Reynaldo Passanezi, presidente da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), é o primeiro entrevistado da temporada Minas S/A Governança em todas as plataformas de O TEMPO até agosto.
A Cemig está fazendo 73 anos num momento de investimentos bilionários.
"A gente está fazendo o maior programa de investimentos da história da Cemig. São R$ 59 bilhões em dez anos (2019 a 2029) o que dá algo em R$ 6 bilhões por ano. A Cemig voltou a ser indutora do desenvolvimento de Minas", avalia Passanezi.
O executivo conta que quando assumiu a estatal mineira de capital misto em 2020 ela estava numa situação muito próxima de entrar em default (moratória).
"Quando eu cheguei na Cemig me surpreendeu o grau de deterioração da empresa. A Cemig gastava muito mais do que suas despesas autorizadas que é aquilo que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) define como empresa de eficiência e que coloca na tarifa do consumidor", disse.
Atualmente, a concessionária vivencia resultados financeiros recordes: o ebitda alcançou R$ 11,25 bilhões em 2024, o maior da história, o lucro Líquido de 2024 foi de R$ 7,117 bilhões e a valorização das ações entre 2019 e 2024 foi expressiva: CEMG3 valorizou 412,49% e CEMG4 529,62%.
O Valor de Mercado da companhia atingiu R$ 35,1 bilhões em dezembro de 2024.
A Cemig hoje vale três vezes mais do que valia em 2018.
No setor agropecuário, foi criada a Cemig Agro, um atendimento dedicado e exclusivo para a área rural, com bases, eletricistas, veículos e equipamentos específicos.
Passanezi fala também sobre a intenção do governo em transformar a Cemig numa corporação e a questão da tarifa e sua tributação que em Minas Gerais tem uma incidência de 30% para pagamento de ICMS pelo consumidor.
"Mais de 55% do que arrecadamos é imposto ou subsídios, encargos. Temos um papel de arrecadador muito grande. A gente também entende que pode diluir e não só o setor de distribuição pagar, mas a transmissão e a geração também; fazendo um modelo que isso seja diluído entre os vários segmentos. Quando a gente olha a evolução dos vários componentes da tarifa, e o componente que subiu abaixo da inflação foi a distribuição. O que mais cresceu foi a Conta de Encargos e Subsídios que cresceu muito mais que a inflação", explica.
A seguir, a entrevista na íntegra de Reynaldo Passanezi::
A Cemig, que está fazendo 73 anos, gente, é o nosso patrimônio, não é, Reynaldo?
Acho que a Cemig realmente está fazendo 73 anos em um momento muito positivo, talvez, eu diria, um dos melhores momentos da história da companhia. A gente está fazendo o maior programa de investimentos da história da Cemig, são R$ 59 bilhões em 10 anos, o que dá algo como R$ 6 bilhões por ano. Eu me lembro, Helenice, que quando eu assumi, lá em 2018, a Cemig investiu R$ 950 milhões.
HL: Ou seja, menos de R$ 1 bilhão.
RP: Menos de R$ 1 bilhão. No ano passado já foram R$ 5,5 bilhões, e este ano vai ser mais de R$ 6 bilhões. Acho que essa é a transformação do ponto de vista da gente poder, com orgulho, dizer que, aos 73 anos, a Cemig voltou a ser indutora do desenvolvimento de Minas.
HL: Reynaldo, você está falando aí desse mega investimento, e quando você assumiu a gente pode dizer que tinha uma situação pré-falimentar da Cemig? Um pré-estado de default, aí já é mais radical, né, da insolvência financeira. Chegou a esse ponto, quando você olhou as contas todas e falou “opa peraí, como é que vai ser agora?”
RP: Olha, Helenice, eu acho que estava numa situação muito próxima de entrar em default mesmo.
HL: Sério isso?
RP: Sério. A gente emitiu dívida a dólar mais 9, a relação… é um número aí muito financeiro, a relação dívida líquida ebitda estava acima de 5, então, assim, muito alavancado, situações extremamente delicadas. Eu, realmente, quando cheguei na Cemig, me surpreendeu o grau de deterioração da empresa, e a primeira coisa que a gente quis fazer foi colocar a casa em ordem. Então, o que a gente buscou fazer? Acho que a primeira coisa que a gente olha é como está o dia a dia da empresa, os gastos operacionais, a capacidade de geração de caixa da empresa para fazer investimento. Esse foi o primeiro número que me surpreendeu. A Cemig gastava muito mais do que as suas despesas autorizadas, que é aquilo que a Aneel define como empresa de eficiência e que coloca na tarifa do consumidor. Então, a Cemig estava com despesas acima das despesas regulatórias e com perdas técnicas e comerciais também acima das regulatórias, a gente estava mais de um R$ 1 bilhão acima das despesas. Hoje, nós estamos abaixo. Então, aqui tem um esforço muito grande de gerar eficiência, de colocar a empresa em padrões que são os padrões de mercado, que é o padrão que a Aneel autoriza na tarifa que vai ao consumidor. Então, aqui eu acho que tem um esforço muito grande, que é a Cemig saiu de estar fora das despesas regulatórias e fora das perdas regulatórias para estar dentro das perdas regulatórias. A segunda coisa que também me surpreendeu…, então, esse foi o nosso primeiro esforço, de trazer eficiência para a empresa, de a empresa gastar de acordo com o que ela recebe na tarifa
HL: Reduzir essa relação dívida líquida versus ebitda para 1,3% mais ou menos, hoje, né?
