Milton Nascimento era um dos artistas que disputava o Grammy, o prêmio mais importante da música mundial, no último domingo (3). Bituca acabou não levando na categoria de Melhor Álbum Vocal de Jazz pelo disco Milton + Esperanza, lançado em agosto. O gramofone foi para Samara Joy, que já havia vencido Anitta na categoria de Artista Revelação em 2023. No entanto, o que realmente virou notícia foi o descaso da organização da premiação com o artista.
A cantora e compositora americana Esperanza Spalding, que gravou o álbum com Bituca, usou as redes sociais para criticar o Grammy por não ter reservado um lugar para o cantor e compositor mineiro. Na verdade, segundo a equipe do artista do Clube da Esquina, Milton "não foi barrado e nem privado de ter um assento na cerimônia", mas que o lugar destinado para a lenda brasileira foi a arquibancada. O ocorrido teve uma repercussão bastante negativa entre os brasileiros - anônimos e famosos - que consideraram o fato um desrespeito a um dos maiores artistas vivo do país e até do planeta. Em breve, Milton vai ganhar uma devida homenagem já que será o enredo de uma das mais tradicionais escolas de samba do Rio, a Portela. A agremiação desfila na terça (4) na Marquês de Sapucaí.
O filho e empresário de Milton Nascimento, Augusto Kesrouani Nascimento, postou uma homenagem ao pai em suas redes sociais em que enaltece a trajetória pessoal e profissional de Bituca e finaliza: "É impossível que exista algo mais poderoso, potente e maior do que tudo isso no mundo. Ele é - e sempre será - o maior".
Confira o texto na íntegra:
"Imagine um menino que perdeu a mãe biológica nos primeiros anos de vida, que já não tinha o "pai", que nunca o havia assumido, e que então é adotado por um casal incrível, e vai com eles para o interior de Minas.
Tudo isso, nos anos 40, em um Brasil ainda mais racista do que nos dias de hoje.
Imagine que o mesmo menino não podia sequer entrar no clube da cidade, devido a cor de sua pele.
Ainda na infância, ele descobriu o fascínio pela música.
Na adolescência, começou a tocar "nos bailes da vida, ou num bar, em troca de pão".
No início da vida adulta, se mudou para Belo Horizonte, sem nenhuma perspectiva ou facilidade, apadrinhamento ou família abastada, apenas o seu dom.
Trabalhou como datilógrafo e usava a máquina de escrever como instrumento para compor músicas que atravessam décadas e décadas.
Imagine que ele veio a criar um estilo musical único, que até hoje inspira e intriga artistas por todo o mundo, e passou a ser reconhecido internacionalmente.
Em 1972, juntou alguns bons amigos e fez um dos 10 melhores álbuns do mundo - e o melhor da música brasileira, sem contar os outros mais de 40 álbuns incríveis que fez.
Rompeu todas as fronteiras possíveis com sua voz, seu violão e toda a coragem possível, atravessando os 4 cantos do mundo, e rompendo até mesmo a barreira linguística, fazendo música que é traduzida em sentimento.
Para além disso, foi reconhecido, regravado e aclamado por músicos do calibre de Quincy Jones, Elis Regina, James Taylor, Paul Simon, Cat Stevens, Bjork, Tony Bennett e muitos outros (a lista é grande).
Mais do que isso, ele também deu voz e abriu portas para muita gente e, por muitas vezes, assinou contratos com gravadoras, sem exigir dinheiro para ele mesmo, mas investimento para produzir e dar oportunidade para novos artistas.
Não bastasse tudo isso, ele ainda enfrentou bravamente a ditadura militar no Brasil e ainda encarou graves problemas de saúde, como uma diabetes severa.
Há 10 anos, parou a carreira por conta de uma depressão, deu a volta por cima, se recuperou, viajou o mundo novamente e encerrou sua linda carreira em um show histórico para 60 mil pessoas.
E ainda nem mencionei os incontáveis prêmios e títulos que recebeu ao longo dos mais de 60 anos de carreira.
Como, por exemplo, o título de doutor honoris causa pela Berklee, a maior faculdade de música do mundo, que formou artistas gigantes.
Imagine que esse menino, hoje aos 82 anos, segue aquecendo o coração de muita gente.
Essa história toda parece até um filme de ficção, mas é a história do meu pai.
É impossível que exista algo mais poderoso, potente e maior do que tudo isso no mundo.
Ele é - e sempre será - o maior."