A temporada Minas S/A Desenvolvimento e Construção tem hoje o segundo episódio, com Angelo Oswaldo de Araújo Santos, prefeito de Ouro Preto (MG), nas plataformas de O Tempo.
Angelo Oswaldo fala sobre os novos investimentos na hotelaria da cidade com a chegada do grupo português Vila Galé, a partir de 2025.
O prefeito conta que Ouro Preto também está na repactuação para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, da Samarco.
A prefeitura também tem feito um grande trabalho de educação patrimonial. Após a pandemia, a cidade histórica tem registrado um novo movimento, como no Museu da Inconfidência, que foi visitado por 50 mil pessoas em julho do ano passado.
“Nós devemos implantar este ano, também, um parque tecnológico com a Fundação Gorceix”, anuncia o prefeito.
Dentre os vários desafios, ele fala sobre a contenção de encostas, saneamento e saúde.
A seguir a entrevista na íntegra:
HL: Prefeito a gente já sabe de toda a sua trajetória importante para a história de Minas Gerais e para o Brasil, mas para quem começa a acompanhar agora, você é jornalista, escritor, curador de arte, advogado e gestor público, e está no quarto mandato como prefeito de Ouro Preto/MG, além de toda a experiência no Poder Público como secretário de Governo, de Cultura. Conta um pouquinho para a gente essa sua trajetória tão vasta.
AO: Bem, eu nasci em Belo Horizonte/MG e meus pais vêm de famílias dos quatro cantos de Minas Gerais. Eu não tenho nenhum vínculo familiar diretamente ligado a Ouro Preto/MG, mas foi a cidade que eu elegi. Desde criança, eu me sensibilizava muito com Ouro Preto, estudei na Escola Santo Tomás de Aquino, uma escola que ainda existe em Belo Horizonte/MG, é uma tradição na cidade, e pela Escola Santo Tomás de Aquino nós íamos todo ano a Ouro Preto, ou até mais de uma vez por ano, fazer trabalhos escolares, e eu ficava desenvolvendo aquilo permanentemente, sempre muito fascinado pela cidade. Depois fui chamado pelo escritor Murilo Rubião e incentivado pela escritora Lúcia Machado de Almeida a participar da criação da FAOP, Fundação de Arte de Ouro Preto, no Governo Israel Pinheiro, eu era muito jovem, e logo veio o governo Rondon Pacheco e eu fui para o Conselho da Fundação de Arte, presidida por Murilo Rubião, uma pessoa admirável com quem eu trabalhei também no Suplemento Literário do Minas Gerais, que marcou época. O Suplemento foi uma publicação de vanguarda, imagina, na barriga do Diário Oficial do Estado e em pleno Regime Autoritário, o Suplemento era uma expressão de vanguarda, de inovação e até de inquietação das pessoas com relação ao que que está acontecendo em Minas Gerais, mas foi muito importante, uma experiência maravilhosa, e depois eu fui, me formei na UFMG, na Faculdade de Direito da UFMG, em 1971. Recebi da nossa Reitora Sandra Goulart Almeida a medalha do mérito da UFMG, dada aos ex-alunos, recebi juntamente com a ministra Carmen Lúcia Antunes Rocha, uma honra muito grande, recentemente que isso também aconteceu. E fui à França com uma bolsa do Governo Francês, fiquei 3 anos, na volta eu fiquei muito em dúvida se eu permaneceria em Belo Horizonte ou se eu iria para o Rio de Janeiro. Minas Gerais exporta minérios e mineiros, dizia o Otto Lara Rezende, e jornalista naquela época ia mesmo embora.
HL: É, não tinha jeito de ficar aqui, né?
AO: Meus colegas todos já tinham partido, fizeram como Humberto Werneck, por exemplo, o Nirlando Beirão, a glória do jornal da Tarde em São Paulo, nos anos de apogeu da imprensa e do Jornal da Tarde, que era uma inovação, e eu tive um convite pra ficar no Rio de Janeiro, no Jornal do Brasil, e comecei a trabalhar no Caderno B publicando matérias assinadas e é isso, 1976, no final do ano, mas a escritora Lúcia Machado de Almeida falou “você não pode sair de Minas Gerais”, e eu fiquei muito marcado por aqui, ele achava que era um período difícil, um regime autoritário no país, um esvaziamento muito grande da cultura, muita pressão e opressão, e eu queria fazer alguma coisa positiva, e o Prefeito eleito de Ouro Preto/MG, o médico Alberto Caram, me convida para ir para Ouro Preto trabalhar com ele, então eu fiquei 6 anos em Ouro Preto
HL: Juntou a fome com a vontade de comer, como a gente diz.
AO: Eu fiquei em Ouro Preto de 1977 até 1983, em seis anos trabalhamos muito, foi quando Ouro Preto recebeu então o título de monumento mundial, o primeiro bem brasileiro inscrito na lista do patrimônio da humanidade, estabelecida pela UNESCO em 1972, hoje nós já temos aí 17 bens brasileiros, inclusive mais 3 mineiros, Congonhas, que veio logo depois, o conjunto de Congonhas pelo valor da obra do Aleijadinho, o reconhecimento mundial da importância de Antônio Francisco Lisboa como arquiteto, escultor e entalhador, e em seguida Diamantina. Diamantina se caracterizou como uma expressão do distrito Diamantino, que era um Estado dentro do Estado. Ouro Preto representa as cidades do ouro e Diamantina representa o ciclo do diamante no norte do Estado, distrito Diamantino, a área de demarcação Diamantina, e o Arraial do Tijuco, então, foi escrito como Monumento Mundial, e recentemente a paisagem cultural da Pampulha, que é um marco, realmente, a primeira grande expressão de arquitetura moderna no Brasil, logo depois do palácio Capanema no Rio de Janeiro e de Cataguases também, que já tinha o Colégio Cataguases do Oscar Niemeyer, mas como um conjunto é realmente a Pampulha ali com o Cassino, a Casa do Baile, a Igreja de São Francisco e o Iate Clube.
HL: Quando a gente vai a Ouro Preto, e cada vez que a gente vai é um olhar, o que eu reparo muito é que o Barroco em Minas, em Ouro Preto, ele tem peculiaridades que são daqui, não é? Que não tem lugar nenhum no Mundo.