RP: Esse primeiro momento é pôr a empresa nos parâmetros de eficiência, posso até te dar depois muitos exemplos aí de coisas que a gente fez para colocar a empresa dentro desses parâmetros. A segunda coisa é que o caixa que a gente gerava não estava indo para investimento em Minas, estava indo para investimento fora de Minas.
HL: Light, Renova, Santo Antônio…
RP: Isso. Então, a gente investiu nessas empresas, ao longo dos anos, a valores de hoje, praticamente R$ 40 bilhões. É muito dinheiro, é muita coisa, e aí o que nós fizemos? Nós revimos a estratégia da empresa para dizer “o que a empresa sabe fazer?” E foi daí que saiu o nosso slogan, que se chama "Focar em Minas e Vencer". Ou seja, a Cemig, ao longo dos seus 73 anos, tem uma tradição técnica que é muito boa para construir e operar geração, usinas, transmissão e distribuição em Minas. Essa é a história da Cemig, isso é o que a Cemig sabe fazer.
HL: É o core business dela.
RP: É o core business, é onde a gente tem vantagens comparativas. Mas a CEMIG tinha entrado para ser acionista minoritária, às vezes com pessoas físicas ou com outras empresas, com fundos em Santo Antônio, em Rondônia, na Renova, na Bahia, na Light, no Rio, em Belo Monte, no Pará, um monte de investimento onde a gente era minoritário e não conseguia… toda vez que tinha alguma necessidade, a gente tinha que acompanhar e colocar mais capital nessas empresas. Então, o que nós fizemos? Nós saímos de todos esses investimentos.
HL: Fez um desinvestimento.
RP: Um desinvestimento. Então, desinvestimos na Light, desinvestimos de Santo Antônio, desinvestimos de Renova, recentemente desinvestimos de Aliança, e por quê? Porque a gente quer focar naquilo que nós sabemos, que é o nosso negócio, onde a gente tem controle, aqui em Minas.
HL: Um Estado desse tamanho, com 853 municípios, dá para fazer um monte de coisa e vai ficar fazendo lá fora?
RP: Para mim, primeiro é colocar a empresa nos parâmetros de eficiência. Segundo deixar de investir fora de Minas em participações que estavam destruindo valor, porque, o que que acontecia? Deixava de investir em Minas. Por isso que a gente investiu menos de R$ 1 bilhão em 2018. E por quê? Porque eu tinha que ficar colocando capital nessas empresas, Light, Renova, Santo Antônio e Belo Monte, aí não sobrava dinheiro para eu poder investir em Minas, e porque ainda tinha despesas operacionais muito elevadas. Então, foi isso que a gente fez, a gente colocou a empresa dentro dos parâmetros de eficiência, a gente desinvestiu quase R$ 14 bilhões, e aí esse desinvestimento é bom, porque, primeiro, eu tive retorno financeiro, já que eu fiz a venda, segundo, porque eu deixei de colocar capital. E tem que lembrar que parte dessas empresas acabaram entrando em recuperação judicial.
HL: Quer dizer, a Cemig conseguiu sair antes.
RP: A gente conseguiu sair antes, e recuperação judicial quando tem uma sociedade de economia mista como acionista é muito difícil.
HL: Ninguém recebe, fica anos…
RP: E na verdade, eu digo assim, os bancos vão querer receber da gente, entendeu? Então, fica muito mais difícil, vem tudo em cima da sociedade de economia mista, significa que nós teremos que fazer aportes bilionários nessas empresas para sair da recuperação judicial.
HL: Ou seja, já sangrando dentro do Estado e ainda ia ter que cobrir buraco.
RP: Santo Antônio é outro exemplo. Santo Antônio, quando nós saímos, alguns meses depois a Eletrobras fez um aporte de mais de R$ 10 bilhões. Nós teríamos que fazer um aporte proporcional, teríamos que ter colocado ali mais R$ 1 bilhão. Então, são todos números muito grandes, e tinha uma outra coisa também, isso acabava consumindo o nosso tempo, porque o nosso tempo era só para ver essas situações.
HL: Tapar buraco.
RP: Tapar buraco de outras sociedades que não eram nossas. Então, acho que aqui está um pouco da estratégia de colocar a empresa dentro dos parâmetros de eficiência, desinvestir de ativos não estratégicos, focar em Minas e vencer, e ter o orgulho de dizer: hoje a Cemig volta a ser indutora do desenvolvimento de Minas e a Cemig quer melhorar a qualidade de vida do mineiro e da mineira. Então, saímos de fato dessa situação em que a gente emitiu dívida a dólar mais 9.
