Música

Ayrton Montarroyos se apresenta pela primeira vez em BH nesta sexta

Repertório de “Um Mergulho no Nada agrega Dorival Caymmi e Djavan

Por Raphael Vidigal
Publicado em 24 de maio de 2019 | 03:00
 
 
 
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MC Rick é um dos ídolos de Ayrton Montarroyos, ao lado de nomes como Chico Buarque, Djavan, Dorival Caymmi, Gilberto Gil, Tom Jobim e Vinicius de Moraes. No entanto, ao contrário dos pares, o funkeiro belo-horizontino de 17 anos, dono de sucessos como “Cabelo que Voa” e “Cobiçadas do Twitter”, não aparece no repertório do segundo disco da carreira de Montarroyos, base do show que ele traz nesta sexta (24) a BH. “As pessoas no Brasil geralmente não sabem que o MC Rick é genial, existe um desconhecimento. Se tivesse traquejo para cantar rap e funk, talvez eu cantaria também”, justifica.

Aos 23 anos, Montarroyos demonstra a segurança de um veterano que começou precocemente a traçar os passos profissionais, o que se constata tanto na emissão do canto, que lhe rendeu, aos 17 anos, uma indicação ao Grammy Latino pela interpretação de “Dois Corações”, no álbum “Herivelto Martins: 100 Anos” (2013), quanto na franqueza com que ele dispara suas opiniões. “Dizem que a grande artista do Brasil hoje é a Anitta, porque ela vende muito, mas, se o critério é esse, você está falando de mercado, e não de arte. É como se ela fosse um ‘Nescau’, um produto médio que todo mundo pode consumir, mas há outros achocolatados muito melhores”, compara.

Habituado a emprestar sua voz límpida e grave para clássicos da canção brasileira que ele aprendeu a admirar desde cedo, cujos intérpretes vieram a se tornar parceiros de palco, como Cauby Peixoto, Angela Maria e Claudette Soares, o garoto prodígio de Recife procurou “canções que olhassem para o povo brasileiro a partir de sua cultura” para conceber o espetáculo de voz e violão que desembocaria no disco “Um Mergulho no Nada”. 

O título foi retirado de um verso do conterrâneo Capiba em “Sem Pressa de Chegar” (parceria com Délcio Carvalho), terceira faixa do álbum. “Entendi que esse era um disco composto de silêncio, pausa e respiração. Talvez seja esse avesso da coisa que impressione, essa presença do nada, e, com a visão da música brasileira que eu tenho hoje, isso se torna até irônico, como a Elis (Regina) quando lançou o (disco) ‘Saudade do Brasil’ (em 1980) morando aqui”, explica o cantor. 

Em 2015, ele ficou em segundo lugar no programa The Voice, quando já tinha participado de duas coletâneas produzidas por Thiago Marques Luiz, a primeira em homenagem a Luiz Gonzaga. Foi Marques Luiz quem insistiu para Montarroyos lançar o registro ao vivo. “Sou muito exigente, preferia acertar os detalhes no estúdio. O Thiago resolveu gravar o show, mesmo a meu contragosto, e, quando ouvi, fiquei emocionado”, admite. 

Com o violonista Edmilson Capelupi, o músico tem conseguido viajar pelo Brasil. “É mais fácil levar menos gente numa van num país onde quem vive de música popular não tem nenhum prestígio”, afirma. 

Resistência. Lançada em 1951 pela cantora Linda Baptista (1919-1988), a música “Dona Divergência” foi composta por Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins no contexto da Segunda Guerra Mundial, que perdurou de 1939 a 1945. A letra alude ao conflito histórico para aproximar sua lupa das brigas comezinhas de um relacionamento conjugal. 

“Não vá, bom Deus, julgar que a guerra que estou falando/ É onde estão se encontrando tanques, fuzis e canhões/ Refiro-me à grande luta em que a humanidade/ Em busca da felicidade/ Combate pior que leões”, canta Ayrton Montarroyos em “Um Mergulho no Nada”. “O disco fala o tempo todo de guerra porque, ao contrário do que dizem, somos um país de resistentes, passamos pelo período escravagista, depois pela monarquia, tivemos uma sanguinária Guerra do Paraguai e, cem anos depois, veio a ditadura militar”, observa Montarroyos. 

Esse sentido de guerra cotidiana aparece sob diferentes primas ao longo de “Pé na Estrada” (Ylana Queiroga e Yuri Queiroga), “Açaí” (Djavan) e “Sodade Matadeira” (Dorival Caymmi). “Tem a guerra para namorar, porque a família não aceita; a de quem sai do sertão para não morrer de fome; a do trabalhador que levanta cedo”, enumera. Ainda criança, andando com uma tia nas ruas de Recife, o cantor viu uma cena que jamais saiu de sua cabeça. 

“Um homem tão magro que dava para ver o esqueleto, minha tia disse que ele comia até rato”, conta. “Cálice” (Chico Buarque e Gilberto Gil) fecha o CD. “Vivemos um tempo de brutalidade e perseguição. Artistas, estudantes e professores viraram inimigos da nação, o presidente parece ter problema cognitivo”, diz.

Serviço. Show de Ayrton Montarroyos nesta sexta (24), às 21h, no Centro Cultural Minas Tênis Clube (rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Ingressos: R$ 60 (inteira)

Disco. “Um Mergulho no Nada”, disco ao vivo de voz e violão, é o segundo da carreira do pernambucano Ayrton Montarroyos, que é acompanhado por Edmilson Capelupi nas dez faixas

Ouça faixa do novo álbum de Ayrton Montarroyos:

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