AO: Bom, primeiro o nosso relevo é Barroco, as montanhas já fazem uma ondulação barroquista no nosso espaço geográfico, nosso território é barroco, tem essa vocação, seja nas montanhas, seja nas nuvens. Quem captou isso muito bem foi o Guignard, que fundia montanhas e nuvens pintando. Nós estamos celebrando aí os 80 anos da chegada de Guignard a Minas Gerais para criar uma Escola de Arte em Belo Horizonte a convite do prefeito Juscelino Kubitschek, e depois ele vai se radicar em Ouro Preto onde está enterrado, faleceu em 1962, mas essa paisagem barroca colheu muito bem as edificações barrocas, você vai ver que em Ouro Preto todos os cumes, os píncaros dos morros estão coroados ali por uma igreja. É São Francisco de Paula, Santa Efigênia, a Igreja do Bom Jesus no Ato das Cabeças, a Igreja das Mercedes de Baixo, São Francisco de Assis, nós vamos vendo as igrejas pontuando… Mercedes de Cima, a Igreja do Carmo, as igrejas vão pontuando, desenhando a paisagem, suspendendo o horizonte da cidade, suspendendo o olhar de quem atravessa o espaço urbano e isso é muito bonito. Ouro Preto é uma cidade de perspectivas, qualquer ponto onde você estiver no centro da cidade você vai ter uma visão encantadora de alguma coisa, de um beco, de uma ladeira, de uma igreja, de uma torre, de uma vegetação, de um conjunto de telhados do casario, alguma coisa vai cativar o seu olhar e isso é também uma sensação barroca, porque o Barroco é uma arte que surgiu exatamente para encantar o olhar, para seduzir o olhar, o olho é que conduz a forma barroca, aquilo que é visto tem que ser magnificente e o que não é visto não interessa. Você pode olhar nas igrejas atrás dos altares, por exemplo, parece assim uma precariedade total, porque a preocupação era com o que ia aparecer, o que não ia aparecer é opulência contrastando com a precariedade, né, num paradoxo grande. Mas, então, Ouro Preto é uma cidade singular e é claro que o Barroco nosso é diferente, porque ele não é o Barroco europeu que foi transplantado, nós temos muita coisa no litoral que desembarcou dos navios portugueses para a construção dos mosteiros, das igrejas. A Igreja da Conceição da Praia, em Salvador/BA, ela é um quebra-cabeças que veio como lastro de navio, as peças em pedra lioz, de Portugal, desembarcaram e foi remontada a Igreja da Conceição da Praia na cidade baixa de Salvador, e Ouro Preto não, Ouro Preto que estava longe do litoral… de Ouro Preto ao Rio de Janeiro era um mês de viagem. E não dava para importar também. Só uma igreja de Ouro Preto, e praticamente de Minas Gerais, tem azulejos nas ilhargas da Capela Mor, porque a Igreja do Carmo, que era ordem dos carmelitanos brancos portugueses nascidos em Portugal, eles fizeram questão de importar os azulejos, mas imagina trazer esses azulejos de navio, depois em lombo de burro do Rio de Janeiro até Ouro Preto, e remontar aqueles azulejos, era uma dificuldade muito grande, e aí o que o Ataíde vai fazer na Igreja de São Francisco? Ele pinta sobre madeira painéis de madeira fingindo azulejo. Então é muito mais interessante ver esses fingimentos do que até os azulejos originais, que são muito bonitos, mas a originalidade, a peculiaridade dessa inventividade do Ataíde, do pintor Manuel da Costa Ataíde, isso aqui é sensacional. E nós vamos ter também muita coisa assim graças aos africanos, porque houve uma fusão, nós somos uma cultura afro-luso brasileira, uma contribuição indígena também, e faz toda a diferença. A nossa base é essa, é a contribuição, os africanos introduziram muitas coisas que nós não sabíamos ou não podíamos praticar na colônia, então os africanos foram enriquecendo aquela colônia portuguesa, porque eles conheciam o fabrico de ferro e fizeram forjas clandestinas no interior, eles conheciam a fiação e criaram rocas, inclusive a Rainha Maria I mandou destruir as rocas, porque estava se usando muito pano feito no interior das Minas Gerais em detrimento da compra do pano inglês, e os ingleses cobraram de Portugal que não houvesse fabricação, por causa do Tratado de Methuen, de 1713, então já houve uma repressão até a essas atividades que eram desenvolvidas pelo saber africano, e nós temos descoberto muita coisa, inclusive na igreja de Santa Efigênia, em Ouro Preto, o Marcelo Hipólito, que é um guia de turismo, ele fez uma leitura de todos os signos, todos os símbolos africanos que estão incrustados ali na talha barroca da Igreja de Santa Efigênia.
HL: Tudo tem uma explicação? Aliás, também na praça Tiradentes as casas lá tem uma curiosidade, que têm casas lá com uma fundição de ferro muito própria, não é?
AO: Não, é um conjunto Alpoim, o Brigadeiro José Fernandes Pinto Alpoim que construiu a matriz de Barbacena, de Nossa Senhora da Piedade em Barbacena, construiu a Casa do Trem, a Casa do Trem no Rio de Janeiro, que é hoje parte do Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro. Ele construiu também um Palácio dos Governadores, fez a planta de Mariana/MG, em 1745, para reorganizar a cidade que ia receber o primeiro bispo de Minas Gerais. Ele construiu esse conjunto e uma das casas tem uma sacada de ferro batido toda trabalhada com uma frase em homenagem ao Governador da época.
HL: Nossa, coisa linda! Prefeito, agora Ouro Preto também vive um um novo grande investimento que vai gerar muito valor agregado para cidade, muito emprego, uma cadeia de fornecedores que a gente sabe que exige-se muito, né, a área hoteleira, com a vinda do do Grupo Vila Galé, que vai inaugurar um hotel, agora em 2025, a gente espera, até abril. Como é isso?
AO: Nós temos um grande programa, inclusive criamos a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, o Conselho Deliberativo de Desenvolvimento Econômico com a participação de todas as pessoas que podem trazer de fato uma contribuição para acelerar a diversificação do nosso desenvolvimento, que nós já sentimos, hoje, que a mineração está mais nos municípios vizinhos do que propriamente no município de Ouro Preto, então nós temos que diversificar a nossa economia e já criar, antecipar o futuro com outras vocações, e uma delas, além da agricultura familiar, do artesanato, de pequenas atividades da economia criativa, nós temos também o turismo com base na hotelaria e na gastronomia, a culinária ouro pretana é espetacular. A nossa goiabada de São Bartolomeu, inclusive, é patrimônio cultural imaterial do nosso município. Nós temos, aí, uma cadeia de restaurantes nos distritos e na cidade.
HL: A gente sai da dieta, né? Porque os doces de lá, como o senhor falou aí… São Bartolomeu é incrível!
