BRASÍLIA - Vilmar Kalunga (PSB) foi reeleito prefeito de Cavalcante (GO), na região da Chapada dos Veadeiros, neste domingo (6), com 3.331 votos (53,79% dos válidos).
Ele foi o único quilombola eleito em 2020, quando venceu o pleito com 35,95% dos 1.959 votos válidos – o município não tem segundo turno por causa do baixo número de eleitores.
Vilmar Kalunga tem 44 anos, é casado, tem superior completo e declarou um patrimônio de R$ 531.681 à Justiça eleitoral.
- Cavalcante é a terceira cidade no país com a maior proporção de moradores quilombolas, segundo o IBGE.
- A cidade, que fica no nordeste goiano, é a única do Estado com a maioria da população composta por quilombolas. Eles são 5.473 (57%) dos 9.589 moradores do município.
- Quilombolas são os remanescentes de quilombos, locais em matas onde negros escravizados se refugiaram após escaparem dos cativeiros.
Alcântara (MA) também elegeu um quilombola como prefeito no último domingo. Nivaldo Araújo recebeu 54,41% dos votos válidos.
- Alcântara é o município com a maior proporção de quilombolas no país – 84,6% dos 15.616 habitantes
- O município maranhense é o terceiro maior número absoluto desta população no país, atrás de Senhor do Bonfim e Salvador, ambos na Bahia.
Com 74 mil habitantes e a 380 km de Salvador, Senhor do Bonfim tem 15.999 quilombolas, mas teve apenas um candidato à prefeitura do grupo neste ano. O comerciante Rigoberto Batista da Silva (PRTB) saiu derrotado com 0,53% dos votos no pleito que elegeu Laércio Junior (União).
Senhor do Bonfim nunca teve um prefeito ou vice vindo de comunidades tradicionais. Na última eleição, também não elegeu nenhum representante do grupo entre os 15 vereadores da Câmara.
- O Brasil tem 1,3 milhão de pessoas que se identificam como quilombolas. O número corresponde a 0,65% da população total do país.
- O Brasil teve 3.590 candidatos quilombolas nas eleições municipais deste ano. O número representa 1,3% do total de candidaturas no país.
- Minas Gerais teve o maior número de quilombolas na disputa a cargos municipais neste ano, com 535 – entre prefeitos, vices e vereadores.
Em 2012, Darcira foi a primeira prefeita quilombola eleita no país – em Açucena (MG) –, sendo reeleita em 2016, segundo a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).
Kalungas formam maior quilombo do país
Grande parte dos quilombolas de Cavalcante ainda vive como os antepassados, em comunidades distantes da área urbana, sem energia elétrica nem saneamento, onde cavalos e burros são os únicos meios de transporte.
O prefeito Vilmar nasceu no Vão do Moleque, no Quilombo Kalunga. Presidiu a associação que representa os moradores do território e se tornou conhecido após atuar pela demarcação de terras na região. Além disso, é formado em educação no campo e tem pós-graduação em ciências da natureza e matemática.
Os kalungas formam o maior quilombo do Brasil. Em Goiás, ocupam terras de Cavalcante, Teresina e Monte Alegre. São descendentes de escravizados que conseguiram fugir dos cativeiros e libertos que trabalhavam nas minas de ouro de Goiás e que se refugiaram no Vão das Almas, em meio a serras de difícil acesso no nordeste goiano.
Alguns dos primeiros kalungas jamais saíram do território, que começou a ser povoado pelos escravizados há mais de 300 anos. Mesmo com a escravidão abolida, em 1888, muitos acreditavam que a prática continuava vigente no Brasil. Por medo de serem capturados, preferiam viver isolados no quilombo. Criaram uma cultura única, mantida pelos seus descendentes.
Comunidade vive sob ameaça de mineração
Em 2021, o território Quilombo Kalunga foi reconhecido por um programa ambiental da ONU como o primeiro Território e Área Conservada por Comunidades Indígenas e Locais (Ticca) do Brasil. O título internacional é concedido a regiões que mantêm a conservação da natureza e asseguram o bem-estar de seu povo.
Enquanto os pastos e as monoculturas avançam aceleradas por quase todo Goiás, onde resta apenas 30% do cerrado, em terra Kalunga a cobertura da vegetação nativa é de 83%, conforme dados da plataforma MapBiomas. Por outro lado, a comunidade é considerada o território quilombola mais ameaçado pela mineração no país.
A região recebeu 180 requerimentos minerários em sobreposição a sua área. As informações constam no estudo “As Pressões Ambientais nos Territórios Quilombolas no Brasil”, realizado pelo Instituto Socioambiental em conjunto com a Conaq.
Segundo a pesquisa, cerca de 66% de toda área do quilombo é pressionada por requerimentos minerários. Além disso, a comunidade Kalunga de Goiás está entre os 10 territórios mais pressionados por obras de infraestrutura planejadas e cadastros de imóveis rurais.
Entende-se por pressão a medida do risco iminente de ocorrer impacto ambiental no interior de uma comunidade decorrente da implementação de uma obra de infraestrutura ou da sobreposição com registros ou requerimentos minerários. No caso da exploração de minérios, foi usado a base de dados das solicitações feitas à Agência Nacional de Mineração (ANM) em 2023.