Antes de chegar aos palcos do Galpão Cine Horto, que recebe a estreia de "BarbAzul" em Belo Horizonte, o Teatro Andante abriu seu processo de criação e se encontrou com o público paranaense na última edição do Festival de Curitiba. Segundo Ângela Mourão, que assina a direção geral e atua na montagem, essas apresentações deram ainda mais impulso e força ao trabalho.
Num novo momento do grupo - com o afastamento de Marcelo Bones, hoje na Funarte -, a encenação de "BarbAzul", de alguma maneira, busca retomar e incluir todo um repertório artístico acumulado ao longo de 19 anos de trajetória.
A peça remonta o conto de Charles Perrault, também recorrente em outras culturas, que, sinteticamente, narra a história de um nobre violento que seduzia suas esposas e, depois, matava-as. Ele decide se casar novamente e entrega todas as chaves da casa à sua nova mulher, que não poderia abrir um quarto proibido. Na ausência dele, ela decidi abri-lo e descobre o segredo que o cercava, os corpos de suas outras mulheres.
"Essa história me impactou muito pessoalmente pelo fato de ser um homem que seduzia, casava e instalava um relação de dominação com suas mulheres, até que uma delas conseguiu não se submeter para desmontar essa trama que ele montava. O que mais me tocou foi descobrir que ela se salvou porque teve coragem de abrir a porta e tomar consciência da verdade. Além disso, o trabalho com esse tipo de mito é algo que tem nos interessado, como foi em Édipo e até em Olympia", explica Ângela.
A diretora ressalta que, mais do que contar essa história, coube ao grupo criar um jogo cênico acerca de como contá-la. "Fizemos esse espetáculo que não se enquadra nas categorias tradicionais de drama, comédia, tragédia, nem teatro épico, mas é tudo isso", afirma. "Tem momentos engraçados, lúdicos, outros de desconstrução pós-dramática, de narração de histórias. E, para isso, tentamos levar para a cena elementos com os quais lidamos aqui no Andante, como a dança e a música", ressalta Ângela, destacando a colaboração de artistas como Tarcísio Ramos Homem, Kenia Dias e Lúcia Castello Branco para toda a construção do trabalho.
Forma e conteúdo. Segundo a diretora, um dos objetivos do Andante é unir o rigor formal à comunicação direta com a plateia. "Tem a tentativa do apuro técnico mesmo, afinal, somos todos educadores formados. Mas a gente sempre busca a comunicação popular, porque, como diz o próprio nome do grupo, queremos andar por muitos lugares, com públicos de formação e níveis sociais diversos", revela.
O caráter arquetípico dos personagens de "BarbAzul", segundo Ângela, é o que estabelece relações com os dias de hoje. "Essa conexão com a contemporaneidade também é parte do jogo do espetáculo, com a presença de muitos signos e ações trazidas para dentro da cena", adianta.
Peça não tem incentivo de lei
É com muito sacrifício, mas também satisfação, que a diretora e atriz Ângela Mourão conta que o espetáculo "BarbAzul" não recebeu nenhuma forma de incentivo de leis ou de patrocinadores diretos.
"Apesar das condições adversas que temos hoje, principalmente financeiras, temos essa impulsão para fazer as coisas. A sua obra artística vai depender do aval de uma comissão? Não pode ser assim. Mesmo que seja muito difícil, é uma peleja sem noção, essa conquista me dá uma satisfação no sentido de que não estamos dependentes. Queremos encontrar o público e perceber se ele se sente mobilizado, tocado pelo nosso trabalho", diz. (SB)
Saiba mais
"O Barba Azul" foi um dos oito contos de Charles Perrault publicados no ano de 1697
O conto integrava a obra "Histórias ou Contos dos Tempos Passados com Moralidades", que ficou mais conhecida pelo público em geral como "Os Contos da Mãe Gansa"
AGENDA
O que: Espetáculo "BarbAzul", do Teatro Andante
Quando: De hoje a 6 de junho. Quinta a domingo, às 20h.
Onde: Galpão Cine Horto (rua Pitangui, 3.613, Horto. 3481-5580)
Quanto: R$ 20 (inteira), R$ 10 (meia) e R$ 5 (somente nas apresentações de quinta-feira, para portadores do passaporte Cine Horto)