AO: É realmente espetacular. Um dos prazeres da visita a Ouro Preto é também ter uma boa mesa à disposição de todos, e por isso nós conseguimos com o Governo do Estado, através do Invest Minas, antigo Indi, e da Secretaria de Cultura e Turismo, captar o grupo Vila Galé. O grupo Vila Galé já está estabelecido em várias cidades brasileiras, cidade de praia, é um grupo português, tem muitos hotéis em Portugal, está inaugurando um hotel em Cuba, é um grupo que tem uma potência enorme no campo do turismo. Tem hotéis em Portugal, na Espanha e no Brasil, no Rio de Janeiro, em Salvador, em Fortaleza, vai inaugurar mais um hotel em Fortaleza, Maceió, e ficaram encantados com Minas Gerais. E nós fomos apresentar então o antigo Quartel de Cavalaria, construído em 1775, em Cachoeira do Campo/MG. Esse quartel, curiosamente, tem na fachada um medalhão com as armas de Portugal. Esse medalhão foi entalhado pelo Aleijadinho para inauguração do quartel, que se deu em 1779.
HL: É o Quartel da Tropa Paga de Tiradentes, não é?
AO: Quartel da Tropa Paga. A Polícia Militar de Minas Gerais considera a sua origem exatamente no início da construção desse quartel, em 1775, quando se organizou uma tropa paga na capitania de Minas Gerais, antes havia milícias à disposição do governo, mas uma tropa, um regimento próprio de cavalarianos e de dragões foi o que aconteceu em 1775, com o governador Antônio de Noronha, que manda construir esse quartel, inclusive ele arregimenta um grande número de 4 mil homens de armas e manda pro Rio de Janeiro, inclusive o Aleijadinho vai junto como arquiteto, Antônio Francisco Lisboa, porque eles iam descer para Santa Catarina de navio para expulsar os espanhóis caso eles insistissem na invasão de Santa Catarina, mas em 1777 veio o tratado de Santo Ildefonso e os mineiros voltaram para o quartel de Cachoeira do Campo, não chegaram a ir até Santa Catarina, e o quartel teve uma importância muito grande. Depois em 1808, quando Dom João VI chega ao Brasil, ele manda buscar os cavalos de Alter do Chão, eram os cavalos da Coudelaria Real de Alter do Chão, que serviam ao exército do Rei de Portugal, e Dom João VI sabia que eram cavalos muito importantes que tinham que vir para aqui, descendente de um cavalo árabe que foi doado a um rei português, e então criou-se essa raça de cavalos portugueses descendentes dos cavalos árabes. Eles vieram para o Brasil e ele destacou uma parte dos cavalos, que ficaram em Santa Cruz, no Rio de Janeiro, onde há até uma dependência do exército até hoje, ela tem cavalaria lá até hoje em Santa Cruz, é um regimento do exército brasileiro, e uma parte ele mandou para o quartel de Cachoeira do Campo/MG, porque se Napoleão invadisse o Rio de Janeiro… Napoleão já tinha invadido Portugal, mas não prendeu o rei. O rei da Espanha estava preso e os outros reis destronados, e então ele, por medida de segurança, para ter uma retaguarda, os cavalos vieram para cá e criou-se a Coudelaria Real. No período das regências, depois Dom João VI volta para Portugal, Dom Pedro faz a independência, Dom Pedro abdica e volta para Portugal em 1831, vai morrer em 1834, nesse período de 31 a 1840, quando Dom Pedro II vai se tornar Imperador, esse período foi um período muito conflituoso, de revoltas populares, é um período muito rico da história do Brasil, de manifestação da população, a população que quer participar e se insurge a todo tempo, o país tá efervescente e borbulhante, em 1833, há 190 anos atrás, houve uma revolta grande em Ouro Preto, chamada Revolta do Ano da Fumaça, e com batalhas no distrito de Rodrigo Silva, e nesse período, então, o Governo de Minas Gerais resolve vender os cavalos em leilão, porque era muito caro para o governo manter a Coudelaria, e o Barão de Alfenas vai arrematar os cavalos e vai levar para suas fazendas entre rios, em Cruzília/MG, para o sul de Minas, e aí vai surgir a raça mangalarga e também o campolino.
HL: Mangalarga marchador que a gente tem hoje. A origem é em Minas, não é? Cavalo lindo, reconhecido.
AO: O doutor Jorge Rebelo, que é o Presidente do grupo Vila Galé, ele quer também trabalhar com os haras da região, ele não vai criar, porque tem muitos haras de alta qualidade na nossa região, e ele está plantando vinhas, ele quer fazer um vinho do Vila Galé em Ouro Preto.
HL: Ou seja, essa preservação toda do espaço está garantida, não é Prefeito?
AO: O quartel, ele entrou em decadência e ele foi até fechado, estava parado no tempo e no espaço, com o fim da coudelaria, com o fim do quartel, vem a República e o presidente João Pinheiro, logo no início da República, ele sendo presidente de Minas Gerais ali em 1891, ele convida os Salesianos que viessem da Itália, com fama de grandes educadores, para criar um colégio agrícola. Depois o presidente Arthur Bernardes leva esse colégio agrícola para Viçosa/MG, e os Salesianos mantém um Ginásio Internato que vai durar praticamente até 2013. Foi uma Casa de Retiro também, no final o colégio já tava fechando, e de 2013 para cá estava fechado e em arruinamento.
HL: Nossa, que tristeza.
AO: Então foi providencial a vinda dos Salesiano, a vinda do Vila Galé, e esse bom entendimento com Salesianos.
HL: E está ficando lindo, não é?
AO: A obra está acelerada, o Presidente Jorge Rebelo já anunciou que vai inaugurar no dia 25 de abril do ano que vem.
HL: É uma uma semana super emblemática pra gente, do 21 de abril…
AO: A data da Revolução dos Cravos. Nós temos o 21 de abril e o 25 de abril é muito importante para Portugal, que é o fim do regime autoritário, o fim do regime ditatorial em Portugal e mudou a face de Portugal, inclusive, repercutiu também na abertura política do Brasil. Eu tenho certeza que vai ser uma festa linda a inauguração do Vila Galé, que vai trazer um primeiro hotel de bandeira internacional de Minas Gerais, que vai nos trazer muitos turistas europeus também, e de outras partes do Brasil e da América Latina, das Américas, porque nós vamos ter essa ponte aí: Ouro Preto, Mariana, Congonhas, Inhotim, Caraça, Belo Horizonte, Pampulha…
HL: Os distritos todos de Ouro Preto, e dá para visitar tudo.
AO: Serra do Cipó, a Serra do Espinhaço, que é um patrimônio da humanidade, então tanta coisa maravilhosa que nós temos em Minas Gerais e vamos ter esse ponto de apoio aí, o pivô de toda essa grande circulação em torno dos atrativos de Minas Gerais.
HL: Ou seja, preserva o patrimônio local e garante emprego, renda para a cidade, fornecedores que vão para lá e vão levando essa roda da economia que vai girando, que é o mais importante, não é?
