Os moradores da pacata Procópio viviam em paz até que uma facção criminosa a escolhe como sede para a prática de crimes cibernéticos, tráfico de drogas e assassinatos. Inspirada na obra de Renato Russo e da banda Legião Urbana, esse é o mote da série policial “As 4 Estações”, que vem transformando cidades da região Centro-Oeste de Minas em cenários para uma trama na qual são discutidos temas contemporâneos como racismo, homofobia e bullying.
Com roteiro e direção do belo-horizontino Rony Guilherme, com longa trajetória no teatro, a produção tem Zezé Motta, Gracindo Júnior, Vannessa Gerbelli, Roberto Cordovani e Igor Cotrim no elenco. “Fui cedo para São Paulo e Rio batalhar minha carreira. Meu sonho era gravar em meu Estado para mostrar a beleza, a culinária e a arquitetura. Está sendo muito acolhedor. A cada fotografia, vejo que será um trabalho maravilhoso”, afirma Guilherme.
As gravações da primeira temporada começaram em agosto do ano passado e seguem até dezembro. Fazendas, casarões, indústrias, ruas, praças e escolas das cidades de Carmo da Mata, Oliveira, Itapecerica, Cláudio, Divinópolis e Capitólio ambientam a história, que conta ainda com atores da região.
“Estou achando lindíssimo os lugares. A paisagem é maravilhosa. Tem sido emocionante gravar”, ressalta a atriz Maximiliana Reis, famosa pela peça “Os Monólogos da Vagina”, durante gravações que a reportagem acompanhou na Fazenda da Palmeira, em Carmo da Mata.
“As 4 Estações” é uma produção independente, que negocia sua exibição para plataformas de streaming, como a Netflix. A expectativa é que a série seja lançada em abril de 2020. Estão previstas quatro temporadas, com dez episódios de 50 minutos cada.
Com o orçamento apertado, é preciso apelar para permutas e apoio de empresas e prefeituras. “Apresentamos o projeto para trazer um ator para gravar por alguns dias. Daí, conseguimos o hotel, o prefeito consegue um carro (para buscar o ator). Alguns hotéis e pousadas estão nos apoiando”, comenta Guilherme.
Entrevista
Rony Guilherme
Roteirista e diretor
A série está dividida em núcleos, de acordo com as estações do ano. Gostaria que explicasse um pouco como isso vai se passar na trama, fazendo um paralelo com a obra do Legião Urbana.
Essa série traz um pouco da rebeldia do movimento do rock brasileiro. Concentramos na linguagem da Legião Urbana, a banda que tinha mais personalidade, que conseguia ser agressiva para que as pessoas pensassem e, ao mesmo tempo, poética. Trazemos esse gráfico de emoções nos quatro núcleos. O Primavera questiona preconceitos, o Verão, essência de “Pais e Filhos”, um conflito familiar, o Outono, que é policial, suspense, muito de “Faroeste Caboclo”, e o Inverno, um núcleo de respiro, cômico.
A série também propõe uma forma inovadora de assisti-la. Como isso se dará?
Eu estava assistindo uma novela uma vez e queria saber como a personagem sairia daquela trama. Mas a trama cortava para outro núcleo. Demorou quatro ou cinco dias para a história se resolver. Então, pensei: e se a gente tivesse a oportunidade de acompanhar só o núcleo que a gente quer? Estamos propondo esse novo jeito. O espectador terá um mecanismo para acompanhar todos os episódios daquele núcleo.
Como estão fazendo para financiar a série?
Nós tentamos fazer via Ancine, mas não conseguimos. Apresentamos o projeto em Minas, e os prefeitos e os empresários da região nos acolheram. Uma empresa pagou o cachê da Zezé Motta, outra, do Gracindo Júnior, outros empresários pagaram de câmeras e outros atores. E as prefeituras foram nos ajudando com transporte, alimentação e hospedagem. Fomos avançando. Somos uma produtora que produz cinema, televisão e teatro. Ganhamos em um lugar, colocamos em outro.
Principais personagens
Gracindo Júnior (Luiz)
Fazendeiro, pai da trans Cacá, a quem apoia. Ele é avó do garoto Dante. Sua esposa está doente. Ele se formou em uma faculdade de direito, em São Paulo, onde conheceu a Dra. Isabel (Zezé Motta), por quem se apaixonou. Por ele ser branco, ele foi impedido pela família de Isabel de viver esse amor. eles se afastam e se reencontram anos depois em Procópio.
Zezé Motta (Dra. Isabel)
Seguiu a carreira de advogada e de delegada na cidade de Procópio. É linha dura, ética. É uma ativista contra qualquer tipo de preconceito. Sofre com racismo. Ela nunca se casou e sempre teve a esperança de se reencontrar com o grande amor da vida.
Roberto Cordovani (Cacá)
Conduz a trama. Após uma separação, muda de gênero, volta para a cidade natal e se casa com um jovem advogado. Ela é professora da escola da cidade, e é acusada de assédio, mas se descobre depois que é uma armação. Sofre humilhações por causa de sua condição sexual.
Vannessa Gerbelli (Bárbara)
Ex-mulher da Cacá, com quem tem boa relação. Eles tiveram o filho Dante. Ela é cantora e, após perder o irmão, vai para a Itália gravar um disco. O filho fica seis meses em Procópio com a trans. A música de abertura da série "Tempo Perdido" é cantada por ela e seu irmão Gian Gerbelli que, na vida real, morreu em um acidente de moto em 2018.
Igor Cotrim (Cuca)
É um traficante e fanático religioso, que se converteu na prisão e vive uma vida dúbia. É quem comanda a facção criminosa que invadiu a cidade.
Carmo da Mata ganha escola de cinema
As gravações da série pelo interior mineiro vão deixar um legado. A cidade de Carmo da Mata, a 175 km de Belo Horizonte, terá uma escola de cinema em 2020. A prefeitura municipal vai ceder um terreno, e o diretor Rony Guilherme se comprometeu a levantar os recursos com a iniciativa privada. O projeto está sendo formatado.
“A ideia não é só ter estúdios que fabriquem produtos culturais, mas que formem pessoas para continuar nosso trabalho. Eles vão aprender na prática, estudar cinema, câmera, maquiagem, edição, roteiro, figurino e cenografia com mestres da área”, explicou Rony Guilherme.