HL: Pois é, 40% da dívida era em dólar, né, gente, esse dólar que foi aí aos píncaros recentemente.
RP: A gente foi obrigado a fazer isso, a gente emitiu dívida a dólar mais 9 sem proteção cambial definitiva, ou seja, com um hedge (proteção) limitado a R$ 5. Agora você imagina o tamanho do risco que isso significa para a companhia. Então, hoje a gente emite abaixo do soberano.
HL: Está com nota de crédito de bom pagador.
RP: A gente é triple A, é a melhor classificação de risco de crédito. A gente subiu seis ou sete notas, aí depende da agência de classificação de risco, então, assim, você imagina o que é sair de B ou B+ para triple A. A gente, efetivamente hoje, consegue emitir abaixo do soberano (oferta de títulos que oferecem um potencial de retorno mais alto para os investidores), o que é espetacular, e a gente investe 100% em Minas. Eu gosto muito de uma frase do presidente do Conselho de Administração onde ele diz o seguinte: “o bom da estratégia é dizer não”. Então, é isso, a gente hoje não tem tentação, nosso investimento é em Minas, o foco é tudo. Todo o nosso investimento, hoje, é em Minas, e aí temos todos esses programas, que é construir mais subestações…
HL: São 200 novas subestações nessa área de transmissão, que eu acho que é o grande problema mesmo atualmente em Minas, não é, Reynaldo? Essa questão da transmissão, da luz não cair, não ficar caindo sem parar.
RP: Vou voltar em 2018, quando a gente fala assim: “investiu R$ 950 milhões”, a gente investiu menos do que a depreciação do ativo. Então, significava o quê? Que os ativos estavam se deteriorando, porque eu estava investindo menos do que a depreciação. Hoje, a gente investe mais de 4 vezes a depreciação. Então, quais são esses nossos programas? Um programa chama-se Mais Energia, que é construir mais subestações. Quando nós assumimos eram 414 subestações, e hoje nós estamos construindo mais 200, ou seja, eu estou crescendo 50%. Então, assim, em 7 anos nós vamos construir 50% do que nós demoramos 73 anos para fazer.
HL: Está mais ou menos como o JK, 50 anos em 5. (risos)
RP: O nosso é 70 anos em 7. E das 200 novas subestações nós já entregamos 135, e é um pouco como você comentou, já estão contratadas as 200.
HL: Está garantido aquele dinheiro para ela?
RP: Está garantido o dinheiro e está garantido o contrato. Nós, como uma Sociedade de Economia Mista, até demoramos muito para contratar, tem que fazer licitação. Está tudo já contratado, esses investimentos já estão todos contratados. Esse é o Mais Energia. O outro é o Minas Trifásico, que também é um olhar para o agronegócio.
HL: A nossa rede era predominantemente monofásica?
RP: Era predominantemente.
HL: Por isso vivia caindo a energia na roça, não é?
RP: É, e aqui, veja também, o agronegócio, o rural, como ele exige muita rede, é muito extenso, eu acho que a gente não estava dando a atenção necessária. Então, hoje a gente tem muito orgulho de dizer… esse é o programa, é construir 30 mil quilômetros de rede trifásica. A trifásica é o que deixa você ter o agronegócio, rede monofásica te deixa ter aquele chuveiro elétrico na tua propriedade rural, mas não deixa você ter uma ordenhadeira, não deixa você ter um resfriador, não deixa você ter irrigação, não deixa você ter uma secadora, está certo? Então, você precisa do trifásico se você quer ter agronegócio. Nós estamos construindo 30 mil quilômetros, o perímetro da terra são 40 mil quilômetros, é isso que nós estamos construindo, praticamente dá para dar quase uma volta na Terra de rede trifásica.
HL: Essa é a Cemig Agro, que foi criada?
RP: Essa chama-se Minas Trifásico. A conta aqui, de novo, você perguntou do monofásico e do trifásico, no passado a gente tinha praticamente todo crescimento como sendo monofásico, hoje a gente tem 75% do crescimento na área rural sendo trifásico. 25% ainda é monofásico, claro que são alguns ramais da rede monofásica que crescem, mas o grosso, sem dúvida nenhuma, é o trifásico. Então, isso aqui é para o agronegócio, de fato, para a gente poder estimular o agronegócio.
HL: E ter ambiente de negócio também para outras empresas virem para cá, e falarem assim: “lá tem rede integrada e não vai ficar caindo a energia, a gente não vai ter prejuízo”.
RP: Junto com a subestação. Então, ao lado do desenvolvimento a gente tinha, de fato, números gigantescos de demanda reprimida, de gente que não era atendida. Eu me lembro disso, quase 50% da carga da Cemig, em 2018, estava reprimida, não era atendida, já tinha pedidos de conexão não atendidos. Hoje, praticamente, a gente não tem. Vou dar aqui um exemplo de subestação, eu acho que aqui é até um bom exemplo. Outro dia eu estive em Pouso Alegre e nós tínhamos duas subestações nossas.