AO: É, nós temos procurado diversificar a nossa economia. É claro, queremos a mineração compatibilizada com o desenvolvimento social e com a preservação ambiental, que a mineração não pode apenas extrair, ela tem que trazer também, deixar alguma coisa no lugar, tem que ter um legado. Eu dizia que o ouro nos deixou o barroco, o minério de ferro não pode nos deixar o barraco ou barro apenas, então nós tivemos um embate muito grande com as mineradoras, mas hoje eu já sinto que há uma mudança comportamental dos representantes das mineradoras, não substituindo a arrogância pelo diálogo, a prepotência por uma nova comunicação. Eles se julgavam donos do mundo, não podem fazer conosco o que os soberanos portugueses fizeram no século XVII e XVIII, nós temos que ter um um diálogo civilizado e a empresa tem que ser cidadã, uma empresa mineradora tem que estar inserida no processo social, não apenas no processo econômico, ela tem que participar, ouvir e retribuir, ela tem que remunerar também a comunidade, não apenas com imposto. Imposto, a palavra já diz tudo, é imposto, ela tem que pagar, mas é como cidadã, essa empresa tem que também contribuir com algo mais para o processo de desenvolvimento, aquilo que ela extrai, aquilo que ela perturba, porque ela sempre vai trazer legiões, às vezes, de pessoas que tem que fazer ali no momento de instalação de uma vida, é perturbações grandes, é os licenciamentos ambientais, né, então tem que haver, nós entendemos que a mineração… nós somos mineiros, não somos minenses, né, somos mineiros
HL: Está no nome, Minas Gerais.
AO: Está no nome, é um gentílico, como brasileiro, brasileiro é quem corta Pau Brasil, nós estamos cortando Pau Brasil até hoje, somos brasileiros (risos), não brasilienses ou brasilianos, mas brasileiros, e os mineiros também, Minas Gerais é um estado minerador, mas para isso nós temos que civilizar a mineração, ela tem que ter um padrão comportamental digno da população de Minas Gerais e das tradições do estado de Minas Gerais, o Estado que sempre teve uma afirmação política muito grande na vida do país, nós não podemos depreciar a nossa dignidade cidadã em função da arrogância de uma empresa mineradora como a Vale, é importante que ela saiba dialogar e eu tenho notado essa mudança. Nós tivemos muitos embates, a Amig, Associação Mineira de Municípios Mineradores, se tornou tão importante que os demais municípios mineradores do Brasil não quiseram criar associações nos seus Estados, mas eles aderiram a Amig. Então a Amig, hoje, é Associação de Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil, sob a presidência do nosso querido Prefeito de Conceição do Mato Dentro/MG, José Fernando Aparecido de Oliveira.
HL: E isso é tão bom, né? Porque vai Minas retomando o protagonismo dela, não é? Que ela sempre teve desde a política do café com leite a gente vai tendo essas novas lideranças e esses novos pensares aí, que você está falando.
AO: Novas atitudes. Esses problemas todos nós tivemos com o desastre de Mariana/MG, que eu nem digo que é de Mariana, é que é o desastre da Vale, da BHP e da Samarco.
HL: Ouro Preto está também nessa repactuação? Como vocês estão aí?
AO: Claro. A Samarco está baseada em Ouro Preto, o chão da Samarco é ouro-pretano, porque ela se instalou no município de Ouro Preto desde os anos 70, ela construiu a vila Samarco para os seus altos dignitários e hoje é a vila residencial Antônio Pereira, mas é a vila Samarco. A sede da Samarco, as minas principais da Samarco, vem do município de Ouro Preto, na Serra de Timbopeba, na serra de Ouro Preto, na fronteira com Santa Bárbara, Catas Altas e Mariana. Então é muito importante que a Samarco reconheça, a Vale, a Samarco e a BHP, reconheçam também Ouro Preto como município vitimado, o que não tinha acontecido. O desastre aconteceu no dia 5 de novembro de 2015, e quando eu assumi a prefeitura em 2021, Ouro Preto não estava na lista dos municípios atingidos
HL: Nossa!
AO: É. Então nós lutamos tenazmente para esse reconhecimento e eu tenho certeza que haverá uma compensação, agora também, na lista dos municípios todos do Vale do Rio Doce que foram atingidos. São municípios de Minas Gerais indo até o Espírito Santo, até o litoral, porque o próprio oceano Atlântico sofreu danos com tudo aquilo que escorreu pela Bacia do Doce.
HL: Você acha que essa repactuação sai ainda esse ano, antes de completar 10 anos dessa tragédia?
AO: Já são, podemos dizer, caminhando para os 9 anos e é muito importante que haja logo uma decisão. Tudo se posterga, tudo se protela e é preciso que esta geração que sofreu seja recompensada, não adianta vir essa compensação daqui há 20 anos, daqui há 30 anos, e os recursos que vierem para o município têm que ser aplicados em favor da população. Em Ouro Preto, por exemplo, nós vamos aplicar, preferencialmente, e já estamos fazendo os primeiros entendimentos para o distrito de Antônio Pereira, onde está situada a Samarco e foi o distrito que foi diretamente atingido, foi prejudicado terrivelmente e assombrado por essa questão e ainda hoje sofre com a barragem de Doutor da Vale, que está dentro da área urbana de Antônio Pereira e é uma barragem que está em processo de descaracterização, mas trazendo muita preocupação. Houve, inclusive, uma evacuação de várias áreas urbanas de Antônio Pereira, a população teve que se mudar, deixar suas casas e ir para outro lugar com apoio da Vale, evidentemente...
HL: Mas muda a vida toda da pessoa, a história dela, né?
AO: Com esse fantasma de um possível desastre. Nós tivemos em 2015, então em 2019 tivemos Brumadinho/MG, então é uma coisa que pode acontecer. Vez por outra aparece alguém dizendo que “ah, essa barragem tal, aquela barragem tal…”, mas hoje há um monitoramento grande, um acompanhamento, não só dos órgãos municipais, mas sobretudo dos organismos estaduais.
HL: Agência Nacional de Mineração
AO: A ANM, que era o DNPM e que agora é uma agência, e que acompanha o Ministério Público, a Defesa Civil Estadual, Federal, Estadual e Municipal, então nós temos o máximo de atenção, fazemos o acompanhamento e queremos essa mineração sadia, uma mineração que saiba atuar competentemente e desempenhando um papel cidadão, porque a empresa não pode apenas explorar, ela retira, como foi feito no século XVIII, levaram o nosso ouro. O ouro nem ficou em Portugal, ele foi para a Inglaterra, foi pro Vaticano, ele proporcionou a Revolução Industrial na Inglaterra e nós ficamos com essas cidades Barrocas e muitas delas já prejudicadas até pela descaracterização, porque tem muitas pessoas que ainda não reconhecem a importância da preservação do patrimônio histórico, é uma luta que nós temos em Ouro Preto permanentemente.
