A eleição do Vinha Celta Bical 2022, da vinícola Domínio do Açor, como o melhor vinho branco de Portugal pela revista "Falstaff", com 97 pontos, é resultado do trabalho de dez amigos - nove de Minas Gerais e um de Brasília.
Otacílio Soares, um dos sócios da companhia instalada na região do Dão, em Portugal, fala sobre o sucesso da parceria.
Há quantos anos a vinícola Domínio do Açor, no Dão, em Portugal, está no controle dos 10 empresários brasileiros e qual é a avaliação que fazem dessa parceria até o momento?
Tudo começou quando Jayme Nicolatto e André Salazar convidaram-me para concretizarmos o sonho de produzirmos vinhos de qualidade, em linha com nosso gosto, assim, resolvemos convidar amigos de Belo Horizonte, também apreciadores de bons vinhos e membros de uma associação que fazemos parte, YPO, bem como contratamos o premiadíssimo sommelier brasileiro, Guilherme Corrêa, primo do Jayme e nosso amigo da época de adolescência em BH, reconhecido também na Europa como profundo conhecedor de vinhos, para nos dar o suporte na escolha da propriedade. Quando mudei-me para Portugal, em 2019, visitei mais de 20 vinícolas para avaliar as possibilidades, sendo que antes, o foco seria na Toscana, Itália, mas as avaliações preliminares não foram as adequadas para nós. Identificamos a propriedade que adquirimos no Dão, região de solos graníticos, nos moldes da Borgonha. Negociamos por quase um ano com a proprietária e adquirimos a área, onde já se fazem vinhos há séculos. A propriedade tem características únicas: Uma ruína do século XIV, era um antigo Paço (hotel), um caminho e uma fonte de água, feitos pelos romanos no século I e o mais interessante são ruinas celtas em uma floresta de carvalhos, onde essa comunidade fazia seus rituais religiosos. Demos o nome de Domínio do Açor, como forma de fazer uma alusão aos vinhos da Borgonha, cujas características podem ser percebidas nos bons vinhos da região portuguesa do Dão. Somos 10 amigos, 9 de Minas e 1 de Brasília. Desde 2020, temos nos empenhado numa política de tornar a propriedade exemplarmente bem sucedida na produção de vinhos de alta qualidade. É uma parceria de sucesso, pois combinamos visão estratégica com as competências dos profissionais contratados, entre os quais se contam o enólogo revelação Luís Lopes e o enólogo João Costa, que coordenam nossa equipe de profissionais. A união de vontades entre os sócios permite que a vinícola tenha um reconhecimento internacional em pouco tempo. Esta situação mostra claramente que o investimento foi bem feito, tanto na escolha do local, equipamentos de última geração e a distribuição de vendas nos locais adequados. Os azeites que produzimos também têm grande aceitação, não temos estoques.
Dada a composição dos sócios - 9 empresários de Belo Horizonte (MG) e um de Brasília (DF) -, isso mostra que o empresário mineiro também sabe investir e fazer vinhos vencedores e diferenciados no mercado internacional?
A composição do grupo acionista reflete sem dúvida a habilidade dos empresários brasileiros em encontrar oportunidades estratégicas com êxito, especialmente a dos mineiros porque esses são verdadeiros especialistas em negociações. No Brasil, inclusive em Minas Gerais, se consegue produzir bons vinhos, mas nossa decisão foi de produzirmos numa área reconhecida como produtora de qualidade, mas menos conhecida em nível internacional e com potencial de crescimento em qualidade e quantidade. A escolha do Dão demonstrou visão de negócio e profundidade no entendimento das tendências do setor em nível mundial. Conseguirmos rivalizar com marcas consagradas da França e Alemanha, nomes internacionais consagrados, o que atesta que o empresário mineiro pode aplicar a sua experiência local em um contexto global, produzindo produtos vencedores e diferenciados.
Qual é o portfólio atual da vinícola Domínio do Açor e qual é a expectativa de diversificar essa gama de produtos e castas?
Atualmente, o portfólio da Domínio do Açor inclui vinhos de primeira qualidade que honram a tradição vinícola regional, até agora. Temos 7 rótulos, mas teremos lançamentos ainda no primeiro semestre deste ano. Um bom exemplo disso é o "Vinha Celta Bical 2022" que em curto espaço de tempo foi classificado como dos brancos de melhor qualidade europeia. Fazemos apenas vinhos com uvas autoctónes do Dão. Temos uma área em que enxertamos as parreiras com castas antigas da região, que são pouco conhecidas, e faremos vinhos com essas uvas que ficaram “esquecidas”, assim, poderemos ampliar a gama e satisfazer segmentos premium de mercado. Em breve apresentaremos essas garrafas em quantidades limitadas, continuando a manter a qualidade e produto diferenciado da média.
Os resultados de 2024 referendaram a Domínio do Açor diante de premiações de renome mundial como na Alemanha, onde o "Vinha Celta Bical 2022" foi eleito o melhor vinho branco de Portugal na revista "Falstaff", com 97 pontos. Esses reconhecimentos têm surpreendido os sócios diante do tempo de existência do projeto no mercado?