HL: Para aquela demanda enorme lá, cheio de fábricas…
RP: Já construímos mais 3, ou seja, aumentou de 2 para 5 na região. Aí cresce a Cimed, aí vem a Midea, aí você permite o desenvolvimento, no global, do agro, da indústria e do comércio. O Minas Trifásico, óbvio, é mais para o agro, e a gente criou um que é o Cemig Agro, que aí não é investimento, mas é gastar mesmo na operação, melhorar a qualidade do atendimento.
HL: É um braço dentro da Cemig só para atender o setor agropecuário.
RP: Então, o agro, nós criamos 76 novas bases, nós temos mais 76 cidades em Minas que, hoje, têm uma base para atender o agronegócio.
HL: Isso quer dizer o quê?
RP: Tem os eletricistas, têm os veículos, quer dizer, tem proximidade. Então, uma das grandes dificuldades é que qualquer intercorrência que exista, antes você tinha que sair… a sua base estava, sei lá, em Montes Claros, seriam quantas horas até o local de atendimento? Hoje não, hoje nós espalhamos mais 76 novas bases e aí a tua capacidade, tua resposta de atendimento é muito mais rápida, e estamos fazendo isso com funcionários próprios.
HL: Não é terceirizado?
RP: Não é terceirizado. Os eletricistas são próprios e os veículos são próprios.
HL: Você fez um rearranjo dentro do corpo de funcionários da Cemig?
RP: Contratamos. Aqui é aumento mesmo do número de funcionários, mas tudo isso é efetivamente agilizar a qualidade do atendimento, melhorar a resposta. Também temos um número que é dos últimos 12 meses, que nós melhoramos em 3 horas o atendimento médio do rural, é muita coisa. Então, realmente eu acho que são números que me deixaram muito feliz.
HL: É turnaround mesmo, né? Você adora essa palavra. (risos)
RP: Eu adoro essa palavra, porque eu acho que foi um turnaround mesmo, foi sair de uma situação de falta de visão estratégica e de deterioração, porque, assim, a gente via o ativo se deteriorando, para uma situação, hoje, de um super plano de investimento e de uma empresa sadia financeiramente, que não carrega riscos, porque antes a gente carregava riscos. Santo Antônio era um risco, a Renova era um risco, a Light era um risco, empresa em recuperação judicial é um risco imenso. Nós saímos de todos esses riscos, nós colocamos a empresa em ordem, do ponto de vista da saúde, da eficiência e da saúde financeira, e hoje a gente investe naquilo que nós conhecemos. Então, eu também acho que é muito positivo isso, ou seja, eu vou fazer aquilo que eu sei, e eu digo mais, eu gosto também de dizer assim “a gente vai investir em setores que só nós podemos investir”. A gente, até como uma sociedade de economia mista, nós vamos investir em rede. É a rede de distribuição, é a rede de transmissão, porque só eu posso fazer isso, e aí o setor privado pode crescer na área de geração de energia, como tem crescido, a gente tem visto aí, é geração distribuída, o quanto que Minas hoje é importante, e a gente quer ter a rede para poder atrair investimento.
HL: Mas tudo precisa passar pela Cemig, não é? Porque ela tem a rede de distribuição todinha, é com ela.
RP: E posso te dizer, tivemos um mega evento que é uma feira do setor de distribuição de energia elétrica, foi aqui no Expominas, o Sendi, que é o maior evento do setor de distribuição da América Latina, e foi um sucesso. Tivemos aí alguns especialistas internacionais e um deles também deixou muito claro, assim, os segredos, hoje, para a transição energética, além, obviamente, de geração renovável, solar, eólica, é rede e bateria, grid e storage. Então, é o que eu acho que nós estamos fazendo. Hoje, a gente quer ser um grande provedor de infraestrutura e esse provedor de infraestrutura que vai dar a possibilidade, a chance da gente efetivamente, cada vez mais, atrair investimento e geração de emprego e renda aqui para Minas
HL: Reynaldo, o investimento está na energia limpa? Para você atrair grandes players que queiram fazer investimentos aqui, em conjunto com a Cemig, é por esse lado que vai ser? Você deu até um exemplo de uma cidade aqui de Minas que vai ter uma bateria com a rede, não é?
RP: Hoje, o que acontece aqui, a maior parte do investimento, no Brasil e no mundo, é um investimento em energia renovável intermitente, solar e eólica. Ou seja, uma parte do dia você gera uma outra parte do dia não tem, seja eólica, seja solar, e isso gera muita complexidade para a operação do sistema.
HL: Uma hidrelétrica está lá funcionando 24 horas, né?