HL: E não somente em Ouro Preto, né, Prefeito, porque, por exemplo, a gente tem Santo Antônio do Leite/MG, tem um amigo lá que ele me falou “olha, tem uma riqueza imensa lá com as pinturas”. As pinturas de Honório Esteves e uma igreja de 1858, quer dizer, como fazer para manter toda essa exuberância, não é? É um outro desafio também.
AO: Por exemplo, Santo Antônio do Leite, essas pinturas estão em bom estado. As pinturas de Honório Esteves que sobreviveram a uma grande reforma que foi feita na igreja, mas com muito cuidado, o conjunto de pinturas de Honório Esteves foi preservado, mas o distrito de Santo Antônio do Leite, por exemplo, tem a Folia de Reis do seu Ismael, que é um patrimônio imaterial também, então a riqueza é muito diversificada, não só nas construções e nas edificações, nas obras de arte, mas também nesse patrimônio imaterial. Ouro Preto é muito rico, nós temos como essa folia de Reis, congados, pastorinhas, boi da manta e por aí a fora, uma série de tradições. Ainda agora no dia 3 de maio, que é o dia da Santa Cruz, nós tivemos todos os cruzeiros de olho preto, os cruzeiros de pedra, de quartzito, os cupidos, os cruzeiros nas pontes, nos chafarizes, nos adros, eles são enfeitados ou com flores ou com papel colorido, e tem uma celebração muito grande, é a festa da Santa Cruz, que é uma tradição, o povo vai pra rua e fazem feita e celebra, e canta, e dança, porque está na alma do povo ouro-pretano, na cidade e nos distritos, cada distrito tem uma uma vocação, tem uma tradição muito grande. O de Antônio Pereira, por exemplo, nós temos a festa da Lapa, de Nossa Senhora da Lapa, em 15 de agosto, que completou, em 2022, 300 anos, talvez seja a romaria mais antiga de Minas Gerais, dentro de uma gruta no alto da Serra de Antônio Pereira tem uma capela que foi inclusive visitada pelo imperador Pedro II, que fez questão de ir lá pra conhecer tal a fama da lapa de Nossa Senhora da Lapa de Antônio Pereira. Lavras Novas/MG é um lugar encantador que atrai turistas de toda parte. São Bartolomeu/MG foi considerado uma das 3 vilas rurais mais bonitas do Brasil, a terra dos doceiros e doceiras da goiabada, que é patrimônio material, então… Glaura/MG é muito bonito, com a Serra do Capanema, uma paisagem maravilhosa, a floresta Uaimii. Santa Rita de Ouro Preto/MG, a capital da pedra sabão. Rodrigo Silva/MG, capital do "topázio imperial", o topázio só ocorre no município de Ouro Preto e numa faixa que vai de Antônio Pereira até sobretudo Rodrigo Silva, que é o centro da mineração de topázio. Então os nossos 12 distritos se caracterizam de uma maneira espetacular. Amarantina, por exemplo, tem as cavalhadas. As cavalhadas são a luta de mouros e cristãos, é como acontece na Espanha, em Portugal, isso se preservou em Amarantina de uma maneira também muito bonita, tem o campo das cavalhadas em setembro, 21 de setembro
HL: É, eu já vi. Agora, é um desafio, né, Ângelo, manter essas tradições e a preservação das igrejas, é uma luta diária que você tem aí, não é?
AO: Nós fazemos um grande trabalho de educação patrimonial, nós temos a Casa do Professor e a diretoria de Educação Patrimonial, a Biblioteca Municipal sempre trabalhando entrosadamente de maneira a levar para as escolas como tema do dia a dia da educação, isso está inserido, não é uma disciplina à parte, é todo um processo educativo que envolve uma consciência das novas gerações sobre a importância do patrimônio histórico, e as pessoas reconhecem isso. Na pandemia, quando os turistas desapareceram, a população deu valor ao turismo, porque nós tivemos que criar até algumas bolsas para segmentos que trabalham no turismo e que ficaram completamente sem nada.
HL: Turismo foi um dos mais atingidos na pandemia, não é?
AO: O turismo foi muito atingido, e ele também se recuperou rapidamente. Hoje nós estamos aqui com um fluxo turístico espetacular. No ano passado, para você ter uma ideia, o Museu da Inconfidência, no mês de julho, que é um bom mês turístico de férias, foi visitado por 50 mil pessoas, mais do que a população da cidade.
HL: E, em parâmetros que se comparam a outros museus aí no mundo, né, que tem um movimento enorme, ou seja, é o turismo segurando a economia da cidade e dos distritos ao redor, né?
AO: E isso impulsiona o comércio de Ouro Preto…
HL: Impulsiona a agricultura, porque tem mais pedidos no campo, a Indústria, né, com os pedidos do Comércio, está tudo em cadeia, né?
AO: Exatamente. Tem a agricultura familiar… isso estabelece uma cadeia e com isso os produtos… hoje nós temos, está se fabricando azeite no município de Ouro Preto, uma série de produtos, queijos maravilhosos, e então é todo um despertar para essas atividades econômicas que trazem recursos. Nós estamos com uma série de feiras que proporcionam essa apresentação dos produtos e essa emulação toda que anima, vamos ter o Festival de Fados, agora, maravilhoso, e muitos investimentos também, porque Ouro Preto tem, especialmente a cidade, uma formação geológica que causa uma certa apreensão, nós temos áreas sujeitas a deslizamento. É curioso que as áreas ocupadas no século XVIII e XIX são muito seguras, e as ocupações mais recentes são as que ficam mais à mercê aí dos deslizamentos.
HL: Tem um histórico aí que preocupa.
AO: Os antigos não ocupavam áreas que eles pressentiam que tinha risco. Os portugueses, com a tradição dos terremotos em Portugal, e os africanos também conhecendo terremotos e problemas geológicos graves, eles se uniram ali nisso e se fundiram numa visão para evitar, e depois com esse crescimento desordenado das 5.600 cidades brasileiras, nós tivemos isso também, algumas áreas de Ouro Preto, então, estão sempre sofrendo algum impacto de deslizamento
HL: Como você tem feito com isso para evitar?
AO: Nós fizemos um grande programa, entregamos à população obras espetaculares aí de contenção de encostas feitas nos últimos 2 anos, depois de 2 anos de fortíssimas chuvas e de graves problemas, e estamos agora enfrentando o Morro da Forca, que é aquele grande maciço no centro da cidade, que sofreu um deslizamento, destruiu um casarão, isso é, viralizou no mundo inteiro e nós estamos agora numa parceria com o Governo do Estado e o Governo Federal. Só que os recursos foram liberados pela presidente Dilma em 2012, e só agora que nós estamos conseguindo aplicar. 12 anos depois, porque dois prefeitos que me sucederam não fizeram nada, o dinheiro ficou adormecido na Caixa Econômica Federal, nós conseguimos resgatar isso e a parceria ditava um alinhamento Governo Federal, Estadual e Municipal. Conseguimos acertar isso tudo agora com a Secretaria de Infraestrutura do Estado e os trabalhos já estão bastante avançados.
