Agenda cheia

BH vive ‘boom’ de eventos culturais após dois anos de portas fechadas

Projetos adiados em função da pandemia enchem programação da cidade entre abril e junho, mas abundância na agenda também revela desafios para o mercado

Por Bruno Mateus
Publicado em 19 de junho de 2022 | 07:00
 
 
 
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Neste feriado, de quinta a sábado, o Circuito Cultural Pampulha reuniu música – Zeca Baleiro, Fundo de Quintal e Tutu com Tacacá estavam entre as atrações –, circo, teatro e dança em sua segunda edição no estacionamento do Mineirão. Nos mesmos dias, do outro lado da cidade, nos jardins do Parque dos Mangabeiras, o Figa – Festival de Gastronomia e Arte apresentou novos talentos da cozinha mineira, mesclando música e exposições de arte nos três dias. Estes são apenas dois exemplos de eventos que aconteceram na mesma data. Desde abril, quando a flexibilização nas regras sanitárias adotadas durante a pandemia permitiu que grandes públicos pudessem voltar aos shows, espetáculos e festivais, a agenda cultural de Belo Horizonte vive período efervescente como há um bom tempo não se via, mesmo antes da Covid-19.  

Basta dar uma volta por praças, casas de shows, teatros, museus e centros culturais da cidade para perceber que a programação está recheada. Gratuitos ou não, são eventos de pequeno, médio e grande porte. Após dois anos de cancelamentos, restrições, adiamentos e incertezas, turnês estão rodando o país novamente, produtores estão correndo para colocar de pé seus projetos, e toda uma cadeia produtiva e criativa voltou a girar. Diversas ações, viabilizadas ou não por leis de incentivo, não puderam ser executadas em 2020 e 2021 e só agora ganham as ruas e os espaços de cultura. Discos e livros aprovados na Lei Aldir Blanc estão sendo lançados aos montes em shows e eventos. 

Com a flexibilização, houve uma natural liberação do que estava represado para matar a saudade do público, mas estamos em ano eleitoral, e isso também explica o grande número de eventos neste último trimestre. Projetos com recursos de lei de incentivo seguem padrões determinados pelo Tribunal de Contas de cada região para colocação das marcas estatais nos materiais de divulgação e publicidade. Após 1º de julho, qualquer empresa do Estado ou do município fica proibida de incluir sua marca em projetos culturais que tenham lei de incentivo. 

Abril, maio e junho marcarem o boom da programação cultural na capital mineira é natural para quem está no mercado. “Era de se esperar, a pandemia criou obstáculos que impediram a realização dos projetos”, diz Leo Horta, da Argos Produções, responsável pelo Circuito Cultural Pampulha, que era para ter acontecido em 2020. É natural pelo contexto, mas não deixa de ser algo fora da curva. 

“Esses três meses vão ser atípicos, há muitos eventos encavalados. Abril e maio, que são meses que não chove em BH, houve uma grande concentração. E junho é mês de festa junina. A tendência é que de agosto em diante a situação se normalize e a demanda do público caia um pouco, assim como a oferta de eventos”, pondera Didio Mendes, proprietário da It’s Shooow Time, que realiza o Figa e ainda tem dois eventos no calendário: a Festa Junina Dipraia, no próximo sábado (25), e o Esbórnia BH, em 9 de julho.  

Apesar da alta na agenda cultural, Mendes diz que nada vai diminuir o impacto da pandemia no setor cultural: “Não houve setor mais prejudicado, fomos os últimos a voltar a trabalhar, é uma cadeia enorme que gira em torno dos eventos. Mas essa retomada foi satisfatória”.  

Desafios

Segundo Leo Horta, a avalanche de eventos tem causado certo distúrbio no mercado. O ator e produtor cita a dificuldade em conseguir fornecedores de palco, som, luz, limpeza e gradis, por exemplo. “Outro problema é que meu projeto ficou 30% mais caro, está todo mundo passando por isso. Houve uma quebra geral no mercado de fornecedores, e agora, que os eventos presenciais voltaram, há pouca empresa para fornecer o que é necessário. É uma questão prática: muita demanda e pouca oferta”, relata Horta. 

