Joseph Kosinski fez em "F1" o seu "Top Gun: Maverick" sobre quatro rodas, replicando o universo de máquinas sofisticadas e seus audaciosos pilotos agora no mais importante circuito de automobilismo do mundo. O diretor e roteirista reprisa os mesmos ingredientes no filme protagonizado por Brad Pitt, que faz às vezes de Tom Cruise como o veterano cheio de traumas que vai mostrar o seu valor numa realidade cada vez mais etarista.

Em "F1", que continua em cartaz nos cinemas, Kosinski não se deu ao trabalho de criar algo novo, reproduzindo as mesmíssimas dinâmicas, com a disputa ente o piloto experiente, já sentindo o peso da idade, e o novato arrogante. Há um chefe que convocará o antigo amigo para ajudá-lo num momento especial, uma "expulsão" do protagonista que voltará a tempo para a última missão e que sanará todas as disputas em prol da união.

A grande diferença é que, em "Maverick", havia a seu favor uma memória afetiva, uma legião de fãs que curtiu o filme original de 1986 e seu estilo militarista-pop- acelerado. A segunda parte faz muitas referências ao primeiro, ao mesmo tempo em que traz um personagem transformado física e emocionalmente. O Sonny Hayes de Pitt carrega a mesma construção dramática, mas num espaço mais curto, superficial e bastante frouxo.

Ele é uma amálgama de vários personagens que podemos definir como lobos solitários, que vivem um processo autodestrutivo quando são chamados para um derradeiro desafio, sabendo que será apenas um final de ciclo e que outros tomarão seu lugar. Por isso não se importam com a opinião de terceiros, aceitando muitas vezes fazer a "parte suja", do sacrifício. É nesse ponto que Sonny ganha algum interesse dentro do contexto da Fórmula 1.

Para quem acompanha a modalidade, sabe muito bem o que ela virou de uns tempos para cá, com a tecnologia tirando o brilho do talento dos pilotos. Acertadamente, Kosinski coloca Sonny como contemporâneo de Ayrton Senna e Nigel Mansell, por sinal dois pilotos que entraram no cockpit da equipe inglesa Lotus, referenciada no filme com o modelo 99T (o carro amarelo patrocinado pela marca de cigarros Camel). 

Outra cena  com o bólido surge para ilustrar o acidente que levou Sonny a abandonar as pistas. A imagem da batida é real, tendo acontecido com Martin Donnelly no GP de Jerez de la Fronteira,  na Espanha, em 1990. O personagem de Pitt é chamado ironicamente de plano C - de caos. E, realmente, seu desempenho arrojado garante ótimos duelos, inclusive com o colega de equipe  Joshua Pearce (Damson Idris).

Quando Sonny põe a sua experiência a serviço da equipe, o filme esbanja questões técnicas e estratégias muito caras a F-1, como saber o momento certo de entrar no boxe, usar as bandeiras amarelas - quando os carros são reagrupados e andam em baixa velocidade, devido a um acidente - e fazer jogo de equipe. Há boas sequências de ultrapassagens, com "F1" usando o mesmo recurso das transmissões de TV, a partir de uma câmera dentro do cockpit.

É a primeira vez, por exemplo, que se mostra o túnel de vento, onde os carros são projetados. A trilha sonora de música eletrônica ajuda a enfatizar essa embalagem tecnológica e cara da competição. Só não ajustaram os parafusos do motor da narrativa, bastante previsível e preguiçosa, recorrendo a um sem-número de clichê de filmes esportivos. Quando Sonny corre pela pista, em contraposição aos exercícios sofisticados de Pearce, vemos uma cópia descarada de "Rocky".

O competidor veterano que resolve voltar à prateleira de cima, após se perder em vícios, visto com desconfiança, foi extraído de "A Cor do Dinheiro" (1986), sobre a sinuca. Esse mesmo veterano que é chamado para ajudar a formar um novato já estava presente em "Sorte no Amor" (1988), dedicado ao beisebol. Até em matéria de romance o filme leva goleada, expressa numa cena mais tórrida,  simbolizada por fontes esguichando água para cima.