HL: Resolve o problema agora?
AO: Os pontos críticos foram bem atingidos e a gente tem que ter sempre cuidado, e a própria população alertada contribui também para não deixar ocorrer mais nenhum acidente dessa natureza, mas é uma região que é passível disso e temos trabalhado muito, sempre, também compreendendo a preservação na sua dimensão humana e social. Ouro Preto não é uma cidade congelada pelo tombamento, não é uma cidade parada no tempo, algumas pessoas têm uma visão equivocada, acham que ela que tinha que ser uma Disneylândia Colonial. Existe uma cidade nos Estados Unidos, Williamsburg, em que as pessoas vão pra lá de Kombis e Vans (risos) e chegam lá às 08 horas da manhã e saem às 06 horas da tarde, deixa o chapéu de três bicos, as mulheres deixam as saias, porque eles ficam lá trabalhando como se fosse uma cidadezinha do século XVIII, mas Ouro Preto não é isso, Ouro Preto é uma cidade viva e o que fascina é como Ouro Preto, que é como Roma, como Paris… Paris é uma cidade que é tombada também, mas ela é uma cidade viva, uma cidade pulsante, ela tem mil problemas, inclusive, até pode ter enchente no Rio Sena. Roma também, uma cidade que tem mil problemas com trânsito e tudo, mas é uma cidade viva, e nós temos que saber…
HL: Pujante, né, ela tem aquela pulsação, né?
AO: Essa que é a graça, esse que é o charme, esse que é o fascínio da cidade, de você ter algo que não é fake, não é um cenário, ela é uma cidade vive, que dialoga, que está conversando com a sua população, que é a primeira beneficiária dessa preservação, que o prazer de habitar e de ser é proprietária dessa cidade e dos visitantes que compartilham conosco. Então esse imenso prazer, esse alumbramento que é estar em Ouro Preto, um pôr do sol, as pessoas ficam ali no adro da igreja do Carmo, no adro da igreja das Mercedes de cima, todo mundo esperando o pôr do sol e muita gente, como aquele hábito do Rio de Janeiro, lançado pelo Carlos Leonande, de aplaudir o pôr do sol ali em Ipanema, né, no arpoador vendo o pôr do sol lá no Pico Dois Irmãos e e na pedra da Gávea, em Ouro Preto também muitas pessoas aplaudem o pôr do sol visto ali do adro da escadaria da igreja do Carmo, é uma beleza.
HL: É um acontecimento, né. A gente está tendo essa aula aqui, todas essas visões, esse olhar para o futuro e é como você disse, não é, Ângelo, é uma cidade viva e ela tem todos os desafios que uma cidade real tem, né, que é de habitação, é conter as invasões, conter o problema das pessoas, os pedintes na rua, da segurança. Como tem sido, assim, essa atuação toda na habitação, na segurança, guarda municipal, funcionalismo público, fala um pouco para a gente assim de toda essa capacitação.
AO: A cidade de Ouro Preto foi construída num local muito difícil, inóspito para o empreendimento urbano, mas ela só nasceu ali, porque dentro daquela garganta formada por 2 serras imensas havia muito ouro, ouro de aluvião descendo pelos riachos, nas encostas e também um ouro de profundidade nas galerias que foram abertas. A Serra de Ouro Preto é um queijo suíço, todo cheio de perfurações, e essa cidade não podia crescer mais, então os mineiros, logo depois da proclamação da República, pensando em Ordem e Progresso, eles não iam encontrar isso em Ouro Preto, nem a possibilidade de desenvolvimento urbano, progresso, nem a ordem, porque ali é tudo muito complicado, é barroco, como eu disse, planejaram Belo Horizonte, que foi inaugurada em 1897. A cidade de Ouro Preto ficou parada, depois ela ressurgiu com uma série de atividades e, especialmente hoje, desde 1969, ela é sede de uma Universidade Federal, ela tem também um Instituto Federal que está completando 80 anos como escola técnica este ano, então ela é uma cidade universal, é universitária sim e ela é uma cidade universal, por ser patrimônio mundial, e por isso que é sede de uma universidade. É uma cidade, portanto, da educação, da ciência, da tecnologia, da inovação, é uma cidade que tem tudo pra ser esse um grande centro. Nós temos 12 mil estudantes em Ouro Preto de nível superior e isso é fundamental para que a cidade seja, realmente, um grande centro, voltado para as transformações positivas, a inovação, que ela tem uma exemplaridade.
HL: Você me falou que você informatizou tudo, 45 escolas informatizadas, quer dizer, isso aí é para o futuro.
AO: Nós estamos informatizando as escolas de primeiro grau, preparando a escola de primeiro grau que é a base, e estimulando também para que os ouro-pretanos entrem na universidade, ouro-pretanos e ouro-pretanas, e nós temos hoje já um grande número de pessoas da terra, de nativos, dentro da universidade federal. Essa universidade foi criada sobre duas escolas, imagina, a Escola de Farmácia de 1839, e a Escola de Minas de 1876.
HL: Gente do Brasil inteiro vem para estudar nessa universidade.
AO: Ela começa a preparar agora a comemoração do sesquicentenário. Este ano, 2024, faz exatamente 150 anos que o professor francês Henri Gorceix veio para o Brasil chamado por Dom Pedro II, e ele começa a preparar a criação da escola de Minas que vai se efetivar em 1876, daí daqui há dois anos o sesquicentenário. E é muito importante, então, nós consideramos que Ouro Preto é uma cidade da inovação, do futuro, porque com uma universidade ela vai avançar. Nós devemos implantar esse ano, também, um parque tecnológico com a Fundação Gorceix. A Fundação Gorceix é uma entidade que foi criada pelo presidente Juscelino Kubitschek, em mil 1970. A três dias da inauguração de Brasília/DF, JK foi a Ouro Preto implantar a Fundação Gorceix, que está no campo privado, mas é uma fundação que veio para dar sustentação à escola de Minas e, hoje, a Universidade Federal de Ouro Preto é partícipe do nosso processo de desenvolvimento. Então nós vamos ter um Parque Tecnológico em Ouro Preto, organizado, articulado pela Fundação Gorceix. Já está tudo encaminhado, este ano deve sair.
HL: Você quer transformar, então, Ouro Preto numa referência de tecnologia?
AO: Olha que interessante, Ouro Preto é uma cidade cercada por parques. O Parque Estadual do Itacolomi, a Reserva Ecológica do Tripuí. Nós temos a área de proteção ambiental do Rio das Velhas e o Parque da Cachoeira das Andorinhas. Eu criei agora o Parque do Ojô na área leste da cidade, no Rio do Carmo, porque nós vamos começar agora um grande trabalho de saneamento básico para sanear…
HL: Fazer o descarte ideal para toda a cidade de Ouro Preto.