RP: Uma hidrelétrica que tem reservatório, é o que a gente chama de oferecer energia limpa e firme. O solar e eólico oferecem energia limpa, mas ela é intermitente, ela não é firme. Então, eu preciso garantir que a energia seja firme, e uma alternativa tecnológica para energia firme é a bateria. Então, aqui também a gente está trazendo uma inovação, que é um projeto muito legal da Cemig, a gente apresentou no Sendi, que é a Serra da Saudade. A Serra da Saudade é o menor município aqui de Minas e ele tem uma característica que é um outro grande objetivo nosso, só existe uma fonte de alimentação até a Serra da Saudade, que significa, assim, que só tem um único caminho para a eletricidade chegar ali à Serra da Saudade, ela não tem dupla alimentação, quer dizer, sai uma e eu tenho uma contingência. Aqui também, um outro grande programa nosso, nosso projeto é que todos os 777 municípios que nós atendemos tenham dupla alimentação.
HL: Para não ficar nessa dependência.
RP: Para não ficar nessa dependência e melhorar a qualidade. Então, no Minas Trifásico, um outro objetivo secundário é ter dupla alimentação para todos os municípios. Boa parte dos municípios nós já temos a dupla alimentação, mas Serra da Saudade não tinha e trazer uma rede seria extremamente custoso, então o que nós desenhamos? Nós desenhamos colocar uma planta solar e uma bateria.
HL: Caindo a energia ela entra em ação.
RP: Isso. E o que acontece? O município seguirá conectado na rede principal da Cemig, mas se houver qualquer evento nesta rede principal, nós já vamos ter uma bateria que é alimentada pela planta solar e que é capaz de atender o município por 48 horas.
HL: Em 48 horas já resolve o problema, não é? (risos)
RP: Em 48 nós vamos resolver. Isso é o que a gente chama de primeira micro rede de energia elétrica do Brasil.
HL: O investimento é muito alto para isso?
RP: Não. É um município pequeno…
HL: Mas, assim, para você replicar isso para grandes cidades?
RP: São algumas dezenas de milhões de reais, mas a gente quer replicar para municípios pequenos, que nós temos aí muitos municípios. Nós queremos replicar isso, provavelmente, para mais 20, 25 municípios, já temos, inclusive, uma autorização, um ok preliminar da agência de regulação. Este programa, esta usina com a bateria, nós devemos estar inaugurando aí em 1, 2 meses no máximo.
HL: Essa bateria vem de onde, Reynaldo?
RP: Essa bateria, na verdade, é a WEG que está nos oferecendo, é uma tecnologia brasileira muito muito positiva.
HL: Que joia isso, nacionalização do sistema todo.
RP: Mas tudo isso, eu acho que é a gente sendo inovador e trazendo essas inovações do mundo para a nossa realidade. Então, a realidade de Minas é uma realidade com muitos municípios distantes, uma logística complicada e com uma população relativamente pequena. Então, essa é uma boa forma de atender e esperamos que sim, a gente consiga avançar e trazer mais essa inovação, está certo? Porque realmente é uma inovação ter mais micro redes, que significa o seguinte: toda vez que tem uma intermitência ou que tem uma falha na rede, eu tenho uma proteção secundária que garante que aquele município fique isolado. Ele está isolado da rede e com o atendimento de energia através da bateria.
HL: Uma dúvida, Reynaldo. São R$ 59 bilhões esse investimento aí todo, vocês já conseguiram reaver R$ 14 bilhões dos desinvestimentos, e o restante como é que você está captando no mercado? É debênture, são investidores, é algum follow on na Bolsa B3 aí que pode ter pela frente, como está a situação?
RP: Sempre o principal é a nossa geração de caixa, porque hoje nós estamos dentro de todos os parâmetros de eficiência. Então hoje eu não consumo o caixa com despesas desnecessárias, o grosso é com a geração de caixa. A Cemig também tem uma política que ela só distribui 50% do lucro dos dividendos, então significa que os outros 50% ficam na companhia e são todos reinvestidos. A terceira é a emissão de dívida, com a vantagem de que hoje a gente emite muito barato, ou seja, hoje a gente consegue emitir praticamente ao nível do título soberano. Assim, aquilo que o tesouro nacional emite, a gente emite, já tivemos situação de conseguir emitir até, às vezes, um pouquinho abaixo do soberano. Então, essas são as fontes de financiamento para esse programa de investimento. Claro que a nossa dívida cresce no curto prazo, porque eu estou fazendo todo esse programa de investimento. Depois que esse programa de investimento estiver maduro, aí a gente volta aos patamares com muita segurança e muita saúde financeira para a empresa.
HL: Um assunto que a gente não pode deixar de falar, é que a gente vê o valor de mercado da Cemig, são mais de R$ 35 bilhões, é incrível, é um grande ativo, acho até que é o mais importante ativo que Minas tem. E aí vai disponibilizá-la para pagar a dívida do Estado? Como está essa equação, como essa conta vai fechar?
RP: Veja, eu acho que o que existe hoje aqui é uma proposta do Governo de Minas que está sendo discutida na Assembleia para a transformação da Cemig em uma corporação, e após a transformação da Cemig em uma corporação, a sua possível inclusão dentre os ativos que vão compor os ativos que o Governo de Minas vai entregar para o Governo Federal com o objetivo de reduzir a dívida do Governo de Minas.
