João Diamante é um desses nomes que transcendeu o ofício de cozinhar. O chef que nasceu em Salvador (BA), mas foi criado no Rio de Janeiro, se destacou tanto por sua habilidade no fogão, com técnicas refinadas e combinações de sabores, quanto por seu compromisso com a transformação social por meio da gastronomia. À frente da cozinha do restaurante Dois de Fevereiro, no Rio de Janeiro, ele resgata as raízes afrobaianas no Largo da Prainha, no Rio de Janeiro - região central conhecida como Pequena África.
Com o projeto Diamantes na Cozinha, premiado com o título de "Champions of Change" (Campeões da Mudança) de 2024 do The World’s 50 Best Restaurants, o “Oscar” da gastronomia, ele ressignifica o trabalho com a gastronomia como uma ferramenta de inclusão e empoderamento para jovens em situação de vulnerabilidade social. Se antes muitos desses adolescentes e crianças sequer tinham o que comer, com a ação de João, eles passam a vislumbrar a comida não apenas como algo que está – às vezes – no prato, mas como uma profissão e um meio de vida.
Diamante é um dos chefs que integram a programação do Seminário O TEMPO Gastrô, evento que acontece nos dias 29 e 30 de outubro, no Mercado de Origem BH, no bairro Olhos D'água - o local será o palco para uma série de encontros gratuitos (retire seu ingresso aqui) que vão reunir grandes nomes do setor, reconhecidos nacional e internacionalmente, promovendo um diálogo rico e diverso sobre o universo culinário. O chef comanda o painel “Comer com significado: diálogos entre alimentação e identidade”, agendado para às 18h da terça-feira (29).
Seminário O TEMPO Gastrô: conheça os participantes da primeira edição que acontece nos dias 29 e 30; veja como retirar os ingressos
Como tem sido o reconhecimento do projeto Diamantes na Cozinha “Champions of Change do The World's 50 Best Restaurants”?
É um reconhecimento muito importante obviamente, isso faz a gente acreditar no nosso próprio trabalho, apesar de duro, apesar de ser diário, apesar da gente correr atrás todos os dias para impactar milhares de pessoas através da gastronomia, utilizando a cozinha como ferramenta de transformação e dando oportunidade para pessoas que se encontram em unidade social de periferias e comunidades do Rio de Janeiro. Mas, ainda, enfrentamos dificuldades de conseguir um patrocinador, de conseguir alguém que apoie uma turma para a gente continuar impactando milhares de pessoas com esse reconhecimento mundial. O prêmio facilitou, sim, essa captação de recursos, não só para o Diamante na Cozinha, mas para todos os projetos sociais do Brasil que utilizam a gastronomia como ferramenta de transformação. Sempre falo que quem mantém a base do setor gastronômico são pessoas que vêm de comunidade, de periferia, que são os ajudantes de cozinha, auxiliares gerais, cozinheiros que vem de comunidade… Então, ajudar o Diamantes na Cozinha a impactar milhares de pessoas é ajudar a manter o mercado. É uma coisa inteligente e sustentável.
A gastronomia tem um poderoso papel, então, na transformação social. Qual conselho você daria para os jovens em situação de vulnerabilidade que querem cozinhar?
Acho que o primeiro conselho para esses jovens é que, apesar de todas as dificuldades e a adversidade, não deixem de estudar. O conhecimento é a única forma legal que vai libertá-lo de qualquer amarra que a sociedade possa vir impor. E agarrar as oportunidades que aparecerem.
Em dos seus projetos, “Origens – Um chef brasileiro no Benin”, você revisitou na África as raízes de pratos típicos da culinária nacional, bem como a ancestralidade de muitos negros brasileiros. Como foi esse processo de conexão com a sua ancestralidade?
Eu falo que esse projeto foi um dos mais importantes da minha vida. Através desse projeto, eu consegui resgatar a minha ancestralidade, saber da importância dela e da minha importância para poder ajudar a ressignificação dos lugares que ela perpetua. Então, foi uma oportunidade de ter um letramento mais profundo sobre ancestralidade e poder saber aonde eu posso ajudar essa ressignificação. Esse é um documento que fica para o resto da humanidade, né? O João Diamante vai morrer, vai passar a fase dele aqui na terra, mas vai ficar com meus filhos, com meus netos, com meus bisnetos, para outras gerações de pessoas que vão assistir esse documento e vão dar importância à nossa ancestralidade e vão saber o trabalho que a gente fez há alguns anos, algumas décadas, algumas centenas de anos atrás e vão saber valorizar isso.
Na cozinha do restaurante Dois de Fevereiro, no Rio, a proposta é ressignificar o território da pequena África no Rio de Janeiro, através da gastronomia. Como você tem feito esse trabalho?
Conhecer a minha origem de perto, historicamente e gastronomicamente, ajudou na minha cozinha no Dois de Fevereiro, usando os pilares entre cultura, origem e ancestralidade. Há muitas pessoas que já fazem o trabalho de ressignificar aquele lugar, eu cheguei para somar, através da visibilidade nacional e internacional que eu tenho, para levar pessoas do mundo inteiro para aquele território e para que elas entendam a importância daquele lugar e valorizando aquela região.
Como estão os seus projetos para o futuro, não só dentro da cozinha?
Os projetos para o futuro no Diamante na Cozinha, a ideia é que a gente consiga virar uma ONG que tem uma parceria pública privada para que a gente consiga impactar muito mais pessoas. Hoje a demanda é cinco vezes o que o projeto consegue oferecer. Normalmente a gente abre inscrições e vagas para 30 pessoas e são 1500 pessoas inscritas. Já no Dois de Fevereiro queremos expandir e aumentar a capacidade do restaurante que, hoje, a gente tem filas todos os dias, expandir para um mercado de pequenos produtores de artesanato e comida. No fim do próximo ano, vamos lançar o Cozinha de Favelas, que é um projeto de valorização dos empreendedores de comunidade, dando capacitação para eles através do conhecimento, depois dando visibilidade ao negócio deles, com um circuito turístico gastronômico. A gente quer começar isso no Rio de Janeiro e levar para o Brasil todo.
O Seminário O TEMPO Gastrô acontece em BH. Quais são suas impressões sobre a nossa cozinha mineira?
Sem dúvida alguma, a cozinha mineira é uma cozinha definida. Ela sabe o que é, ela sabe o que quer e ela sabe pra onde ela tá indo. Você não confunde a cozinha mineira com nenhuma outra. Eu vejo a cozinha mineira muito unida e evoluindo muito forte, dia após dia. E o Seminário O TEMPO Gastrô vem só fortificar isso, para organizar isso da melhor maneira, trazendo desde o pequeno produtor e empreendedor, das pessoas que desenvolvem os produtos de encontro com a cozinha raiz, com a cozinha dos chefs e dos mercados, fazendo uma fortificação desse movimento organizado. Fico feliz de ser brasileiro e de poder participar, de alguma forma, desse movimento. Eu amo estar Minas Gerais, amo estar com os mineiros e sempre fico surpreendido quando vou a Minas.
SERVIÇO
O quê. Seminário O TEMPO Gastrô
Quando. 29 e 30 de outubro, das 13h às 20h
Onde. Mercado de Origem (rua Adriano Chaves e Matos, 447, Olhos d’Água)
Quanto. Gratuito, mediante retirada de ingressos pelo site Gofree