A primeira vez que a atriz Fábia Mirassos travou contato com “Vienen Por Mí”, texto autobiográfico da autora chilena Claudia Rodriguez, foi em 2021, durante uma leitura dramatizada, realizada virtualmente. Foi o suficiente para que se sentisse arrebatada.
“Apesar de ser uma obra que fala da experiência de uma artista de outra nacionalidade, com todas suas particularidades, era também algo que dialogava com a minha história. E aquilo me deixou em choque. E, então, eu entendi que o texto não falava apenas de mim, Fábia, mas, sim, da experiência travesti – e, como a autora, eu também sou travesti”, descreve ela, lembrando que, já naquele momento, entendeu que precisava montar aquela peça no Brasil – “logo eu, que nunca tinha pensado em fazer um solo”.
Da leitura, realizada durante o projeto Histórias de Nossa América, do Coletivo Labirinto, de São Paulo, Fábia já partiu para conversas com Claudia e, em seguida, começou a trabalhar no projeto, que chega à capital mineira nesta sexta-feira (30), cumprindo temporada no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte (CCBB BH) até o dia 23 de setembro.
O espetáculo, com direção de Janaina Leite, referência em teatro documental e autoficção no Brasil, é descrito pela atriz como um manifesto que, escrito em 2017, funciona também como um catalisador da experiência cisdivergente.
“Ela faz um grande ‘recorta e cola’ das experiências travestis a partir das vivências dela. E, quando falo em ‘recorta e cola’ é porque essa é a sensação que temos, no sentido de ser tudo meio recortado: sociedade, família, a própria experiência corporal…”, reflete, acrescentando que as narrativas espelham outras tantas vivências – “porque, apesar das individualidades, de toda diversidade que há, travesti é travesti em qualquer lugar, para o bem e para o mal – e, social, profissional e afetivamente falando, costuma ser mais para mal”, comenta.
“Foi isso (esse universalismo) que mexeu muito comigo. Fiquei pensando em como somos diferentes, mas, ao mesmo tempo, nossas vivências são idênticas em qualquer lugar do mundo, seja em relação a como a sociedade, a família ou os homens nos tratam”, assegura, celebrando que, no palco, sua voz ecoe textos escritos por alguém que também diverge da normatividade cis.
“Um fato que, por si só, já é incrível, porque, ao longo de muitos anos, as nossas histórias sempre foram contadas por autores cisgênero”, pontua, comemorando ainda que, hoje, “o público parece começar a se interessar em saber o que a gente tem a dizer por nós mesmas”.
E esse diálogo com a plateia, aliás, ganha atalhos pela forma atrativa como o texto se desenrola, misturando diferentes linguagens, como poesia, performance, monólogo e stand-up. “A vantagem dessa mistura e de se tratar de uma obra integralmente poética, quase filosófica, é que isso acaba nos aproximando dessa sociedade majoritariamente cisgênero, gerando empatia em algumas pessoas e possibilitando uma humanização tão necessária”, observa.
SERVIÇO:
O quê. ‘Vienen Por Mí’, montagem solo de Fábia Mirassos
Quando. A partir desta sexta (30), às 21h. Até dia 23/9. De sexta a segunda, às 21h.
Onde. Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil Belo Horizonte - CCBB BH (praça da Liberdade, 450, Funcionários)
Quanto. A partir de R$ 15 (meia-entrada). Ingressos disponíveis na bilheteria do CCBB BH e no site ccbb.com.br/belo-horizonte