A exemplo de um desenho de animação que ficou célebre nos anos 1990, a ambição de Pedro Sampaio restringe-se a um objetivo incomensurável. Se ao final de cada episódio o ratinho de laboratório Cérebro revelava a seu companheiro Pinky que na noite seguinte voltaria a “tentar conquistar o mundo”, para Pedro Sampaio “de fato é a vez do funk brasileiro dominar o mundo”.
O DJ carioca acaba de colocar na praça o clipe de “Bota Um Funk”, faixa que ficou travada no lançamento de seu álbum “Astro”, em 2024, num dos expediente midiáticos mais usados atualmente, feito para aguçar a curiosidade do público e o clamor popular em torno de um produto musical voltado ao entretenimento.
Quando as cortinas se abriram, as interrogações que sinalizavam esse mistério revelaram duas participações especiais. “Queria promover esse encontro entre a Anitta e o MC GW, que é um dos artistas de funk mais ouvidos fora do Brasil e muita gente não conhece o rosto dele”, justifica Sampaio.
Funk zen
A ideia de ter Anitta na canção existia desde o princípio, dada a “potência e energia do funk” em sua gênese. Sem falar, claro, no poderio internacional da artista. “O funk brasileiro está cada vez mais assediado pelo mercado latino”, reforça Sampaio. Ele conta que a expectativa pelo lançamento vem sendo atingida. “O feedback está muito positivo, fizemos um pré-lançamento muito interessante”, diz.
O DJ aproveitou as polêmicas em torno da “fase zen” vivida por Anitta para melhor faturar sua novidade. “As pessoas se engajaram nessa realidade pessoal da Anitta, tive essa ideia e ela adorou a estratégia”, informa Sampaio. Em vídeos divulgados no Instagram do músico, ele interrompe momentos de meditação da convidada, municiado com uma caixinha de som que toca a todo volume a candidata a hit “Bota Um Funk”. “Obviamente não tem nenhuma relação com a vida real da Larissa (nome de batismo de Anitta), eu só quis aproveitar o momento e estou muito feliz porque as pessoas se identificaram com a energia do clipe, e esse é o intuito”, aponta.
Sampaio confessa que “se obrigou a pensar como Anitta pensaria para lançar essa música, fazendo do limão uma limonada”. Em conversas descontraídas com a amiga, ele lembrou que “toda diva pop tem esse momento controverso, que as pessoas criticam, mas depois fica tudo bem”. “Acho que a Anitta ainda está na fase zen, é algo que ela adotou para a vida dela e acho muito positivo, porque traz equilíbrio. A gente está nessa vida para descobrir coisas novas, se aventurar, aprender e conhecer outras versões de nós mesmos”.
Recuperação
Em fevereiro, Sampaio cancelou sua aguardada participação no Carnaval de BH e em diversas outras capitais do país ao ter diagnosticada uma grave lesão no joelho, pela qual foi obrigado a passar por uma cirurgia. “Tinha uma decisão a tomar, ou eu fazia o Carnaval lesionado ou operava para me recuperar logo”. O músico afirma que “seria uma insanidade, uma loucura fazer o Carnaval com a intensidade” que ele entrega nos palcos com uma lesão para operar.
“Teria o risco de eu agravar minha lesão, de ter outra em cima da que já existia. Eu não conseguiria ser eu mesmo, e também não gostaria que o público sofresse com isso, tenho uma máxima na vida que é sempre dar o meu melhor. Então, foi uma decisão difícil, mas prudente, que tomei com minha equipe médica e de fisioterapia”, complementa Sampaio, que, desde então, realiza 4 horas de fisioterapia diárias a fim de “acelerar o processo de recuperação ao máximo, dentro do que é saudável”.
“Hoje, fazem exatamente dois meses que operei e tive uma recuperação em tempo recorde, visando os shows em Portugal”, sublinha. O músico está em Lisboa para a turnê europeia batizada “Astro Tour”, cujo próximo destino será a França. “Quando tive que cancelar o Carnaval, já coloquei como objetivo me recuperar para estar aqui em Portugal, que sempre me abraça de forma muito acolhedora”, agradece. As duas datas na capital portuguesa e em Porto tiveram os ingressos esgotados, inclusive com a abertura de apresentações extras, com mais de 20 mil aquisições e revendas que atingiram o valor de R$6 mil euros para prestigiar Sampaio.
Boom!
Ainda existe “um caminho grande pela frente” para a plena recuperação do DJ. “A lesão foi no joelho, mas afeta a musculatura da perna, então tem uma recuperação muscular para acontecer, mas, felizmente, consegui me livrar das muletas durante esse período de dois meses. A evolução está muito positiva”, comemora.
