Vida a dois

Semelhantes se atraem e são mais felizes juntos, diz estudo

Pesquisadora defendeu tese na UFMG sobre características da felicidade no casamento; religião e visão política estão muito relacionadas com a satisfação na união


Publicado em 18 de maio de 2016 | 03:00
 
 
 
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Juntos há sete anos, os geógrafos Tereza Bernardes e Felipe Bertelli, ambos com 27 anos, dividem semelhanças em vários aspectos de suas vidas. Os dois nasceram no interior de Minas Gerais e vieram para a capital estudar. Escolheram fazer o mesmo curso na faculdade, onde se conheceram. Eles também possuem a mesma cor de pele, fazem parte da mesma classe social, dividem a mesma religião, mesmo posicionamento político e, muitas vezes, os mesmos hobbies. Apaixonados por séries, eles acreditam que as semelhanças são responsáveis pela felicidade conjugal.

Felipe e Tereza ilustram uma pesquisa realizada no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) segundo a qual as características semelhantes de um homem e de uma mulher são determinantes para o sucesso e a felicidade de ambos, tratando-se de casamento.


A pesquisa foi feita pela professora adjunta de ciências atuariais da Universidade Federal de Alfenas, Luísa Pimenta Terra, e resultou na sua tese de doutorado, “Homogamia de Valores e Felicidade Marital no Brasil”, defendida em fevereiro deste ano no programa de pós-graduação em demografia da UFMG.

“Casais com valores similares apresentam mais chances de serem felizes na vida conjugal. Quanto mais valores em comum, maior a felicidade”, afirma a pesquisadora. Luísa utilizou dados extraídos da pesquisa World Values Survey (WVS), desenvolvida em 1981, que mensura as mudanças nos valores relacionados a religião e participação política, entre outros fatores. Dados sobre a felicidade marital foram apurados no Brasil em rodada de questionários realizada em 1991, com 1.025 casais.

A partir das variáveis utilizadas na pesquisa, constatou-se que religião e a visão política estão relacionadas com a satisfação no casamento.

“Constatei que casais que apresentam a mesma religião são mais satisfeitos com a vida conjugal. Dependendo da crença dos dois, a comunidade religiosa ‘participa’ como agente fiscalizadora do matrimônio. E como muitas dessas comunidades condenam o divórcio, isso faz com que os casais busquem o sucesso na união”, diz a pesquisadora Luíza Terra. “O mesmo acontece quando a união é formal. A existência de um relacionamento formalizado aumenta a pressão da felicidade conjugal”, explica.

Limitações.Os dados obtidos são embasados em premissas da literatura sobre o tema. Por exemplo, de acordo com Luísa, há publicações que mostram que a presença de filhos tem um efeito negativo na vida do casal e que os brancos têm mais felicidade.

Na pesquisa, esses dados não se mostraram significativos devido ao tamanho da amostra. Essa é uma das limitações do estudo, apontada pela própria pesquisadora. Segundo Luíza, a amostragem foi pequena e conta com as respostas de só uma pessoa do casal, mas isso será resolvido em breve.

“Pretendo continuar estudando esse assunto e ampliar a pesquisa utilizando dados mais atuais, incluir casais homossexuais e aumentar o número de casais estudados”, argumenta.

Contudo, esse é o primeiro levantamento sobre determinantes da felicidade marital no Brasil. Essas informações, de acordo com a professora, são necessárias para a realização de um plano demográfico da família.

“A felicidade no casamento tem implicações que vão além da relação a dois. Há estudos mostrando que a falta de satisfação no casamento impacta a vida dos filhos e a produtividade no trabalho”, afirma Luísa Terra.

Doutorado

Tese. O estudo “Homogamia de Valores e Felicidade Marital no Brasil”, de Luisa Pimenta Terra, foi apresentado neste ano sob a orientação dos pesquisadores Gilvan Guedes e Maria Carolina Tomás. 

Contexto político influencia fortemente os relacionamentos

As variáveis utilizadas na pesquisa dizem respeito a atitudes relacionadas a religião e sexo, além de padrões morais e opiniões políticas. Também foram analisadas características como idade, raça, cor, escolaridade, tipo de união (formal ou consensual) e presença de filhos.

Observando os dados coletados e as variáveis analisadas, a autora Luíza Terra observou que os casais mais velhos, que se casaram durante o período da ditadura militar, possuem um nível maior de compartilhamento de valores políticos. Esse é um fator que mensura a felicidade e a satisfação matrimonial.
A pesquisa mostra que gerações que vivenciaram momentos de grande mudança política, principalmente após um período de repressão, tendem a compartilhar mais intensamente os valores e as atitudes políticas do que gerações que experimentaram períodos de democracia.

“O contexto político pode afetar a escolha do parceiro, e, consequentemente, o sucesso conjugal. Na época da ditadura, era muito difícil pessoas com posicionamentos políticos diferentes se relacionarem”, explica.

Com o fim do período militar e a consequente restauração da democracia, os valores políticos e as semelhanças ideológicas de um casal acabaram se modificando. Entretanto, a pesquisadora alerta que, no atual cenário político, isso pode estar voltando.

“Os relacionamentos atuais e a felicidade do casal podem ter relação com a divisão política e ideológica do país. Mas ainda não dá pra prever com precisão até que ponto essa divisão está relacionada com o casamento”, explica Luíza.

Além da ideologia política, a escolaridade dos casais estudados foi outra variável na pesquisa. A autora percebeu que casais com uma maior escolaridade eram mais insatisfeitos com a vida a dois. (MA)

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