AO: E nessa área, onde o rio recebia até o esgoto da cidade, nós vamos criar um grande parque, o Parque do Ojô, que tem umas cavernas maravilhosas em uma cachoeira monumental. Então Ouro Preto é uma cidade cheia de surpresas, porque sempre ainda há alguma coisa a se fazer, a se explorar, e a própria população a assumir e a tirar proveito disso, tanto na cidade quanto nos 12 distritos. Nós estamos começando agora asfaltamentos importantes de Santo Antônio do Leite/MG para Engenheiro Correia/MG, com apoio do Ministério Público Estadual por compensação, com apoio da Vale, ligando Itabirito/MG ao distrito de Engenheiro Correia. Nós ligamos Ouro Preto a Antônio Pereira pela Serra, é uma das paisagens mais lindas de Minas Gerais, nós avistamos por essa estrada da purificação, porque era a estrada dos Romeiros que iam a Antônio Pereira, nós avistamos a Serra do Caraça, a Serra do Gandarela, a Serra de Timbopeba, a Serra do Capanema, o Morro do Frazão e a Serra de Ouro Preto com Itacolomi, a Serra do Itacolomi, mais atrás a Serra de Ouro Preto e do Itacolomi, então é realmente uma vista maravilhosa. Os nossos distritos Santo Antônio do Salto dentro do cânion do Rio Mainart e Lavras Novas, e Santa Rita de Ouro Preto, como eu lembrei com a pedra sabão, é uma variedade muito grande, são quase 1.300 km² de um território fantástico
HL: Ou seja, dá pra aliar isso tudo, né, Prefeito?
AO: Nós temos que conjugar reservas… nós temos reservas minerais, temos reservas ambientais, no sentido dos dos parques que estão lá já bem assentados, nós temos desenvolvido esses parques. O Parque do Itacolomi é estadual, o Estado não sabe se privatiza os parques, explora os parques, é uma pena o que está acontecendo, muita coisa no Estado lamentavelmente vive hoje um impasse.
HL: Agora, fala um pouquinho mais sobre esse Centro Tecnológico, porque eu tenho visto que muitas cidades tem feito esse caminho e tem criado assim novas oportunidades para a população que são incríveis.
AO: O nosso centro tecnológico, nós temos uma fábrica de tecidos do século XIX, a Prefeitura adquiriu essa fábrica no meu governo anterior para fazer um grande Centro de Eventos, e nós vamos compatibilizar a finalidade turística com o objetivo tecnológico, científico, industrial, numa visão de inovação, compromisso de inovação e de futuro, e estamos fazendo um chamamento público e uma das empresas que já estão preparando todo um projeto para isso é a Fundação Gorceix. Então eu acredito que ela tenha muita chance e deva implantar na fábrica de tecido, na extremidade leste de Ouro Preto, junto à rodovia do contorno que vai para Mariana/MG, um grande centro com várias empresas participando e permitindo, então, ali, a criação de um imenso Parque Tecnológico. Onde a Fundação Gorceix tem hoje a sua sede, ela deve criar uma escola técnica, mas nós já temos a Escola Técnica Federal, que hoje é o IF, Instituto Federal, mas vamos ter uma escola também da Fundação Gorceix que vai instrumentalizar sobretudo os jovens para a essas tarefas todas que estão aí, que o mundo atual há uma demanda enorme e a capacitação ainda não contempla segmentos mais densos,
HL: E com isso também atrai novas Indústrias, pode atrair um Polo Industrial também, não é? Com esse Centro Tecnológico.
AO: Para a região dos inconfidentes nós temos investido bem. O nosso hospital, por exemplo, é o primeiro hospital de Minas Gerais, a Santa Casa de Misericórdia de Ouro Preto, foi criado em 1730 e começou a funcionar em 1735. Ela hoje está considerada entre os melhores hospitais do interior de Minas Gerais.
HL: Você conseguiu zerar filas, não é? Atendimentos gratuitos…
AO: Ela tanto evoluiu muito positivamente com nossa parceria, e mais uma boa gestão que ela tem, é um hospital exemplar, e a prefeitura, nós suprimimos uma série de questões políticas que vinham perturbando o bom funcionamento da Santa Casa e estamos transformando Ouro Preto também num centro de serviços médicos de referência. Na nossa policlínica temos um hospital dos olhos feito em parceria com o Lions Clubs International. O Lions nos mandou quase um R$ 1,2 milhão em dólares para a implantação deste hospital dos olhos em Ouro Preto.
HL: E aí o atendimento é gratuito, e a pessoa não precisa vir a Belo Horizonte para poder fazer esse atendimento, né?
AO: Hoje estamos até no entendimento com a Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, junto com a Santa Casa de Misericórdia de Ouro Preto, com a Prefeitura de Belo Horizonte, com o SUS, para que nós possamos ter agora um Centro Oncológico pelo SUS em Ouro Preto. Isso é um avanço muito grande, o Ministério da Saúde está nos ajudando, porque muita coisa ainda é feita no eixo rodoviário e é importante a descentralização, temos que descentralizar sempre mais.
HL: Então, assim, se esse atendimento puder ser feito na própria cidade, né, isso descentraliza.
AO: Exatamente. E o nosso hospital está cada dia melhor, então eu tenho muita expectativa de que em breve nós possamos ter não só o atendimento oncológico, mas outros também, outras especialidades também funcionando bem. Na Santa Casa temos um quadro de profissionais de alto gabarito, né, e a Universidade…
HL: Que fomenta isso né, ela ajuda.
AO: Conseguimos, e eu era prefeito, participei da criação em 2006 da Escola de Medicina da UFOP, pelo Presidente Lula. Imagine que Ouro Preto foi a primeira cidade a ter uma Escola de Medicina no Brasil, em 1801. O príncipe regente Dom João, futuro Dom João VI, em Lisboa, 1801, ele faz um decreto criando uma aula de medicina no Rio de Janeiro e uma aula de medicina em Vila Rica, de Ouro Preto. Para o Rio de Janeiro ele mandou um médico que nunca veio, e em Ouro Preto ele nomeou Antônio José Vieira de Carvalho, que era um médico português que atuava já na Santa Casa e no Hospital Militar de Ouro Preto. Então ele instalou a aula de medicina, como se dizia, e foi a Primeira Escola de Medicina do Brasil. Em 1808, Dom João VI criou a Escola de Medicina da Bahia, mas ele já tinha criado e funcionava a de Vila Rica de Ouro Preto. Então nós levamos isso ao Presidente Lula e ele autorizou a criação da Escola de Medicina da Universidade Federal de Ouro Preto, que hoje é uma referência. Então tudo isso é recente, foi 2006, 2007 começou a funcionar de modo que nós esperamos que agora as universidades que sofreram muito nos últimos anos, elas voltem a ter uma expansão positiva e possam ser prestigiadas pelo Governo Federal, como se espera num país civilizado, num país em que a Universidade tem que ocupar um lugar importante sem se deixar…
HL: É o protagonismo dela!
