Leo Lins fez uma live no YouTube para se defender da decisão da Justiça de São Paulo de condená-lo a 8 anos e 3 meses de prisão por "proferir discursos preconceituosos" contra diversos grupos minoritários em um show.  

O humorista disse que decidiu ler toda a argumentação da juíza antes de se pronunciar sobre a sentença, sobre a qual tomou conhecimento enquanto gravava ao lado dos amigos do The Noite, no SBT.

"Muito já se falou da minha condenação: sobre liberdade de expressão, a diferença entre uma piada no palco e uma declaração... Antes de me pronunciar, quis ler toda a sentença da juíza que condenou um humorista, no caso eu, a mais de oito anos de prisão e a uma multa de quase R$ 2 milhões. Esse vídeo não é de piada. É a pessoa Leonardo de Lima Borges Lins, não o comediante Leo Lins, uma persona cômica criada ao longo de anos que faz piadas acidas e criticas, que sabe que nem todas as piadas são para todas as pessoas", começou o artista.

Na sequência, Lins citou o conceito de humor do autor norte-americano Simon Quittley para rebater, segundo o humorista, a condenação com base na Wikipédia da juíza Barbara de Lima Iseppi.

"Na construção do texto, nós utilizamos figuras de linguagem, hipérbole, ironia, numa licença estética e, portanto, uma análise literal desse texto não se aplica na estrutura do cômico. É de se esperar que uma sentença pesada como essa tenha um embasamento teórico igualmente profundo. Sabe qual foi um dos embasamentos teóricos da juíza que me condenou a mais de 8 anos de cadeia? A Wikipédia. E isso não é uma piada", continuou.

Para embasar sua argumentação, o comediante comparou as mensagens de alerta que aparecem ao abrir o site Wikipedia aos avisos dados antes de se entrar em um teatro para assistir um show de humor. 

"Mesmo a Wikipédia tendo um aviso de que não é fonte primária de informação, não substitui uma pesquisa acadêmica, assim como no meu show também tem avisos: 'é um show de humor, apresentação de stand-up comedy, obra teatral, ficção, você está entrando em um teatro, está em um canal do humorista Leo Lins''", analisou o comediante.

Em seguida, ele acrescentou: "Mas parece que as pessoas perderam a capacidade de interpretar o óbvio. Estamos vivendo uma das maiores epidemias dos últimos tempos: a da cegueira racional. Os julgamentos são feitos puramente baseados em emoção e ninguém quer mais ouvir o próximo, quer no máximo convencê-lo da sua própria verdade. Isso pode trazer consequência para qualquer pessoa, mas no caso de um juiz de uma juíza pode trazer consequências gravíssimas".

Leo Lins alfinetou a juíza ao comentar um trecho da decisão que diz que piadas saíram do teatro e foram postadas no YouTube, referindo-se ao show que o humorista compartilhou na plataforma e virou a peça central do processo.

"A partir de agora, se eu ver uma comédia romântica, eu posso processar os atores por atentado ao pudor, porque a cena romântica não aconteceu mais num estúdio de cinema, mas sim na sala da minha casa. É uma limitação cognitiva grave e preocupante... Se um personagem pode cometer um crime, agora a vilã da novela pode ser presa", cutucou o humorista.

Leo Lins comentou a divisão de opiniões que o caso gerou nas redes sociais: "Sei que muitos estão indignados, alguns estão felizes, porque é isso que virou nossa sociedade, um coliseu romano, onde cada grupo vibra quando um suposto adversário cai. Enquanto a plebe se mata, os imperados assistem de camarote. Para que rumo está indo nossa sociedade?".

Ele citou os escândalos de corrupção no Brasil ao ironizar a motivação de sua condenação: "Se piada incentiva o crime, ódio e preconceito. Provavelmente as pessoas envolvidas no desvio de bilhões do INSS, coitadas, às vezes, só ouviram muitas piadas sobre corrupção. Estavam rindo e roubaram. A culpa não é dele".

Lins afirmou não achar perigoso alguém rir de suas piadas, mas sim quando quando piadas causam agressões, citando como exemplo os ataques ao jornal francês Charlie Hebdo em 2015, a execução de um comediante no Paquistão, o tapa que Will Smith deu em Chris Rock durante o Oscar, ou ainda o episódio em que ele próprio levou um soco na cabeça, pelas costas, em São Paulo.

"Não posso jogar Street Fighter, agredir alguém e colocar a culpa no japonês que fez o jogo. Proibir é impedir milhões de pessoas de se divertirem por um idiota... É isso que estamos fazendo: nivelando a sociedade pelo idiota. Concordar com sentenças como essa é assinar um atestado de que somos adultos infantiloides, sem a menor capacidade de discernir o que é bom e ruim, e que precisamos do Estado falando do que você pode rir, ouvir, comer, falar e pensar", disparou o humorista.

Leo Lins agradeceu o apoio que tem recebido, disse esperar não ser preso e citou casos em que seu trabalho como comediante ajudou outras pessoas.

"Agradeço muito a todos vocês que estão me apoiando. Recebi milhares de mensagens. Foi acima da minha expectativa... Recebo muitas mensagens pessoais de pessoas que falam que minhas piadas ajudaram a superaram a depressão, a perda de alguém ou uma enfermidade. Um rapaz disse que testemunharia ao meu favor porque ajudei a salvar a vida dele. Tatuou o símbolo do meu show num corte que tem no pulso. Ainda bem que não estava preso nessa época... A melhor piada do mundo sem alguém para rir não tem graça. Comédia é feita para o próximo. Por isso, espero retribuir tudo isso em risadas. Vai dar tudo certo, até porque se rir virou crime, o silêncio virou regra", completou.