Aclamado no Velho Continente, ele considera “controverso” o status do funk. “Fico triste em perceber que talvez seja necessário um reconhecimento internacional de outros países para que o funk seja visto com bons olhos em nosso próprio país, que é o de origem desse ritmo tão rico”, opina. Para Sampaio, o funk “sempre foi um ritmo periférico muito ouvido, que deu voz a inúmeras pessoas e as levou para diversos lugares, mas nunca teve uma valorização merecida”.
“Agora sinto uma movimentação global do mercado musical olhando para o funk”, diz. Ele avalia que esse movimento é efeito do “grande boom que o reggaeton teve”. “Também é um ritmo latino que, neste momento, não tem para onde crescer, o mercado precisa de novidade e o funk sempre esteve nessa fila. Há anos que a gente escuta que agora é o ano do funk, agora ele vira no mundo. De fato isso nunca aconteceu, mas acho que chegou a hora. O reggaeton chegou a um ápice global, e o próximo ritmo latino, quente, a estourar e ser expandido cada vez mais é o funk”, aposta.
Polêmica
Para comprovar sua tese, ele cita os artistas coreanos do K-pop, que mesmo sem ter “nada a ver com o Brasil culturalmente e ritmicamente, já estão pegando referências do funk”. “O próprio (cantor canadense) The Weeknd lançou há pouco tempo uma música com a Anitta com referências do funk. Porque o funk é de todo mundo, ele tem essa capacidade, essa versatilidade. Todo mundo consegue pegar e fazer o seu próprio funk. O do K-pop é de um jeito, mas é funk. O de um produtor latino é diferente, mas também é funk. Isso é muito rico”, exalta.
Sampaio concede a Anitta o título de “abre-alas desse movimento cada vez mais forte” no qual se inclui ao lado de Luísa Sonza, Ludmilla e “outros artistas que ainda vão surgir para levar o funk brasileiro cada vez mais longe”. Na visão de Sampaio, a recente polêmica em torno do trapper Oruam, que desencadeou uma série de projetos de lei no país apelidados de “Anti-Oruam”, não é totalmente conectada ao funk.
“Oruam é um artista periférico urbano brasileiro, que faz trap, rap e também já gravou funk. Mas essa PL é muito mais sobre o Oruam do que sobre o funk, gosto de separar as coisas. Todo ritmo musical tem artistas com opiniões controversas, mas não quer dizer que o ritmo pregue o que está acontecendo na vida do artista”, pondera.
Chuva e caos em BH
Pedro Sampaio recorda com nitidez o barulho ensurdecedor vindo da plateia, embora o tempo tenha apagado a data exata e o local de sua memória. Ele relembra que foi no início de sua carreira, quando, pela primeira vez, se viu impelido a baixar o volume do próprio som. “Nunca tinha escutado uma música minha sendo cantada por todo mundo da plateia… Nem voltei, deixei o palco e o público continuou cantando. Isso para um artista é de brilhar os olhos. Marcou muito a minha vida pessoalmente”, declara.
O hit da ocasião era “Sentadão”, que, em 2019, tornou o nome do DJ conhecido em todo o Brasil. Tudo isso aconteceu em Belo Horizonte, que, não por acaso, é descrita pelo carioca de 27 anos como “uma cidade icônica” em sua trajetória. “Sempre frequentei BH, inclusive como ouvinte de um funk que é cada vez mais forte”, elogia. O Carnaval na capital mineira foi igualmente responsável por outra lembrança intensa, em 2024. “Foi insano, choveu, o maior caos, mas a galera ficou na rua pulando. Iríamos ter um remember esse ano, mas por uma lesão que ninguém pode controlar não aconteceu, ninguém teve culpa…”, elabora Sampaio.
Ele assegura que voltará à cidade antes do próximo Carnaval. “Tem muito tempo pela frente, preciso disso e devo isso a BH”, promete. Na cartela de novidades, o próximo passo é o lançamento de “Perversa”, última faixa a ser destravada de seu álbum “Astro”. A canção traz a participação do colombiano J Balvin, “que está entre os três artistas latinos mais ouvidos no mundo todo”. “Ele é gigantesco. Esse lançamento vai fechar o ciclo de ‘Astro’ e anunciar o surgimento de um novo momento na minha carreira”, salienta. Assim como “Bota Um Funk”, a prometida “Perversa” carrega “essa pitada de um funk para ser consumido pelo mercado latino”. “É uma das minhas grandes apostas”, arremata Sampaio.