Prestes a embarcar para Londres, onde vai participar de uma residência artística na Delfina Foundation, a partir do prêmio concedido este ano pela SP-Arte, a artista Laura Belém inaugura neste sábado (22) a mostra “Por que Olhamos a Natureza num Mundo Conturbado”, na Celma Albuquerque. Esta, que é a primeira mostra individual da artista nessa galeria – que completa três décadas de atuação este ano –, reúne trabalhos novos, entre outros expostos no exterior, porém ainda inéditos no Brasil.

É o caso da obra sonora “Jardim de Bolso” (2008), que foi montada pela primeira vez no Museu Municipal de Arte de Toyota, no Japão. Em razão das diferenças dos espaços, a atual montagem ganhou outra configuração, sendo a principal diferença a maior proximidade na disposição das trilhas. Manteve-se com o projeto inicial a ideia de extrapolar o cubo branco, conduzindo, assim, a instalação para o jardim interno da galeria.

“Quando mostrei esse trabalho no Japão, uma das duas trilhas que o compõem também ficava em um jardim, em frente a uma casa de chá. E em alguns momentos há lacunas, silêncios propositalmente instaurados na composição sonora, para que os ruídos do entorno possam também entrar no trabalho”, afirma Laura.

“Jardim de Bolso”, explica ela, surge a partir do diálogo com a obra “Taxonomy (Applied) #3”, de Joseph Kosuth, exibida permanentemente no Museu Municipal de Arte de Toyota. A peça do norte-americano baseia-se em um conjunto de nomes de pensadores e líderes religiosos do Oriente e do Ocidente. A partir disso, ela teve a ideia de recolher citações sobre a natureza de autores, como Arthur Schopenhauer, D. T. Suzuki, Henri Bergson e Lao-Tzu, além de poemas de Matsuo Bashô, Issa, Buson e Paulo Leminsky, que tratavam do mesmo tema.

“Os textos são declamados em três línguas: português, inglês e japonês. Mas não há uma tradução do mesmo conteúdo de uma língua para outra. Eu quis, com isso, preservar um certo hermetismo que há na obra de Kosuth”, explica a belo-horizontina. Outro trabalho que ainda não havia sido exposto integralmente no Brasil é a série de fotografias “Reconstrução” (2017), que foi instigada após o corte de árvores centenárias da avenida Bernardo Monteiro, pela prefeitura de Belo Horizonte, que alegou a existência de uma praga.

Composta de 11 peças, a série fotográfica traz imagens concebidas em dois momentos: primeiro a artista fotografou os troncos cortados em filme preto e branco e depois, sobre as fotos já impressas, colocou pedras, como cristais. Em seguida, fotografou novamente o resultado dessa sobreposição, mas desta vez, com filme colorido. “Tudo passa por uma metáfora, como se esses cristais pudessem reconstruir ou curar essas árvores, mas é tudo meio absurdo, um pouco surrealista, porque é impossível fazer essa conexão entre dois elementos da natureza que pertencem a reinos tão distintos”, completa Laura. Além dessas criações, a artista também apresenta três novos vídeos, produzidos neste ano: “Modelagem”, “Entre as Estrelas e seus Olhos” e “Quatro Tempos”, sendo o último com trilha sonora concebida pelo duo O Grivo.

 

A fragilidade como trunfo da natureza

Uma referência que permeia a exposição de Laura Belém está ressaltada no próprio nome da mostra, que traduz o título do texto “Why we look at plants, in a corrupted world”, do escritor chinês Hu Fang. De acordo com ela, o autor chama atenção para a fragilidade da natureza, ressaltando isso como algo positivo. “Para ele, isso já nos bastaria para nos conectarmos a essa simplicidade, a essa percepção de impermanência que a natureza traz. A maneira como o homem se relaciona com a natureza hoje é predominantemente extrativista e o texto problematiza isso”, comenta Laura.

Agenda

O quê. Mostra “Por que Olhamos a Natureza num Mundo Conturbado”, de Laura Belém

Quando. De 22.9 a 26.10, de segunda a sexta das 9h às 19h; sáb., das 9h30 às 13h

Onde. Galeria Celma Albuquerque (Rua Antônio de Albuquerque, 885, Funcionários)

Quanto. Entrada gratuita