Alunos com defasagem de aprendizado, dificuldade de concentração e de relacionamento com colegas e professores. Após quase dois anos de ensino remoto ou híbrido, o diagnóstico do ano letivo de 2022, que marcou o retorno às aulas presenciais em Minas Gerais, acendeu um alerta: ninguém saiu imune. Em maior ou menor grau, escolas públicas e particulares ainda enfrentam desafios para compensar as lacunas pedagógicas e socioemocionais sofridas pelos estudantes nos últimos anos.

À frente das salas de aula, a realidade que os professores enxergam é preocupante. Questionados sobre como seria o desempenho dos estudantes ao longo do ano, 89% temiam que os alunos não conseguiriam alcançar o rendimento esperado. Na percepção de 36% dos educadores, os alunos se sentiam despreparados para retornar às aulas presenciais. Os dados são do Instituto Península, que ouviu, no primeiro semestre de 2022, cerca de mil educadores de todas as regiões do Brasil.

Roberta Pereira, 16, faz parte desta estatística. “Não consegui acompanhar no ensino remoto porque o aplicativo que a minha escola estava usando para fazer as videoaulas sempre caía. Sem contar que, na época, eu não tinha acesso à internet, então ficava bem difícil participar”, conta a estudante do primeiro ano do ensino médio da rede pública, em Contagem, na região metropolitana Belo Horizonte.

Sem conexão com a internet, Roberta passou a receber o conteúdo por apostilas, porém não conseguiu estudar sozinha. “Ficou bem difícil aprender sem um professor para explicar e tirar as dúvidas”, relata a adolescente.

Depois dessa experiência, o reencontro com a escola, professores e colegas foi marcado pela insegurança. “Eu não estava preparada, pois não tinha conseguido aprender os conteúdos antigos e, para que eu conseguisse aprender os novos, precisava ter aprendido. Então, a maioria passou de ano sem saber ou aprender nada”, completa. 

Educadores apontam que o período de aulas remotas foi vivenciado de maneira muito particular por cada aluno. Alguns com mais, outros com menos suporte nas aulas online, conflitos em casa e equilíbrio emocional nas relações familiares. 

Segundo o supervisor pedagógico do ensino médio do Colégio Santo Agostinho, Petrônio Ferreira, as lacunas acadêmicas já eram esperadas, e gerenciar o descompasso dentro da sala de aula exigiu muita flexibilidade.

“O que fizemos no retorno foi diagnosticar, por meio de alguns instrumentos, para ter mais clareza de quais eram essas lacunas. E fazer processos de retomada de conteúdos, conceitos ou habilidades que eram essenciais para a progressão do currículo”, explica o educador. “Os recursos utilizados nesse modelo de ensino a distância não foram suficientes para o desenvolvimento das habilidades esperadas em cada faixa etária”, afirma. 

Sequência de conteúdo

Em turmas com níveis de aprendizado tão distintos, a estratégia usada pela instituição foi dar sequência aos conteúdos de cada série e voltar em algum conceito, quando necessário. “A gente não podia ter ilusão de que em um ano iria recuperar tudo aquilo que estava perdido, caso contrário, ia acabar na verdade retomando o ano anterior”, comenta Petrônio.

E o esforço tem sido coletivo para trilhar esse caminho de retorno ao novo normal. “Além dos professores, o estudante que sabia um pouco mais ajudava o que sabia um pouco menos. Essa diversidade de saberes vai fazendo a turma avançar”, detalha.

Para 2023, o ritmo vai permanecer o mesmo. “Todo mundo está na mesma página de novo. E por que a gente fala isso? Porque a educação foi impactada desde o processo de alfabetização. Alguns estudos do campo da educação falam em aproximadamente dez anos para se voltar ao aprendizado normal”, completa.

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