HL: Dentro do Propag, né?
RP: O Governo tem no Propag uma regra que para você obter o máximo de descontos de juros, você precisa diminuir a dívida em 20%.
HL: E a dívida está em mais de R$ 170 bilhões.
RP: O Governo de Minas precisa compor esses 20%, e os principais ativos nós conhecemos: Codemge, Cemig e Copasa, então eu acho que é isso que está em discussão. Do lado da Cemig, do lado, vamos dizer, assim, da proposta, é uma proposta de transformar a Cemig em uma corporação.
HL: Uma corporação não tem direito de voto, né, está tudo diluído ali, ela não vai decidir mais…
RP: O Governo de Minas.
HL: É o Governo de Minas, né, o Governo Federal está até criticando essa questão aí.
RP: Acho que aqui tem dois temas: o primeiro tema é por que o modelo de corporação, vamos dizer, dentro da lógica do Propag? Aqui o modelo de corporação é o único que não dá direito de tag along para os acionistas minoritários. Se eu tivesse uma transferência do controle acionário da Cemig, haveria direito de tag along (direito para os acionistas minoritários, protegendo-os de perdas financeiras) para os acionistas minoritários ordinaristas da Cemig e também na Taesa, e esse desembolso de tag along é considerado, lá pelas regras do Propag, como dívida do Governo de Minas. Então, ao final, você entregaria um ativo e correria o risco da sua dívida aumentar, porque eu entrego o ativo e ainda tenho que pagar alguns bilhões de reais pelo possível tag along que tem na Cemig e nas empresas que a Cemig participa e controla, como por exemplo a Taesa. Então, o modelo de corporação não tem isso, porque o modelo de corporação, como fica um controle difuso, né, tem um acionista de referência, o Governo de Minas segue como acionista de referência, mas ele não é mais o acionista controlador, então não tem o tag along
HL: A Eletrobras fez isso, é uma corporation.
RP: A Eletrobras é corporation e, na verdade, boa parte das grandes empresas do mundo são corporações, então é normal.
HL: É um modelo viável, né.
RP: Do ponto de vista da governança, hoje o melhor modelo, o modelo mais moderno de governança que existe na bolsa brasileira é o novo mercado. Então, o modelo de corporação, no fundo, a Cemig hoje é nível 1, ela tem ordinárias e preferenciais, ela tem um terço de ordinárias e dois terços de preferenciais. O Governo de Minas tem 51% das ordinárias e 17% só do capital total, porque é 51% de um terço mais zero das preferenciais. Quando você converte, o novo mercado significa que só vai ter um tipo de ação, que é ação com direito a voto, então quando você faz a conversão, o Governo de Minas passa a deter 17%. Eventualmente, se tiver um prêmio de controle, aí vai ser 17 mais o prêmio de controle. Ele deixa de ser o acionista controlador, mas ele seguirá sendo um acionista de referência, ele seguirá sendo o principal acionista.
HL: Quer dizer, esse plano plurianual de investimentos, por exemplo, é ele que continua comandando, né?
RP: Continua, claramente continua, e aí, eventualmente, você pode discutir, esses são temas que a Assembleia Legislativa tem que discutir, aprovar, inclusive discutir no sentido de colocar regras no estatuto social, de obrigações de mínimo de investimento em Minas, de regras de direitos de classe especial, então, aqui tem um tema que gente chama de golden share…
HL: Que você tanto defende, né.
RP: Ações de classe especial que vão estabelecer regras que têm que ser cumpridas na nova governança da companhia.
HL: Você acha que isso também vai entrar, vai ser uma coisa bem estruturada para a gente não ter problema de falta de investimentos, de apagão, como tem em outros Estados?
RP: Helenice, eu acho que é um modelo que pode funcionar muito bem, esse é um modelo absolutamente padrão no mundo inteiro e que permite, vamos dizer, do lado da Cemig, ter muita agilidade empresarial, ter a capacidade de fazer algo que às vezes é muito importante para as empresas, que é por exemplo fazer uma ampliação de capital, as empresas às vezes crescem fazendo ampliação de capital. Quando você tem um acionista controlador com dificuldade financeira, é muito difícil ele permitir uma ampliação de capital, na prática você não faz. Então, você gera instrumentos adicionais, você gera uma governança, que é a governança mais moderna, que é o novo mercado, você gera mais agilidade empresarial, por não ter restrições, por exemplo, não ter todo o cumprimento de regras de Lei de Licitações das empresas estatais e você gera essas oportunidades, instrumentos adicionais que, hoje, a gente tem muito mais dificuldade de usar enquanto Sociedade de Economia Mista.
HL: Enquanto Estatal, né, com capital misto, não tem como você conseguir resolver isso tudo assim, né… já até está conseguindo de até os próximos 4 anos fazer esse investimento todo, né, Reynaldo, mas contratado. Bom, vamos ver aí como vai acontecer essa questão, mas, assim, não tem muito como fugir disso, né, tem que caminhar para essa solução, até mesmo para a solvência de Minas, de continuar pagando todos os seus compromissos.
