À frente do renomado Lasai, no  Rio de Janeiro, restaurante que ocupa a sétima posição entre os melhores da América Latina segundo o prestigiado ranking 50 Best – sendo o melhor representante do Brasil na lista –, o chef Rafa Costa e Silva, 45, não segue a cartilha tradicional dos cozinheiros que herdaram da família o gosto pela gastronomia. Nada de receitas passadas de geração em geração ou lembranças de infância temperadas por panelas borbulhantes da avó ou de alguma matriarca da família. Sua paixão pela cozinha veio um pouco tarde, aos 23 anos, quase por acaso, mas, quando percebeu, já estava completamente fisgado.

Inicialmente, seu sonho na adolescência era ter um bar para reunir os amigos, mas, em vez disso, o destino o levou diretamente para as cozinhas profissionais, onde ele se encontrou e nunca mais quis sair. Depois de uma jornada internacional que passou pelo celebrado Mugaritz, no País Basco, do chef Andoni Luis, e pela experiência com o chef Jean-Georges Vongerichten, em Nova York, Rafa retornou ao Brasil para criar um restaurante que reflete sua trajetória eclética: um encontro entre técnica apurada, respeito aos ingredientes e um carinho especial pelos sabores simples – como um queijo quente bem-feito, que, para ele, ainda é insuperável entre seus preparos preferidos.

“Os pratos que eu amava na infância continuam sendo os meus favoritos até hoje. Mas, como adulto, minha paixão pela culinária cresceu, e hoje sou completamente apaixonado por comida japonesa, mexicana e comida basca, que considero o top da minha lista gastronômica”, entrega o chef. “É meu fraco total. Estou sempre procurando um japonês bom”, brinca.

Em 2014, Rafa enfrentou o desafio de abrir o Lasai, um restaurante que logo se tornaria um ícone da gastronomia carioca, agraciado com duas estrelas Michelin. “A primeira semana foi um caos. O restaurante estava lotado, e todos os dias, após o expediente, eu sentava na escada e chorava de ansiedade, achando que não conseguiria manter o restaurante funcionando”, recorda. 

Balcão comporta 10 comensais que são servidos simultaneamente. Foto: Evandro Manchini/divulgação

 

Foi ali que ele aprendeu, na prática, o verdadeiro significado da cozinha. “Senso de urgência é essencial. Quando algo precisa ser feito, tem que ser feito na hora”, ensina, como filosofia de vida e de trabalho para sua equipe. “Poucos cozinheiros têm essa característica, mas é uma qualidade indispensável”, conclui.

No Lasai, o foco é sempre a frescor dos ingredientes: 80% dos vegetais – e ovos também – usados no restaurante vêm diretamente da horta do chef, que fica nas redondezas do Rio, no Vale das Videiras. E, claro, os vegetais mudam constantemente.

Tartelete de porco curado com creme de verduras e lâminas de chuchu, do Lasai. Foto: Evandro Manchini/divulgação

 

Vegetais

Enquanto falávamos por telefone para essa entrevista, ele contou que havia muitas abóboras e cebolinhas mexicanas disponíveis e que estaria pensando nas receitas que iria fazer com elas. Provavelmente, nas próximas semanas, alguns pratos feitos com esses ingredientes serão servidos no largo balcão do Lasai para apenas dez clientes simultaneamente por noite. O menu-degustação preparado na frente dos clientes tem 15 etapas – geralmente, nove aperitivos para se comer com as mãos, três pratos principais, duas sobremesas e o petit four. Ah, e com uma excelente trilha sonora, diga-se de passagem.

“É uma cozinha descontraída e carioca, com muitas opções para comer com as mãos e poucos pratos fritos. Nosso objetivo é que os clientes saiam satisfeitos, mas leves, mesmo após a experiência completa”, explica Rafa. A salada servida em uma das etapas é um bom exemplo da proposta do chef: um cracker de folha desidratada com creme de ervas e araruta, um dos carros-chefe do menu. “Representa muito bem nossa essência e sempre surpreende os clientes, que chegam sem esperar muito de uma simples salada e saem encantados”, disse. 

Tempurá de chuchu com barriga da atum e pimenta  dedo-de-moça. Foto: Evandro Manchini/divulgação

 

Há também o biscoito de polvilho com palmito fresco e vieira; uma base de linhaça com creme de ricota e variados tipos de beterraba; e o tempurá de chuchu com atum bluefin e vinagrete de pimenta dedo-de-moça. “No entanto, não gosto de rotular como ‘cozinha local’, pois utilizamos sementes de diversas partes do mundo, compradas em bancos de sementes e feiras especializadas”, explica.

Também é um carioca ousado ao criar sua versão de pão de queijo cremoso, recheado com aligot e goiabada. “Teve um mineiro que falou que precisou viajar até o Rio de Janeiro para comer o melhor pão de queijo da vida dele”, brinca.

O protagonismo da cozinha do Lasai passa pelo sabor dos ingredientes clássicos que brilham por si, sendo alguns deles ainda subestimados – ele vê, por exemplo, um enorme potencial em carnes nacionais de alta qualidade, ainda pouco conhecidas. “Acredito que alguns ingredientes brasileiros são pouco valorizados, como o chuchu, que, quando bem-feito, é incrível”, afirma. 

Premiações

Além da posição de prestígio que ocupa no ranking do The World’s 50 Best Restaurants 2024, o Lasai conquistou duas estrelas do renomado Guia Michelin do ano passado. Ele reconhece, sim, a importância das estrelas de outras premiações, de um ponto de vista comercial – para atrair clientes além do Brasil –, mas elas não que definem o trabalho que faz. “Se colocássemos caviar, trufas ou foie gras, provavelmente estaríamos mais próximos da terceira estrela, mas não é isso que queremos. Preferimos manter um ambiente informal e divertido”, acredita.

Para Rafa, a gastronomia é uma jornada de descobertas constantes. “Quando abri o Lassai, tinha muito medo de fracassar e achava que qualquer erro poderia ser catastrófico. Com o tempo, aprendi a relaxar um pouco e a deixar as coisas fluírem”, disse.

Ao olhar para sua trajetória, ele dá um conselho para o chef de dez anos atrás: “Vai dar tudo certo”. E deu. 

Lasai

Largo dos Leões 35, Humaitá. (21) 3449-1854. Terça a sábado, das 19h e 22h. Reservas: www.lasai.com.br 
Menu: R$ 1.250 (sem bebida e sem taxa de serviço) e R$ 680 (harmonização)