Sócia-fundadora da Casulo Produções e diretora da Associação Arebeldia Cultural, Danusa Carvalho percebeu que a agenda ficaria movimentada nestes três meses ainda em dezembro do ano passado, quando ela coordenou, em parceria com a Cemig e a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais (Secult), a realização do festival Luzes da Liberdade, na praça da Liberdade, que recebeu instalações e projeções para celebrar o Natal de 2021: “Recebemos em 30 dias 200 mil pessoas. Um recorde”. Em agosto, começa um novo ciclo de oficinas na área de tecnologia para formar 40 jovens de periferia, que vão atuar no evento deste ano.  

Para Danusa, “esse boom é fantástico, o mercado precisa se aquecer, mas não podemos nos empolgar”. A produtora diz que é preciso entender este momento: se é, de fato, o setor cultural se reerguendo ou se é um acúmulo de entregas de projetos. “Estamos vindo de dois anos sem eventos, muitos sendo realizados agora, mas com contratos e patrocínios já acertados de 2020 e 2021, então não sabemos como será 2023. Estou preocupada”, admite.  

Manter os projetos com calendário anual e fazer com que o público não se perca entre tantas opções são desafios que os produtores culturais terão pela frente. Não adianta “sair trepando um evento em cima do outro”. “Planejamento é fundamental. É preciso estar atento à qualidade dessa entrega, do palco, da programação, do som, da assessoria, de tudo o que cerca o evento”, comenta Danusa Carvalho.  

Mineirão: retomada em 2022 terá mais de 300 eventos  

Reaberto em fevereiro de 2013, após reformas para a Copa do Mundo realizada no Brasil no ano seguinte, o Mineirão foi remodelado e passou a ser uma arena multiúso, com vocação também para receber shows, festivais e grandes eventos. Só em 2013, Paul McCartney, Elton John, Black Sabbath e Beyoncé tocaram no estádio, que recebeu 55 eventos e jogos naquele ano. Números ainda tímidos se comparados aos de 2019, quando o Mineirão já havia se consolidado como um importante espaço para abrigar a agenda cultural de Belo Horizonte. Há três anos, quando a Covid-19 ainda não fazia parte dos nossos dias, foram 253 eventos e 37 jogos. 

Em março de 2020, veio a pandemia e, com ela, meses e meses de estádio fechado. A retomada para o futebol aconteceu em agosto do ano passado. Para o setor cultural, o Mineirão só voltou a abrir as portas em abril deste ano, quando sediou o Breve Festival, adiado quatro vezes. Cinquenta mil pessoas lotaram a Esplanada do estádio para ver Racionais MC’s, Gal Costa, Djonga, Ludmilla, Duda Beat, Ney Matogrosso, entre outros artistas e bandas. 

Com a flexibilização, o ano do Mineirão começava ali. E será um 2022 bastante movimentado. A previsão é que o local receba mais de 300 eventos – entre shows, festivais e encontros corporativos – e mais de 1,5 milhão de pessoas. “Este ano está mais aquecido, sim. Todo fim de semana vamos ter alguma programação”, comenta a gerente de eventos do Mineirão, Priscilla Machado, que destaca a capacidade do estádio de conseguir atender todo tipo de espetáculo: “São várias entradas e acessos, tem o gramado, a Esplanada. Isso facilita muito. Recentemente, enquanto ocorria um evento na Esplanada, o palco do Metallica estava sendo montado no gramado”.  

Marisa Monte, Festival Sertanejo, Metallica, Bloco do Silva, Gusttavo Lima e a turnê de Alexandre Pires e Seu Jorge levaram uma multidão à Pampulha. Até o fim do ano, Milton Nascimento, Jorge e Mateus, Wesley Safadão, Leo Santana e seu Baile da Santinha e o Festival Sarará já estão confirmados. Só no Planeta Brasil, nos dias 24 e 25 de setembro, são esperadas 60 mil pessoas por dia. O salto em relação a 2019, segundo Priscilla Machado, se justifica. “Entendo que essa agenda está mais tumultuada por conta da demanda que ficou reprimida, além da sede de entretenimento do público e das entregas que os produtores precisam fazer”, observa. 

Se falarmos em artistas internacionais, o Mineirão também se coloca como o grande palco de BH. Em 2 de setembro, Demi Lovato toca no estádio; 11 dias depois, será a vez do Guns N’Roses, com Axl, Slash e McKagan pela primeira vez na cidade. “Mais quatro contratos seguem em sigilo”, revela a gerente de eventos do estádio. “Antes, tínhamos dois, três artistas internacionais por ano. Agora será mais”, ela continua. O que já se sabe é que, em janeiro de 2023, os Backstreet Boys pisarão no Gigante da Pampulha.

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