RP: É, acho que essa aqui, agora, é uma decisão, obviamente, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais e do Poder Executivo de Minas. Qual vai ser a decisão, claramente é uma decisão deles, mas eu particularmente vejo esse modelo de corporação como um modelo positivo de governança para a Cemig, que vai dar mais liberdade de gestão para a Cemig, que vai dar novos instrumentos de gestão para a Cemig, vai dar mais agilidade e permite que o Estado siga sendo o acionista de referência e estabelecendo regras muito claras para proteger, por exemplo, o programa de investimentos.
HL: Aí, Reynaldo, você acha que dá para a gente pensar numa tarifa que não tenha tanta reclamação do consumidor em Minas? Porque a gente olha… eu até falei assim: “deixa eu olhar minha tarifa aqui, ver como está de impostos”. Tem lá 30% de ICMS, é uma grande reclamação do consumidor mineiro e é histórica essa reclamação. Por que a tributação da nossa energia é tão alta? Você acha que, por exemplo, com esse novo modelo de corporação a gente pode pensar numa tarifa mais digerível, assim, para o consumidor? Ou não tem jeito, os programas sociais demandam muito e alguém tem que pagar por isso, o investimento é muito alto, então o custo do dinheiro é alto para o setor elétrico? Os investimentos são bilionários, como você está mostrando. O que você tem para dizer para o consumidor? Uma parte você está conseguindo resolver aos poucos, esses problemas de queda de energia, mas e essa questão da tarifa, ela é muito complexa?
RP: Olha, Helenice, assim, vamos tentar responder em etapas. A primeira é que a propriedade do capital não define a tarifa. A tarifa é definida pelo poder concedente, pela agência de regulação, pela Aneel, acho que esse é o primeiro ponto. Você estava me perguntando um pouco antes sobre a minha formação, né, eu fiz Economia, Doutorado em Economia, e me lembro bem ali que a minha tese foi discutindo isso, que, às vezes, a busca de eficiência e de melhores resultados você pode conseguir com regulação e com políticas públicas, você não necessariamente precisa da propriedade do capital. Então, a regulação e a política pública é que vão dar esse tom, e não a propriedade do capital, acho que esse é o primeiro comentário. O segundo é que quando a gente olha a tarifa, e aí você falou do imposto, eu acho que o setor, de fato, e aí eu vou falar pelo setor de distribuição, ele tem um comentário que é assim “hoje, o setor de distribuição de energia elétrica é um grande arrecadador de impostos”. Então, mais de 55% do que nós arrecadamos são impostos, ou subsídios e encargos, então, a gente, de fato, tem um papel de arrecadador muito grande. Qualquer mudança nisso são mudanças tributárias, que a gente também entende que você possa diluir, não só a distribuição, mas também a transmissão, a geração, fazer um modelo que, efetivamente, isso seja diluído entre os vários segmentos, mas esse é um tema importante do ponto de vista de que, de fato, a arrecadação, através das distribuidoras, é muito grande. O segundo é que quando a gente olha a evolução, né, e aqui também é um termo interessante, a evolução dos vários componentes da tarifa, o componente da tarifa que menos subiu, que subiu abaixo da inflação, foi o da distribuição. Então, aquilo que é a parte da distribuição na tarifa cresceu menos do que a inflação. O que mais cresceu? É o que a gente chama de CDE, que é a conta de encargos e subsídios. Então, essa é a conta que mais cresceu, ela realmente cresceu muito mais do que a inflação. Então, assim, você começa a colocar muitas políticas de subsídios e obviamente isso acaba sendo repassado para o consumidor e afeta a tarifa. Então, até a própria medida provisória, recente, quer tratar um pouco dessa melhor redistribuição. Acho que esse é um assunto muito positivo da medida provisória, que é melhorar a distribuição dos encargos e subsídios para todos, não só para mercado regulado, como também para o mercado livre, e diminuir parte desses encargos e subsídios. Então, eu acho que isso é uma coisa extremamente positiva. O que eu digo, eu gosto de dizer é assim: “políticas de incentivo, políticas de subsídio, vamos fazer para tecnologias novas, não pra tecnologias maduras”. Tecnologia madura não precisa de incentivo, não precisa de subsídio, ela já é competitiva. Então, eu acho que esse é um ponto importante, acho que aqui nós vamos ter, de novo o que você está falando, eu acho que é uma ótima oportunidade para a gente discutir no âmbito do Congresso Nacional com a medida provisória que caminha nesse sentido de fato discutir os incentivos e os subsídios que aparecem aí nos encargos e que oneram muito a tarifa.
