Paolla Oliveira conta que o papel de Heleninha Roitman, no remake de “Vale Tudo”, não caiu em seu colo. “Eu pedi para fazer um teste”, afirma a atriz, que tem mais de 20 anos de carreira e um extenso currículo na TV. “Eu acho uma maneira muito honrada, válida e justa para se entrar num trabalho. É justo que as pessoas que vão te escolher tenham a opção de te ver naquele personagem, nem que seja por um dia, né? Então, eu fico muito feliz de ter sido essa a entrada e que tenha sido um pedido muito cara de pau da minha parte”, explica Paolla, consciente da responsabilidade e do legado da personagem, que enfrenta o vício em álcool e foi interpretada por Renata Sorrah na primeira versão da novela, exibida em 1988.

“Tive a oportunidade de falar com a Renata. Eu nem esperava por isso, e ela foi tão gentil!”, relembra a atriz. “Encontrar com ela foi um axé mesmo. Acho que eu fui muito abençoada por poder me encontrar com essa mulher e ver de perto o quão grandiosa e intensa ela é”, conta Paolla, que revela ter assistido a trechos da versão original da novela para criar a sua Heleninha, mas respeitando a essência da personagem. “Assisti a um pouco da novela, não tem como não ver a Renata trabalhando. Mas também acho que, até por respeito a um grande trabalho feito por ela, seria muito respeitoso da minha parte nem tentar se aproximar do que ela fez e tentar fazer uma coisa realmente nova, depois desses 30 anos. Como é olhar para essa personagem depois de tanto tempo e renová-la diante de tudo, do ícone que se criou em torno dela?”, comenta a atriz, que tem recebido elogios por sua atuação.

Em “Vale Tudo”, Heleninha é uma artista plástica que, por causa do vício em álcool, vive entre idas e vindas a clínicas de reabilitação. Na trama, ela faz uso da bebida para se sentir mais segura, para lidar com a culpa pela morte do irmão Leonardo e como um escape da vida pessoal, marcada por problemas emocionais e familiares: Heleninha mantém uma relação conturbada com a mãe, a vilã Odete Roitman (agora vivida por Debora Bloch), e, em razão do vício, perdeu a guarda do filho, Tiago (Pedro Waddington), para o ex-marido, Marco Aurélio Catanhede (Alexandre Nero), com quem vive em constante atrito.

“Ela é uma grande personagem, para além do problema que ela tem, de ser alcoolista. Eu acho que tem ali uma mulher tentando viver nas brechas dessa doença, e isso é o que tem me encantado mais. O alcoolismo é um tema importante, mas qual é a batalha travada de uma mulher que existe para além dessa doença?”, frisa Paolla. “Eu quis muito fazer esse personagem. Então, a partir daí, na hora que deu certo, eu falei: ‘por onde seguir?’. Eu fui por todos os caminhos. Acho que essa personagem merece que seja guiada por todos os caminhos que eu pudesse seguir para encontrar cada minúcia dela”, ressalta.

Processo intenso

Para dar vida a Heleninha Roitman no remake de “Vale Tudo”, Paolla Oliveira recorreu tanto à literatura e à análise de outros trabalhos sobre a temática do alcoolismo quanto à experiência prática de frequentar reuniões dos Alcoólicos Anônimos (AA). “Eu estive lá, inclusive, estive em reunião só de mulheres e vi o quanto, além da doença, elas ainda têm o estigma por serem mulheres, o quanto a moral pega mais as mulheres; o sofrimento delas será eterno por conta das coisas que fizeram por conta dessa doença”, compartilha.

A atriz acredita que viver Heleninha atualmente tem um significado e também uma necessidade importante. “Heleninha é uma personagem densa e profunda que hoje a gente consegue saber que ela é doente, a gente tem essa consciência. Eu acho que, 30 anos atrás, a gente conseguia rir de determinadas situações que hoje seria impossível. Eu vou ficar muito feliz se essa personagem levantar questões; se a gente, ao invés de colocar essa personagem distante da alcoolista, a gente consiga aproximá-la mais”, observa.

“A gente vive tempos muito complexos; muitas coisas melhoraram nesses 30 anos que se passaram, mas muita coisa também piorou – momentos de transtornos mentais, psicológicos, fobias sociais com esta coisa de rede social. A gente vive momentos de obsessões, de compulsões, e tem que encontrar formas para aliviar esse desconforto. Todo mundo sabe que existem formas, e cada dia surgem mais formas para isso, e eu acho que o álcool é uma dessas coisas”, verbaliza Paolla.

Ela completa: “Nem todos são doentes como a Heleninha, mas acho que vai ser legal debater uma droga que está tão presente, tão próxima, que não precisa buscar longe. Porque, quando a gente fala ‘eu vou numa boca de fumo’, se distancia disso; mas, quando está muito perto, (algo de) que a gente faz uso, mas talvez não tenha consciência disso, acho que faz todo sentido voltar com esse debate”.