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Casais optam por gêmeos para se adequar à vida moderna

Tendência de “resolver a questão da gravidez de uma vez só é um erro sob os pontos de vista médico e psicológico, dizem especialistas


Publicado em 29 de novembro de 2015 | 04:00
 
 
 
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As técnicas de fertilização in vitro, cada vez mais modernas, abriram para a sociedade um mar de possibilidades. Toda essa tecnologia deu origem também a certos fenômenos. O mais recente é o de casais que chegam às clínicas de fertilização “encomendando” um par de gêmeos.

Para “otimizar” a gravidez – poupando tempo e esforço –, eles buscam os consultórios para tentar ter dois filhos de uma só vez. “Em um país como o nosso, ainda é relativamente fácil criar dois bebês, o que não acontece nos países da Europa e nos Estados Unidos, por exemplo. Assim, muita gente quer ‘resolver logo a questão de uma vez só’”, relata o especialista em reprodução humana Marco Sampaio, diretor da clínica Origen.

Muitos ainda idealizam a parentalidade de dois filhos de uma só vez e sonham em empurrar o carrinho duplo, vesti-los com roupinhas parecidas e fazer passeios com seu parzinho de filhos. Mas a realidade é bem diferente: uma gestação de gêmeos é arriscada tanto para a mãe como para os próprios bebês.

“Cada feto a mais na barriga representa uma média de quatro semanas a menos de gestação. Se essa mulher tem tendência à prematuridade, os riscos de esses bebês precisarem ficar semanas na UTI neonatal são enormes. O ideal é ter um de cada vez”, recomenda o médico.

Em gravidezes gemelares, os recém-nascidos correm mais riscos de nascer abaixo do peso ideal e de ter sequelas, além da exposição a bactérias nos hospitais. Já a mãe tem uma grande chance de não poder fazer um parto normal, pois é muito difícil que gêmeos não precisem de uma cesariana para virem ao mundo.

E mais: a grávida corre maior risco de desenvolver diabetes e hipertensão gestacional, ter descolamento de placenta e ruptura uterina. Nesse tipo de gestação, o risco de um aborto espontâneo também é maior, embora não seja possível determinar ao certo quanto esse risco será mais alto, já que muitos abortos espontâneos acontecem bem no começo da gravidez.

Comportamento. Outra questão que passa a ser preocupante, dessa vez sob a ótica psicológica, é quando os candidatos a pais e mães procuram um especialista certos da demanda por filhos gêmeos. Nesses casos, os filhos passam a ser considerados uma tarefa, que precisa ser cumprida segundo o protocolo instaurado.

“Isso é preocupante, porque indica que o sistema de mercado é o que rege a nossa perspectiva de subjetividade das relações. Esse sistema de mercado nos impele a produzir cada vez mais e melhor, em maior quantidade, a otimizar o tempo. Seja qual for o motivo que está levando esses casais a buscar uma dupla de bebês, eles precisam entender que ser pai e ser mãe é uma caixinha de surpresas”, critica a psicóloga Cláudia Natividade, do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG).

Segundo ela, a relação entre pais e filhos deve estar muito mais permeada pelo afeto e pela construção do que pelo controle de todas as circunstâncias, além da tentativa de dominar as pessoas.

“O controle chama outros aspectos da relação que têm a ver com a dominação, com o discurso de ‘você, satisfaça todos os meus desejos, senão…’”, alerta Cláudia. Diante dessa complexidade, fugir dessa lógica é uma tarefa que exige rompimento com as regras e com os padrões sociais. Só assim será possível ter espaço para inventar outras possibilidades de vida – inclusive sem filhos, se esse for o caso.

Fertilização segue protocolos variáveis

A reprodução assistida corresponde a um conjunto de técnicas utilizadas por médicos especializados cujo objetivo principal é tentar viabilizar a gestação em casais que possuem alguma dificuldade de engravidar.

O papel de um especialista nesse tipo de fertilização é, acima de tudo, esclarecer o casal infértil sobre todas as etapas do tratamento, apontando probabilidades e riscos de uma gestação de gêmeos. Ou seja, apesar do desejo de muitos casais, não basta querer ter gêmeos para que seja feita a sua vontade.

No Brasil, segundo regulamentação do Conselho Federal de Medicina, o protocolo para fertilização in vitro permite que sejam implantados até dois embriões em mulheres com até 35 anos e três em mulheres com idades acima dessa. E as chances de esses embriões se tornarem, de fato, fetos gêmeos, são pequenas.

“A chance real de engravidar na fertilização in vitro é de 50%. Com dois embriões implantados, a probabilidade de uma gravidez gemelar gira em torno de 5% a 10%. Com três embriões, elas sobem para 20%. Então, se formos olhar os números absolutos, a chance real de uma gravidez gemelar é de, no máximo, 10%”, explica Marco Sampaio, diretor da clínica Origen.

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