A eleição do "Vinha Celta Bical 2022" como o melhor vinho branco de Portugal pela conceituada revista "Falstaff", com 97 pontos, representou um marco que mitigou parcialmente a pressão acumulada para a confirmação pelos especialistas e pelo público da qualidade de nossa vinícola. Ocupar a liderança no Top 10 da Revista Gula com um dos nossos rótulos é uma evidência clara de que a vinícola está se consolidando como referência no segmento. A avaliação de especialistas como Gerson Lopes, que tem vasta credibilidade no setor, é um indicativo de que os vinhos da Domínio do Açor não apenas competem, mas também superam marcas tradicionais da França e da Alemanha em algumas categorias. Esse reconhecimento reafirma o compromisso da vinícola com a excelência e posiciona nossos produtos como símbolos de qualidade e inovação no mercado internacional. Embora soubéssemos que iríamos competir ao mais alto nível, a rapidez com que começaram a aparecer os prémios superou nossas expectativas. Isto prova que a dedicação à qualidade, a contratação de especialistas e equipamentos e barricas diferenciadas de alta qualidade foram decisões corretas. Os resultados até agora obtidos aumentam também a confiança no futuro do projeto. Importante que alcançamos esse patamar com a simplicidade e humildade mineiras, sempre procurando aprender com as experiências de produtores consagrados.
A propriedade é única, com solos especiais, mas a produção é limitada, quantas rodadas de investimentos ainda pretendem fazer e quais mercados ainda planejam atingir?
Nós, os sócios, temos grande preocupação em desenvolvermos nosso sonho, de forma a também gerar resultados econômicos e financeiros, mas a regra é aumentar a capacidade de produção sem comprometer a qualidade, em linha com a demanda do mercado. Não temos estoques grandes, pelo contrário, nossa produção de brancos está toda vendida e pouquíssimo estoque de tintos, suficientes apenas para vendermos no decorrer do ano. Os Estados Unidos, Japão, UK, países do Norte da Europa, Holanda e Suíça continuam a ser prioridades . A presença em Portugal é através de nossa distribuidora: Temple Wines, que importa vinhos de alta qualidade da França, Itália etc, para os melhores restaurantes do país e as mesas mais qualificadas, bem como distribui rótulos de produtores portugueses de alta gama, para as melhores adegas, restaurantes e connoisseurs, seja por internet ou pela nossa equipe de vendedores com conhecimento de vinhos e dos mercados.
No Brasil, a distribuição já atinge quantos pontos de venda?
No Brasil, a venda é feita com exclusividade pela Distribuidora Clarets, destinando-se principalmente ao público de pessoas físicas de apreciadores de vinhos de alta qualidade e restaurantes gastronômicos. Existe toda uma estratégia dirigida aos locais onde o vinho é apreciado pelo segmento premium focando nosso público-alvo.
Qual é o principal mercado dos vinhos da Domínio do Açor?
Basicamente os principais mercados são atualmente Portugal, Brasil, Japão, Suíça, Holanda, Reino Unido, Estados Unidos e Alemanha. Em cada mercado são usadas estratégias especiais, com distribuidores locais, focados nos consumidores de vinhos premium.
Na Domínio do Açor os vinhedos têm cultivo de acordo com os princípios da agricultura regenerativa, já em processo para certificação orgânica Ecocert em 2026. Esse tipo de certificação confere qual valor agregado ao produto e acesso a qual tipo de público?
A certificação orgânica Ecocert tem um tremendo valor acrescentado, especialmente em segmentos premium onde os consumidores procuram modos de vida sustentáveis e produtos ecológicos. Esta certificação viabiliza o acesso a mercados que hoje são mais exigentes do ponto de vista ambiental (Comunidade Europeia, Estados Unidos, Japão) e atrai consumidores conscientes que optam por bons produtos com um menor impacto ambiental.
Quais outras certificações a vinícola planeja conquistar nos próximos anos para fortalecer ainda mais a sua chancela?
Além do Ecocert, teremos a certificação relacionada à sustentabilidade, a Biodynamic (Demeter) e programas de pegada de carbono reduzida, que são muito valorizados em mercados internacionais.
Qual foi o volume de garrafas comercializado em 2024 e a média anual de produção e qual é a ideia dos sócios: escalar o negócio com a produção industrial baseada em volume ou desenvolver cada vez mais exemplares direcionados ao segmento premium?
A nossa produção anual é no patamar de 50 mil a 60 mil garrafas , a comercialização não é feita toda no mesmo ano, pois os nossos vinhos ficam, no mínimo, 1 ano entre cubas, barricas e garrafas. Apenas vão ao mercado, quando nossa equipe - Guilherme Corrêa e os enólogos Luís Lopes e João Costa - confirmam que estão prontos para iniciar a comercialização. Neste ano de 2025, iremos lançar o nosso vinho tinto: Vinhas Velhas, que é da safra de 2021, ou seja, cerca de 4 anos para ficar pronto e já tem reservas firmes para compra de toda produção. Adotamos um modelo de produção limitado e manual em vez de um tamanho industrial, isso permite aos nossos clientes apreciar os vinhos de qualidade e manter a fidelidade. Em 2024, compramos novas instalações industriais, ao lado de nosso parreiral, em que o proprietário anterior produzia mais de 1,6 milhão de garrafas por ano, mas nosso foco continuará em termos qualidade, não produção massificada, que é um outro mercado que preferimos não tratar. Nosso vinho é feito com uvas de nossa propriedade, com o controle rigoroso e o tratamento feito nos mais rigorosos patamares técnicos. Nossa equipe teve treinamento sobre solos, com o maior especialista do setor: Pedro Parra. E trabalhamos com um dos maiores especialistas de poda do mundo: Marco Simonit, assim, conseguimos gerar diferencial de qualidade. Importante ressaltar que trabalhamos de forma a compartilharmos com nossos vizinhos as melhores práticas e experiência fomentando a qualidade dos vinhos de nossa região e do país, bem como agradecermos a boa acolhida que temos em Portugal.