Legislativo

Mineiros da ‘Bancada da Bala’ se mostram alinhados nas pautas

Parlamentares estaduais e federais eleitos e reeleitos concordam em temas de segurança pública; foram 6 vitoriosos à Assembleia e quatro à Câmara dos Deputados


Publicado em 09 de outubro de 2022 | 06:00
 
 
 
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A ‘bancada da bala’ mineira que chega ao Poder Legislativo - na Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional e - a partir de 2023 faz coro às pautas controversas de segurança pública defendidas pelo presidente da República Jair Bolsonaro (PL) e pelo ex-juiz Sergio Moro (União) quando ministro da Segurança do atual governo.

Defesa do excludente de ilicitude para agentes de segurança, redução da maioridade penal e diminuição da autonomia de governadores para escolher comando da Polícia Militar são pautas comuns ao grupo de parlamentares.

Entre membros de forças civis e militares, Minas terá 10 parlamentares entre cabos, sargentos e delegados, sendo seis na ALMG e quatro na Câmara dos Deputados. São dois eleitos a mais do que o registrado na eleição de 2018.

No cômputo geral, entre 2018 e 2022, a bancada da bala na Câmara Federal passou de 28 para 34 cadeiras, uma alta de 21,4%, segundo levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública com dados do TSE. 

Na ALMG, dos membros da bancada apenas o Delegado Heli Grilo (União) não se reelegeu.  Os quatros bolsonaristas legitimados em 2018 foram reeleitos para continuar o mandato: Sargento Rodrigues (PL), Coronel Henrique (PL), Coronel Sandro (PL) e Delegada Sheila (PL). A partir de 2023, o quarteto do partido de Bolsonaro ganha o reforço de Caporezzo (PL), vereador de Uberlândia, eleito com mais de 52 mil votos. Da categoria, também se apresentará o Delegado Christiano Xavier, filiado ao PSD, de centro-direita.

Em Brasília, o Subtenente Gonzaga (PSD) não se reelegeu, mas a categoria ganhou mais dois militares para se juntar ao Cabo Junio Amaral (PL) e ao delegado Marcelo Freitas (União). O bombeiro militar Pedro Aihara (Patriota), rosto marcado pela atuação como porta-voz da tragédia de Brumadinho, e a Delegada Ione Barbosa (Avante), candidata mais votada em Juiz de Fora, na Zona da Mata, ambos também de siglas do centrismo.  

Mesmo que o princípio da hierarquia militar não seja comum à carreira de todos os eleitos, as ideias defendidas pela categoria estão alinhadas. 

Muro contra RRF
No âmbito estadual, a oposição à adesão de Minas ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) deve unir o tarimbado Sargento Rodrigues e o novato Caporezzo. “O governador [Romeu Zema (Novo)] é um cara até bem intencionado, mas quando eu vejo ele falar do RRF, eu que estou aqui há seis mandatos, com formação acadêmica em comunicação e direito,  vejo que ele desconhece a profundidade dos impactos do regime”, diz Rodrigues, que promete ser um muro na ALMG, caso Zema não revise os cortes nas carreiras da categoria previstas no projeto. “Não podemos permitir que nossos servidores da segurança pública paguem o preço, uma vez que eles têm prestado o serviço excepcional e de excelência”, defende Caporezzo.

Embora seja tema para o Congresso e não da alçada da ALMG, a ampliação do excludente de ilicitude – barrada pela Câmara no “pacote anticrime” do ex-ministro da Justiça Sergio Moro – está no discurso e é mais um dos pontos em comum entre os dois militares. “Não é justo que um policial que vai agir ali repelindo uma injusta agressão contra si ou a terceiro tenha que se preocupar em dar um, dois, dez ou quinze disparos em um criminoso. Ele tem que atirar até o criminoso parar a agressão, se ele vai virar uma peneira por causa disso, não é problema do policial”, diz Caporezzo. “Não existe isso de licença para matar, mas apenas para resguardar a ação dele enquanto um pai de família e servidor público”, defende Rodrigues.

Bangue-bangue
Em outras pautas que cabem ao Congresso e não a ALMG, Caporezzo demarca o espectro ideológico que defende. Sobre revogar pontos do Estatuto do Desarmamento, uma das bandeiras de Bolsonaro, ele dispara: “Por mim, o cidadão ordeiro tinha que ter o direito de portar sua arma de fogo, colocá-la na cintura, inclusive, de maneira ostensiva, à mostra, e sair para rua como na época do bang-bang do Velho Oeste. Estado que tem medo do cidadão armado tem sérias inclinações para a tirania”.

