Mais de dois anos após lançar “O Lobo Atrás da Porta”, o brasileiro foi surpreendido na última terça (12) ao ser indicado como melhor cineasta estreante pelo Sindicato dos Diretores dos EUA, categoria criada neste ano. Abaixo, Coimbra fala sobre como ficou sabendo da indicação, além do novo longa que ele filmou no Oriente Médio e sua experiência no set do seriado “Narcos”

 

O que você estava fazendo e qual foi sua reação à indicação?
Foi uma surpresa, mas eu tive uma pista. O distribuidor americano d'O Lobo' me mandou um e-mail alguns dias antes pedindo o telefone em que eu estaria. Porque o sindicato entrou em contato e disse que, se o filme fosse indicado, iriam me ligar. Só que, para mim, soou como uma coisa padrão, eles pegando os telefones de todos os possíveis concorrentes. Não que eu estivesse entre finalistas, não sabia direito nem qual categoria, se tinha filme estrangeiro. Na terça, eu estava editando o “Sand Castle”, meu novo filme, estava compenetrado, nem lembrei. O telefone tocou e, estranhamento, apareceu um número brasileiro, código 94. Pensei “onde é isso, Norte, Nordeste?”. Achei que fosse engano ou telemarketing. Atendi, o cara começou a falar  em inglês, e caiu a ficha. Fiquei igual uma barata tonta. Em cinco minutos, começou a chover e-mails, mensagens de galera de Hollywood dando parabéns. E só depois eu fui ver os outros indicados na internet e quase caí para trás. São os filmes mais badalados do ano.

Além desse filme novo, você também dirigiu “Narcos”. Chegou a se filiar ao Directors Guild?
Não. Mas está entre os meus objetivos. Eu poderia me filiar por causa dos dois, mas não teve obrigatoriedade porque nenhum deles foi filmado nos EUA. Preciso fazer isso se for continuar filmando fora porque eles têm toda uma proteção, um contrato-padrão. Mas ainda não me filiei porque é muito caro. Talvez agora com a indicação, eles me deem um desconto (risos).

E o que mais te surpreendeu nesta trajetória d'O Lobo'?
Quase tudo. Você espera que seu filme tenha a melhor carreira possível, mas nunca sabe o que vai acontecer, especialmente fora do Brasil. A gente estreou em Toronto, e já ali teve uma repercussão muito grande, com um monte de agente americano vindo me dizer que gostou do longa e queria que eu filmasse nos EUA. Foi um susto porque é um filme muito pequeno. E me surpreende que até hoje ele está rendendo tantas indicações e prêmios. No ano passado, ganhamos sete no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro e, para mim, era um fecho com chave de ouro. Aí vem essa indicação ao DGA que, para mim, já é uma vitória.

Qual foi seu maior desafio na realização do filme?
Nunca sei responder essa pergunta porque é tanta coisa difícil. A paixão do elenco e da equipe na produção e no lançamento do filme me marcou muito mais que as dificuldades. Um desafio por muito tempo foi achar um parceiro de produção porque era um roteiro com um tema muito difícil, e era meu primeiro longa. Ninguém sabia se ia dar certo. Até o pessoal da Gullane me conhecer e embarcar nessa, as pessoas se assustavam um pouco com a história.

Você estava no Oriente Médio até pouco tempo atrás, fazendo seu novo filme. O que pode me adiantar dele?
Em Toronto, acabei fechando com um agente americano e, desde aquela época, tenho recebido muitos projetos. Quando entrei no “Sand Castle”, no meio do ano passado, eles já tinham o Nicholas Hoult como ator principal e me avisaram que queriam filmar ainda em 2015. A história se passa na Guerra do Iraque, em 2003, no momento da primeira invasão. O protagonista é um soldado raso que não queria ir para a guerra, alistou-se para poder pagar a universidade. E acaba sendo enviado para uma cidade pequena, onde os EUA destruíram a estação de água, e eles vão lá tentar resolver o problema. Uma coisa aparentemente fácil vai se mostrando complicadíssima, e vai revelando todas as camadas dessa guerra: um conflito que estava ganho e demorou mais de dez anos para o exército sair de lá. O que me atraiu é que mostra o lado civil, soldados que vão lidar com pessoas e assuntos locais. Tem uma relação com os iraquianos e um retrato do povo iraquiano que não se vê muito no cinema americano. São aquelas pessoas que ficam no fundo, como estereótipos. E a vontade dos produtores era trazer esse outro lado da guerra. O roteiro foi escrito pelo Chris Roessner, que foi para a guerra para pagar a faculdade de cinema e escreveu sobre essa experiência dele. Terminei de filmar pouco antes do Natal, e o objetivo é lançar em algum festival no segundo semestre.

