As duas horas e nove minutos da nova aventura do Superman, primeiro longa do herói sob a gestão James Gunn (que dirige o filme e o DC Studios), atende a maioria dos fãs de quadrinhos e  de filmes do gênero, exceto, talvez, quem ainda cultua a visão de Zack Snyder, que conduziu o universo DC antes de Gunn. 


Alguns elementos certeiros de Gunn seguram bem a narrativa: ação, tensão, emoção, um ótimo Krypto,o cão,  e um herói que se permite ser esperançoso, engajado, focado em ser justo e ser um símbolo do bem, mesmo quando é atacado em sua honra (fake news em massa criada por seu eterno arquirrival, Lex Luthor), fisicamente, com direito a um adversário com mesma força, mas pouco cérebro e até questionamentos de suas ações pela pessoa que ama, sua eterna Lois Lane (Rachel Brosnahan).   


Essa boa mistura não gerou tédio para o espectador que teve de ficar atento ao filme o tempo todo, já que  os primeiros 30 minutos são essenciais para conectar as intenções posteriores do roteiro. Assim, Superman(simples assim, sem subtítulo) abriu bem o caminho para uma nova era de aventuras do herói mais famoso do mundo, que nesta versão está bem adaptado, ancorado nas demandas do mundo moderno, com qualidades, defeitos e loucuras, sem perder sua essência. 

 


David Corenswet  mescla bem entre um Clark Kent gentil e quase ingênuo, sem ser 100% boboca,  com  um herói firme, que sabe da sua força, mas insiste em ser mais humano do que a maioria das pessoas do planeta adotivo em que sua nave caiu. David imprime um homem de aço com questões morais, preocupações do dia a dia e éticas que assolam qualquer pessoa do planeta na era das redes sociais, das notícias falsas e tentativas de controle de narrativas. 


Político sim, em nome do bem estar coletivo


Logo no início da trama, Superman interfere diretamente em um conflito entre a Boravia e Jarhanpur (países fictícios) evitando que uma guerra fosse deflagrada, salvando vidas e trazendo paz. Esse movimento gerou uma série de críticas a ele, incluindo uma entrevista a Lois Lane, que o questiona se seus atos estavam corretos, com ele se exaltando ao dizer que “evitou uma guerra”. 


Para conservadores, do mundo real e dos quadrinhos, o último filho de Krypton tem de atender apenas aos interesses de sua nação materna, os Estados Unidos. James Gunn consegue tornar o herói em um símbolo do mundo, não de um país. Logo, esse altruísmo que deveria ser natural, se torna uma ofensa para aqueles que insistem em ter um mundo para poucos. 


E o efeito foi imediato. Conservadores dos EUA já taxaram o Super de Gunn como um ser  “da cultura woke”, termo usado com frequência pela direita mundial quando se discute pautas coletivas. Então, o filme fez seu caminho certo. 


Inveja e os seguidores de Lex Luthor


Lex Luthor (Nicholas Hoult) tem ares cartunescos, vilania tradicional e vai além: tem seguidores que acreditam em sua supremacia intelectual como forma de conduzir o planeta. O que lhe gera seguidores fiéis que morreriam pela causa, por acreditarem que podem viver nessa utopia da tecnologia. 


Uma alegoria dos dias atuais Sua gangue, com seres modificados para serem armas, como a Engenheira, o Ultraman, um clone do Superman, mas sem consciência, mostra que Lex se autointitula como o homem muito superior à humanidade, mas sente uma inveja quase biliar do herói, pois mesmo tendo um intelecto nível 12 (como indica sua história nos quadrinhos), não consegue ter a mesma aura de semideus do Superman. 


E essa inveja que conduz sua sanha por destruir o herói, mesmo que isso cause o fim do planeta. Megalomania em puro estado no Luthor de Hoult. E isso é um contraponto ótimo para o filme, que define logo a rixa entre Lex e Superman, sem fazer rodeios. Eles não serão amigos, como tentaram fazer em Smallville, série famosa dos anos 2000. 


Lois Lane  e Krypto


Os dois personagens trazem ainda mais humanidade para Clark/Superman. Lois, em início de romance com ele, gera insegurança a ele quanto a reciprocidade do amor que ele dedica a ela. Mas, ela também sente isso, pois namora o homem mais poderoso do planeta e não entende de imediato como isso impacta sua vida profissional no Planeta Diário e sua vida pessoal.. 


Todavia, a Lois de Rachel Brosnahan é mais do que um interesse romântico. No tom certo, ela se transforma em ponto chave para a conexão com o ato final do filme. Assim, encontra seu lugar no universo do Superman e no novo mundo que se desenha pós ações de Lex Luthor. 


O supercão Krypto é uma boa surpresa, fazendo bagunça como qualquer cachorro animado com seu dono. tem energia de sobra e uma fidelidade que só esses animais conseguem ter com os humanos. Leve, sutil e fofo. Krypto tem lugar para agora e no futuro da DC. 


Caminhos definidos


O novo universo da DC definiu alguns caminhos interessantes para o futuro. Com a presença de personagens como o Lanterna Verde Guy Gardner, a Mulher-Gavião e o Senhor Incrível, todos já estabelecidos em uma Sala da Justiça, a formação de uma Liga da Justiça se torna mais fluida e direta, sem a necessidade de construir uma introdução para o espectador. James Gunn optou por não subestimar a inteligência do espectador, gerando uma boa expectativa para um universo expandido bem-sucedido.


Para o alto e avante


Superman é o herói que o mundo precisa: menos cínico, frio e com foco absoluto em ser do bem. As próximas aventuras, se seguirem o percurso deste longa, poderão trazer alívio e mostrar que nem tudo está perdido neste mar de incertezas da nossa era.  Que assim seja. Para o alto e avante, Superman!