Militar da reserva, Coronel Sandro também demonstra devoção à possibilidade de mais armas circulando entre civis. “Sou armamentista, defensor da ideia de que as pessoas tenham a liberdade de escolher se vão ter a posse e o porte de armas. Sou e abraçarei qualquer ação que venha revogar o Estatuto do Desarmamento”, diz.

Com exceção de Sandro, a autonomia das instituições militares para indicar seus comandantes, diferente do que ocorre atualmente, em que o chefe do Executivo nomeia o comando das Polícias Militar e Civil com base nos seus critérios, é defendida por todos os ouvidos, sendo a criação de uma lista tríplice a maneira de execução mais citada.

“Sou relator do projeto que quase passou nas últimas semanas na Câmara para trocar esse modelo político de escolha dos comandantes gerais, no caso a PM.O que eu propus no relatório é a criação de uma lista tríplice para que a tropa participe de um filtro. A decisão continua do governador, mas dentro de um rol mais limitado”, argumenta o belo-horizontino Junio Amaral

Até criança
A revisão da redução da maioridade penal, hoje de 18 anos, é outra pauta uníssona que só varia na intensidade. “Não importa se ele tem 17 ou 5 anos de idade. Se uma criança de 5 anos pega uma faca e corta o pescoço do pai enquanto ele dorme, ele deve ser condenado como se adulto fosse. E, se ele não tem entendimento do que está fazendo, não pode ser condenado”, radicaliza Caporezzo mais uma vez. Bem mais amena, Ione defende a redução para os 16 anos. “Entendo que se esse jovem tem aferição para votar, entendo que ele também pode aferir o que é crime e o que não é”, diz.

“Adolescentes de 14 e 15 anos têm a perfeita noção, num mundo que a informação está disponível por diversos meios em escola, televisão, internet. Diferente da criança de 1940, todos têm acesso à informação. Sou a favor e, mais ainda, para crime s hediondos como homício e estupro, esse adolescentre ou pré-adolescente tem que ser julgado com o rigor da lei, tem que mudar a legislação”, opina Sandro.

“Pegaram uma regra de punição e colocaram na mesa, foi uma imbecilidade”, fala Rodrigues sobre legislação especial prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que prevê punições para crimes cometidos por brasileiros com menos de 18 anos de idade. “O crime tem que ser julgado pela sua gravidade e não porque ele é maior ou menor”, completa. “A minha proposta é que o menor seja punido com a metade da mínima e metade da máximas das penas previstas para todos os crimes”, calcula o veterano.

Representatividade e interesses

Para especialistas, a presença  de policiais em espaços políticos é reflexo positivo no que diz respeito à democracia. “Imaginando que a nossa sociedade é plural, diversa e tem vários valores, desde os mais conservadores até os mais  progressistas é importante que o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados, Senado e as Assembleias estaduais  sejam reflexos dessa diversidade, senão a gente pode ter uma representação ruim, enviesada. Portanto, se tem número suficiente, mobilizado na sociedade para eleger representante,  não é apenas legítimo como até necessário”, analisa o cientista político e professor do Ibmec BH, Adriano Cerqueira.

Por outro lado, apesar de legitimados pelo eleitorado conservador, a bancada da bala - o primeiro ‘B’ na sigla ‘Bala, boi e bíblia’, apelido dado às Frentes Parlamentares da Segurança Pública, Agropecuária e Evangélica - representa diversos conflitos de interesse econômicos. 

“Eles são representantes da indústria de armamentos pessoais. Então, há todo o interesse desse setor em aumentar a produtividade e a lucratividade a partir de políticas que são enviadas por esses candidatos eleitos, que flexibilizam o uso das armas para uso pessoal e para caça”, diz Paulo Ramirez, cientista político e professor de sociologia da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

O cientista esclarece que pautas como a redução da maioridade penal, por exemplo, demandaria aumento de investimentos em segurança pública com construção de novos presídios, compra de viaturas e aplicação de novas tecnologias como câmeras e outros equipamentos.

“Não à toa, policiais acabam se ligando à questão da liberdade econômica porque eles observam que, quanto menos o Estado intervir com regras que limitem a questão do porte de armas e até compra de munições, isso  acaba favorecendo o livre mercado, desde que também menos impostos sejam cobrados para esse setor que produz todos esses artigos”, afirma.

 

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