ 394,3 bilhões foram de arrecadação do ICMS nos Estados. O impacto da redução na cobrança do imposto para a receita da educação nas prefeituras foi calculado pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). 

A entidade projeta que, anualmente, o Fundeb deve perder até R$ 20 bilhões com a limitação do imposto recolhido nos estados. O dinheiro destinado pelo Fundo é utilizado para arcar com despesas de manutenção e desenvolvimento educacional. Cerca de 60% do que vêm do Fundo devem ser aplicados na remuneração de professores e profissionais da pedagogia. Os 40% restantes devem ser direcionados às demais ações como merenda, infraestrutura das escolas, mobiliário, expansão de atividades de tempo integral e material didático. 

O movimento Todos Pela Educação emitiu nota contrária à medida, assim como outras instituições como a Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca). O temor é que faltem recursos, já no final deste ano, para comportar despesas adicionais, como o recém aprovado piso salarial do magistério que prevê um reajuste de 33,24%. 

Na avaliação do líder de Relações Governamentais do Todos Pela Educação, Lucas Hoogerbrugge, o corte no ICMS pode anular o ganho obtido com a aprovação do Novo Fundeb, que prevê um aporte financeiro maior do governo federal: saindo dos atuais 12%, até 23% em 2026. “Estamos tirando dinheiro da educação, saúde, para subsidiar o preço da gasolina na bomba. E não vou entrar no mérito se é positivo ou não. Óbvio que somos sensíveis à gasolina e grande inflação. A questão é que a educação não pode pagar por isso”, analisou. 

Hoogerbrugge ainda afirma que a proposta, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), interrompe um ciclo de melhorias na educação iniciado ainda no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) que criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) em 1996. O programa foi substituído pelo Fundeb em 2006, na gestão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ampliando o número de alunos beneficiados. 

“E em 2020, o Congresso aumentou os valores para criar uma situação mais confortável aos Estados e municípios. Mas agora a gente vê um movimento totalmente na contramão que mostra um completo descompromisso e falta de priorização da educação que não se tinha visto até hoje”, criticou Lucas. O representante do Todos Pela Educação lembrou, também, que a limitação no orçamento ocorre em momento que deveria se investir mais para reparar os danos do período de fechamento das escolas durante a pandemia. 

Um estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre as consequências da crise sanitária na aprendizagem, divulgado em maio deste ano, mostrou que os ganhos médios dos estudantes brasileiros podem ser 9,1% menores nas próximas décadas em função da interrupção das atividades escolares considerando todos os países do G20. Segundo Hoogerbrugge, o impacto educacional varia por rede de ensino tanto. 

Ele lembra que para além do déficit em aprendizagem, outros prejuízos são abandono escolar e saúde mental dos estudantes. “É um período de pós-pandemia, com quase dois anos de escolas fechadas, em que se deveria investir mais em educação. Precisaríamos de busca ativa, aulas de reforço e garantir tempo integral para que os estudantes tivessem mais oportunidades de aprender”, argumentou.  

Compensação 

A expectativa dos estados e municípios para reduzir os danos na educação está na derrubada, pelo Congresso, do veto do presidente Jair Bolsonaro (PL) a uma emenda da Lei Complementar 194, que instituiu o teto do ICMS. O texto previa a compensação da verba perdida em 2022 com a arrecadação tributária. O repasse aos demais entes federativos só seria interrompido quando as alíquotas do tributo retornassem aos patamares vigentes antes da publicação da lei complementar. 

Ao vetar, o presidente Jair Bolsonaro justificou que a medida geraria impacto fiscal para a União e ampliaria “possíveis desequilíbrios financeiros”. Presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Marcus Vinicius da Silva Bizarro classificou o teto do ICMS e outras medidas como a aprovação do piso salarial do magistério de "irresponsáveis". O gestor diz que a União aumentou as despesas das prefeituras sem indicar fonte de custeio e reduziu as receitas.

“Que o governo federal encontre uma maneira que essas perdas que estão tendo, principalmente na educação e saúde, que encontrem uma forma de custeio. Nós precisamos saber como vamos manter a escola funcionando com qualidade, e sem falar em investimentos, sem uma alternativa fonte de receita”, assinalou Marcus. A reportagem pediu um posicionamento ao Ministério da Educação (MEC) sobre a redução no orçamento do Fundeb e aguarda retorno. 

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