Comemorando 28 anos de ativismo gay no Brasil e 10 anos da criação da Associação Lésbica de Minas (Alem), a presidente da entidade, Soraya Menezes, aborda, em entrevista a O TEMPO, os preconceitos, as vitórias e as dificuldades enfrentadas para defender uma causa. Ela, que aos 15 anos resolveu assumir-se homossexual, já foi sindicalista e hoje, aos 40, dedica-se exclusivamente à batalha diária de dar visibilidade e politizar a causa lésbica e feminista. Segundo Soraya, mais importante que receber a aceitação da sociedade é "conquistar o respeito da mesma".
Por isso, diz a dirigente, a Alem promove, na praça 7, às 12h de hoje - um dia antes da 10ª Parada do Orgulho GLBT de Belo Horizonte, manifestação que também tem sua gênese nas ações da entidade - a III Caminhada de Lésbicas e Bissexuais Femininas.
"Quando fizemos a primeira Parada, em 1998, contamos com aproximadamente 50 participantes e umas poucas lésbicas. Em 2006 a Parada contou com 100 mil participantes e as lésbicas, embora invisibilizadas por quase toda a mídia, estavam lá, engrossando a massa GLBT de Belo Horizonte. Nesse sentido, a Caminha de Lésbicas e Simpatizantes também vem se construindo ao longo desses três anos, embora não saibamos ainda quanto tempo será necessário para que, se não toda, a grande maioria das lésbicas esteja nas ruas exigindo respeito e reivindicando seus direitos", afirma Soraya.
O TEMPO - A Associação se considera feminista?
Soraya Menezes - A Alem é uma instituição que se pauta pelos princípios feministas porque acredita que só haverá uma sociedade melhor e mais justa a partir da eqüidade de gênero, e de serem respeitados os direitos fundamentais de todas as mulheres, independente de cor, raça, etnia e orientação sexual. Buscamos desconstruir a criação de guetos em torno da homossexualidade, que gera lucros e beneficiam uma elite, mas não gera igualdade de direitos. A Alem se define enquanto um grupo de lésbicas que luta incondicionalmente contra a violência de gênero que se assenta na desigualdade entre homens e mulheres.
Quais são os tipos de preconceito mais comuns contra as lésbicas?
É o praticado pelo pai e ou pela mãe que, ao tomar conhecimento da homossexualidade da filha, sente-se transtornado(a) e reage com hostilidade e rejeição. A lésbica, quando se assume, vivencia o preconceito no ambiente de trabalho, na escola, nas ruas, nos espaços públicos de uma forma geral.
Como a Alem age para tentar diminuir esse preconceito?
Desenvolvendo oficinas de formação para suas associadas, cujo objetivo é instrumentalizá-las para o enfrentamento à violência, ao preconceito e à discriminação. Realiza também atividades públicas para dar visibilidade às bandeiras de luta contra a violência, o preconceito, a discriminação e a invisibilidade lésbica. E mobiliza parlamentares para encaminhar leis que favoreçam a comunidade GLBT, além de buscar apoio nos movimentos sociais para fortalecer suas reivindicações.
A Alem recebe muitas denúncias?
Sempre. A mais freqüente é a praticada pelos shoppings, bares e restaurantes, que não toleram qualquer forma de expressão de afeto entre as lébicas dentro de seus espaços e, geralmente, agem com truculência, hostilidade, numa clara demonstração lesbofóbica e de descumprimento da Lei 14.170, que determina imposição de sanções a pessoa jurídica por discriminação praticada contra pessoa em virtude da orientação sexual. A Alem ajuda orientando o caso.
A associação recebe algum tipo de apoio ou patrocínio?
Sim, a Alem é atendida por organizações estrangeiras que financiam projetos para mulheres do Terceiro Mundo, como a Astraea e a Global Fund (norte-americanas) e a Mama Cash (holandesa).
Quais foram as principais batalhas que a associação já enfrentou?
As batalhas travadas pela Alem não cessam, pois têm a ver a própria existência da entidade. Às vezes é impossível articular determinadas parcerias principalmente com o setor privado que normalmente não quer seu nome vinculado à uma entidade de lésbicas. Tem ainda o enfrentamento com as igrejas, que sonham em "curar" as lésbicas. E há o Estado, que exclui os homossexuais dos (parcos) direitos garantidos aos heterossexuais, bem como as famílias que às vezes expulsam e agridem suas filhas, e as escolas que excluem as mulheres lésbicas. Enfim é uma batalha ferrenha contra toda a sociedade para defender sua "razão de ser": o direito de as lésbicas viverem sua sexualidade em paz e com dignidade.
AGENDA - III Caminhada de Lésbicas e Bissexuais Femininas, hoje, às 12h, na praça 7. Amanhã, a Alem estará com trio elétrico puxando a 10ª Parada do Orgulho GLBT de Belo Horizonte, com concentração na avenida Afonso Pena, às 11h. Mais informações na telefone 3273-7871 ou no site www.alem.org.br.