Muitos diretores brasileiros que filmam lá fora têm problema de controle e conseguir executar sua visão. Como tem sido sua experiência?
Tranquilo, tranquilo, não posso dizer que é. No cinema americano, quando você é contratado, depende de com quem está trabalhando. No “Sand Castle”, consegui fazer as coisas do meu jeito e emplacar ideias que achei melhores. Mas no meio, tem coisas que eles fizeram e acabaram melhores do que eu estava pensando. Tudo vai se acoplando ali. O produtor queria fazer um filme mais com pedigree de diretor do que puramente comercial. Não buscaram um investimento altíssimo para não precisar de um retorno altíssimo. Queriam um diretor com estilo, visão, e eu me juntei porque senti que queriam realmente fazer um filme diferente de outros longas de guerra. Buscavam esse equilíbrio entre autoria, pedigree e uma visão comercial. Eu tomei muito cuidado com os projetos que fui entrando exatamente por saber de outros brasileiros que tiveram experiências bem complicadas. Não quero sair do Brasil e ir para a Jordânia encarar um projeto em que não posso fazer nada.


Da última vez que a gente conversou, você estava escrevendo um roteiro chamado “Os Enforcados”. Em que pé ele está?
Tive de dar uma parada por causa do “Sand Castle”. Vou voltar agora, quando avançar com a montagem dele, e já começar a captar. Eu fui para o laboratório de Sundance e voltei com várias ideias legais. Não consegui terminar essa versão, mas já estava bem adiantada quando fui pro “Sand”. Vou dar só um tapa e chegar numa versão boa para captar. Porque a versão boa para filmar, a gente só termina um dia antes (risos).

Você também dirigiu dois episódios importantes de “Narcos”. Como foi a experiência, e você volta para a segunda temporada?
Não fiz a segunda por causa do “Sand Castle”. Me chamaram, mas ia ser ao mesmo tempo em que eu estava no Oriente Médio, e eu tive que escolher. Não foi fácil porque foi uma ótima experiência. É TV, mas é uma produção gigantesca, com uma proporção que você não vê no Brasil. Foi a primeira vez que fiz algo desse tamanho, internacional, com a estrutura toda, em duas outras línguas, um cenário de guerra, e isso foi uma boa escola para o “Sand”. Aprendi muito ali, o jeito americano, como funciona, a relação com o produtor. Depois do “Narcos”, isso não foi uma grande novidade.  E por ter o Wagner (Moura) e o Lula (Carvalho), foi uma intermediação boa porque ainda tinha um pouco de Brasil. E eu fiquei impressionado com o tamanho da repercussão. Não é TV, que tem um dia, horário marcado, e acabou. No fim de semana que estreou, todo mundo já veio comentar dos meus episódios, que eram o sete e oito!

E esse universo da TV e séries te atrai? Tem interesse em criar uma sua?
Sim, sempre tive vontade de fazer. E quando veio “Narcos”, foi algo no meu estilo, no Netflix, com 65 milhões de assinantes, uma recepção muito maior que um filme no cinema ou algo na TV a cabo só no Brasil ou na América Latina. O negócio explode no mundo inteiro. Quero fazer algo meu, tenho algumas ideias, ainda muito embrionárias, mas é uma coisa que está nos meus planos. Achar a galera certa para desenvolver, tanto aqui quanto fora.

Você já conseguiu processar o que essa indicação significa para a sua carreira?
Já processei melhor que no primeiro momento. Vou entender mais quando estiver na cerimônia, acho. Porque isso muda a relação com os produtores de Hollywood, a maneira como eles me escreveram parabenizando, o negócio é seriíssimo. Quando vi a lista, é uma nata. Pros americanos, estar entre aqueles cinco ali faz muita diferença. E como estou trabalhando nesse mercado internacional, é importante porque as pessoas veem “O Lobo”. Quem não sabe quem eu sou, posso citar a indicação, e ajuda. E, claro, mostra a repercussão do filme na indústria lá, que é muito maior do que eu imaginava.

E uma cerimônia de diretores vai estar cheia de medalhões. Tem alguém que você gostaria de conhecer ou esbarrar no corredor?
Só de pensar que eu vou encontrar George Miller, Ridley Scott e o Iñárritu já me dá uma aflição. Mesmo o (Laszlo) Némes e o (Alex) Garland, esses caras são todos fodões. Só de poder trocar uma experiência ali já vai ser maravilhoso. Eu sou ruim de tietar, mas tem vários diretores que eu queria passar perto (risos).