CINEMA

'Meu Nome é Gal' mostra a transformação de uma garota tímida em diva da MPB

Cinebiografia protagonizada por Sophie Charlotte e dirigida por Dandara Ferreira e Lô Politi estreia nesta quinta-feira

Por Paulo Henrique Silva
Publicado em 12 de outubro de 2023 | 07:00
 
 
 
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Gal Costa é, sem dúvida, a protagonista. Mas o filme “Meu Nome É Gal” não se restringe à cantora, falecida no ano passado, e oferece um espaço generoso para os demais integrantes do movimento tropicalista, entre eles Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Rogério Duarte e Torquato Neto. Principal estreia de hoje nos cinemas, o longa-metragem tem as relações de amizade como grande tema.

“Esse filme é muito sobre a amizade deles, a parceria deles. Em nosso recorte, eles estão muito jovens. Hoje sabemos que eles são imensos para a nossa cultura, mas na época não sabiam o que iria acontecer. Trazer essa noção da juventude, esse questionamento artístico de encontrar o seu próprio caminho é muito bonito de acompanhar”, assinala Sophie Charlotte, responsável por dar vida à personagem-título.

A atriz de 34 anos destaca que a produção dirigida pela dupla Dandara Ferreira e Lô Politi mostra o “desabrochar de Gracinha para Gal Costa”, nos anos de 1966 a 1971, paralelamente à articulação artística e política dos companheiros de um dos mais emblemáticos movimentos culturais do país. “Nós os vemos, a partir do olhar de Gal, pensando a música, pensando a arte”, sublinha.

Para Sophie, “fazer esse filme” é a sua “dança de reverência para ela (Gal), para todos esses artistas que fizeram desse período no Brasil um momento de resistência, de luta através da arte e da alegria”. A atriz registra que a Tropicália surgiu e se estabeleceu no auge da repressão militar. “Isso é quase difícil de conceber hoje em dia. É importante refletir sobre tudo isso, sobre tudo que essa geração resistiu e conquistou”.

O filme significou muito para Sophie enquanto artista e brasileira, como ela faz questão de frisar à reportagem de O TEMPO, no lobby do Cine Santa Tereza, onde participou de uma concorrida pré-estreia ao lado de Dandara. Os cinco anos entre o convite para viver a intérprete dos hits “Baby”, “Divino, Maravilhoso” e “Vapor Barato” e o lançamento nas telonas foram determinantes para o amadurecimento da personagem.

“Como diz a canção (‘Esotérico’, de Gilberto Gil), ‘o mistério sempre há de pintar por aí’. Esse tempo também está no nosso filme, é uma presença. Porque foi o tempo para decantar tanta emoção, para estudar, entender e refletir sobre cada aspecto da importância de Gal Costa na nossa cultura, de suas revoluções musicais – ela foi se revolucionando ao longo da carreira inúmeras vezes”, observa.

Sophie Charlotte revela que, como no início do projeto ainda não havia um recorte de tempo, ela pôde se aprofundar na trajetória de Gal. “Sempre fui fã, a vida toda, mas a partir do convite isso ganha novos contornos e uma responsabilidade. Isso se transformou de tantas formas até chegar no lugar mais puro, que é o da diversão, que é o de conseguir compreender essa vivência de Gal no período”, analisa.

Dandara Ferreira, que antes de “Meu Nome É Gal” fez um documentário sobre a cantora baiana, pondera que, além de observadora da ebulição sonora do grupo tropicalista, Gal também é uma cocriadora. “Tudo nela gera um pouco mais internamente, mas (de) tudo que acontece externamente ela está se alimentando”, afirma a cineasta, que é filha do ex-ministro da Cultura Juca Ferreira.

Essa forma com que a artista demora a entrar na mesma sintonia emocional dos outros tropicalistas é a espinha dorsal do roteiro. Lentamente, ela vai se afastando da tímida Maria da Graça, de Salvador, até chegar ao show “Fa-tal”, em 1971, que foi determinante para a solidificação de Gal Costa como voz da resistência cultural – Gilberto Gil e Caetano Veloso já estavam exilados em Londres na época.

“O fato de Gal resolver cantar ‘Divino, Maravilhoso’ (composta por Caetano e Gil e apresentada durante o Festival da MPB, em 1968) não foi uma coisa aleatória ou um pedido de amigos. Ela estava vendo tudo o que acontecia no seu entorno e viu que era o momento de ela se expressar, de se tornar uma voz política não só no cantar, mas também na sua performance, pelo grito no palco”, avalia Dandara.

Dandara salienta que, normalmente, as cinebiografias tentam explicar toda a história de seu personagem. “Nós optamos, desde o início, por fazer um recorte para nos aprofundar na história. Óbvio que passaria pela Tropicália, porque foi a grande transformação desde a Semana de 1922, e Gal foi importante para dar voz ao movimento. Fizemos um filme para falar da transformação dela”. 

Sophie Charlotte não tem dúvida de que “vem muita vida depois” da apresentação de “Fa-tal” – justamente num 12 de outubro, no teatro Tereza Rachel, no Rio de Janeiro. “Mas é bonito você olhar para um momento com profundidade e refletir sobre a essência de Gal e seus amigos. É como se fosse a síntese daquela semente que depois vira uma árvore frondosa”, aprova.

A atriz argumenta que, por mais que Gal fosse tímida e reservada, ela “explodia no palco em expressão”. Sophie compartilha dessa “questão existencial do artista”, sobre o que deve revelar ao público. “É a sua obra, que é o que você quer colocar no mundo. Tem um lado que é a sua privacidade. Também tenho essa reflexão sobre isso. Não é necessário ter um quadro completo de quem se é”.

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