AO: Sem se esquecer que para chegar a Universidade tem que ter a Escola Primária. Nós inclusive transformamos as creches em escolas. A creche agora é escola.
HL: Ela já é uma escola? A criança já fica lá com um entendimento de uma escola?
AO: Não é uma questão de assistência social, é uma questão de educação. Não é um depósito de criança enquanto os pais estão trabalhando. As crianças estão numa escola, então nós estamos trabalhando nessa linha.
HL: Porque é o que vai formar o cidadão, né, até chegar à universidade e ele ter condições de concorrer com o menino rico no mesmo nível, no mesmo patamar, não é?
AO: Exatamente.
HL: Ângelo, a gente já está terminando, acredita? (risos) Um papo tão bom, tanta coisa ainda pra falar, né? Para terminar assim, você tem um olhar muito diverso, olha para diversidade também, comunidade LGBTQIA+, em Ouro Preto ela tem um centro de referência, não é? Isso é olhar a população e o eleitor como um todo, não é? Toda a sua extensão.
AO: Nós temos que contemplar a população como um todo, não podemos ficar restrito a determinados segmentos, determinados grupos ou bairros. Ouro Preto sempre teve muita confrontação, tinha os paulistas e os emboabas, os portugueses e os nativos, os mazombos, que eram os brancos nascidos no Brasil, os africanos, os descendentes dos africanos, os indígenas, sempre houve muito preconceito e eu acho que a nossa Era pede conceito e não preconceito. Nós trabalhamos com conceitos, então temos que atender para enfrentar os preconceitos, temos que ter bons conceitos e praticá-los de uma maneira dinâmica, com o envolvimento da comunidade. Criamos um centro LGBT para atender esse segmento da nossa comunidade e ele é um sucesso, com muita gente que participa, que vem e tem atendimento, todo tipo de atendimento necessário. Criamos também o Centro POP, para acolher a população de rua. Eu estou no 4º mandato de Prefeito e nesse foi o primeiro mandato em que eu encontrei moradores em situação de rua, em Ouro Preto não havia isso. Hoje esse é um fenômeno universal, mundial, então nós não podemos dizer “ah, tem população de rua e…”
HL: Não dá para fechar o olho, né?
AO: Não dá para fechar o olho. Criamos um Centro de Acolhimento, as pessoas podem chegar lá, têm direito a um banho, a uma alimentação, a uma vestimenta, a uma escuta, o que é muito importante, com psicólogos, com todos os profissionais que podem dar uma acolhida generosa, humana e consequente, tanto que muitos já conseguiram se encaminhar ou retornar às suas casas. Nós identificamos 180, desses, 40 já foram encaminhados, então algumas pessoas têm a sua opção preferencial pela rua, cada um tem esse direito que é até reconhecido por lei, mas quando se faz um trabalho como esse vem o resultado. O CRAS, eu sempre valorizei muito o CRAS, Centro de Referência de Assistência Social, e nós temos agora um CRAS volante, que é uma van toda equipada que leva os nossos profissionais para as localidades. Os nossos distritos são imensos, com muitas localidades. O distrito de Santa Rita de Ouro Preto tem 28 localidades no seu interior, então pelo CRAS volante nós podemos ir, estamos descentralizando também na saúde, Farmácia volante, serviço da saúde que vão em vans adaptados, dentista, e com isso nós ampliamos e facilitamos mais a vida das populações, evitando deslocamento. Se o serviço da prefeitura vai ao cidadão já é uma vantagem muito grande.
HL: Ele não precisa ficar se envolvendo aí em deslocamento, gastando, né? Ele tem o atendimento.
AO: E ele se sente acolhido, atendido. Muitos serviços dessa natureza, hoje, estão sendo feitos na área de Desenvolvimento Social, que eu falo que não podemos pensar em desenvolvimento econômico sem desenvolvimento social. Se não houver atenção ao social, um possível desenvolvimento econômico é apenas um inchaço, não é um desenvolvimento é um crescimento, mas inflado, não tem consequência, é mais um milagre brasileiro que não resulta no crescimento social. Então nós investimos muito na perspectiva social e com isso temos conseguido muita coisa. Hoje, um prefeito tem que trabalhar muito articuladamente com todos os segmentos sociais, também com os parlamentares, para que nós possamos captar emendas que são decisivas.
HL: Para fazer os projetos tem que ter dinheiro, né?
AO: Eu criei com os nossos vereadores, nós criamos as emendas impositivas municipais, nós temos emendas agora dos vereadores e a maioria destinou para a saúde, foi muito positivo.
HL: É participativo, o orçamento.
AO: Isso mostra que há uma participação grande, temos a Federação das Associações de Moradores, que é muito atuante também. Cada associação traz uma contribuição importante, num município grande como o nosso tem que haver esse diálogo e o entrosamento com as associações.
HL: E essa arrecadação, né, você falou que são 600 milhões, a arrecadação anual. Quer dizer, é uma boa arrecadação que sendo utilizada da maneira correta, nos lugares em que são necessários, a população toda se beneficia disso, né? Não só nichos, então é muito importante isso.
AO: Nós temos o programa habitacional, estamos construindo em Cachoeira do Campo/MG um conjunto importante de casas para aqueles que estão escritos num cadastro, temos outros programas também que vão atendendo a questão da moradia, que é um desafio muito grande. É uma ideia que Ouro Preto funcionasse um pouco como Brasília/DF. A cidade de Ouro Preto, monumento mundial, tombada desde 1933 pelo Presidente Getúlio Vargas, desde 1931 pelo Prefeito João Veloso, depois pelo IPHAN em 1938, e pela UNESCO em 1980, essa cidade, comprimida por duas serras colossais, a Serra do Itacolomi e a Serra de Ouro Preto, ela é o plano piloto, como em Brasília, o plano piloto de Lúcio Costa, com o eixo monumental e o eixo rodoviário, e as cidades satélites são os nossos distritos. Hoje muita gente prefere morar em Cachoeira do Campo, primeiro porque Cachoeira tem um clima excelente, e depois você tem mais facilidade de ter um terreno maior ou de poder construir como você quer.
HL: É, não está tão caro ainda, não é?
AO: Até que já está ficando um pouco, porque é uma demanda tão grande, há muitos condomínios, há muitos investimentos em programas de urbanização, porque Cachoeira atrai muito pela sua localização e pelo clima. O clima de Cachoeira sempre foi considerado um dos melhores do Brasil, e isso atrai muitas pessoas. Você está há 18 quilômetros do centro de Ouro Preto.