HL: É uma despesa que está no orçamento familiar que ninguém tem como ficar livre, né, se você vai falar “não vou pagar” daqui há 3 meses você está sem luz dentro de casa, ninguém vai voltar a viver de vela acesa, né, gente. Então, Reynaldo, qual é a nova fronteira que você está enxergando? Tem essa questão da usina solar, eólica, mas para a Cemig estar na vanguarda, o que você está enxergando aí para frente, além desses mercados maduros? Usina hidrelétrica, a gente não vai ter mais, né? Eu sou de uma época em que eu ia em inauguração de usina hidrelétrica da Cemig, é uma fonte limpa, vocês têm mais de 30 usinas hidrelétricas sendo comandadas, mas é uma realidade que a gente não vai ter mais, né?
RP: É, um grande ativo do setor brasileiro são as usinas hidroelétricas, acho até que seria muito bom se nós conseguíssemos recuperar e voltar a investir em usinas hidrelétricas. Existem alguns programas hoje, existem leilões de reservas de capacidade, por exemplo, que estão sendo pensados para poder aproveitar de novo o potencial que nós temos, até de reservatórios que nós temos, estruturas que nós temos que permitem aí a gente colocar algumas turbinas novas e ter um pouco mais de hidroeletricidade, mas talvez aqui, para mim, do ponto de vista da Cemig, eu vou até repetir, acho que a Cemig quer ser uma grande provedora de infraestrutura para deixar o setor privado produzir energia elétrica limpa (eólica, solar, hidrelétrica), e para a gente poder ter rede para atrair investimentos em setores intensivos em energia e que precisam de energia limpa. Então, eu acho que aqui a gente tem muito esse foco, desses R$ 59 bilhões, 75% é rede, então é isso, trazendo essas inovações, como por exemplo, eu estou falando do tema de armazenamento de energia, aqui é uma rede que ajuda nessa intermitência.
HL: Vai ser uma plataforma, mesmo, de serviços, não é concorrer com esses novos players, é estar do lado deles para agregar valor.
RP: E ser um elemento de indução e de desenvolvimento para o Estado. Agora, do ponto de vista ainda mais geral, acho que é uma oportunidade única para o Brasil. Nós temos aí a COP-30 e aqui tem algumas coisas que eu gosto de destacar: transição energética não é uma moda ambientalista, transição energética é uma mega macrotendência global.
HL: Não tem como fugir disso.
RP: Não tem. Não tem como fugir de inteligência artificial, de biociência e de transição energética, e diga-se de passagem, inteligência artificial e transição energética têm pontos em comum imensos.
HL: Precisa de energia.
RP: Precisa de muita energia. Então, aqui também vale um comentário que eu gosto sempre de fazer. Quando você faz uma pesquisa no Google e quando você faz a mesma pesquisa no chat GPT, o consumo de energia é de 1 para 15. Toda vez que você está ali no seu celular, você faz uma pergunta para o chat GPT e ele fica ali pensando, significa o seguinte: ele está consumindo energia elétrica. Então, é por isso que, por exemplo, tanto se fala em Data Center. Data Center também é outro número impressionante. Hoje, é mais ou menos 2% do consumo de energia elétrica do mundo. As projeções são que nos próximos 10 anos vai ser de 6% a 8% do consumo de energia elétrica do mundo inteiro. Então, é muito crescimento, o mundo estará cada vez mais eletrificado. Eu vi muito aí nesse seminário a Nova Era da Eletrificação, porque quando a gente fala em metas de netzero, metas de descarbonização, o setor que mais cresceu é energia elétrica, não tem grandes avanços do ponto de vista industrial, por exemplo, nas manufaturas, mas tem avanços imensos no setor elétrico com a eólica, com bateria, com novos usos de carros elétricos, de Data Center…
HL: Isso tudo demanda mesmo. Tem um plano até 2040, né.
RP: Não tem país melhor de se estar que o Brasil.
HL: O Brasil tem tudo? É igual ao agro, ele tem terra, sol e água o ano inteiro. Na energia elétrica o Brasil tem os principais elementos?
RP: Tem, porque a gente tem energia limpa a preço competitivo. Então, tem uma outra frase que eu gosto assim “todo mundo gosta de falar em sustentabilidade, mas ninguém gosta de pagar a mais”, então, a gente chama de green premium, ninguém quer pagar o green premium, mas você quer pagar o menor preço de mercado. Então, o Brasil tem isso, o Brasil tem a vantagem de ter energia competitiva e limpa.
HL: Você acha que ela é competitiva mesmo com o custo que está atualmente?
RP: Com certeza. Para grandes consumidores não há a menor dúvida, a nossa energia é extremamente competitiva.
HL: Passou aquela época em que o pessoal ficava reclamando que energia era o que mais impactava o custo de uma empresa.
RP: Obviamente depende do setor, mas de qualquer modo é muito mais competitivo do que em outros países do mundo, eu não tenho dúvida nenhuma.
HL: Você acha, então, que o Brasil não pode perder esse bônus elétrico, digamos assim? Já perdeu o bônus demográfico, não pode perder o bônus da energia sustentável.
RP: Eu diria que nós temos uma oportunidade única de nos inserirmos como um país líder em energia limpa, líder em sustentabilidade, e que é capaz de atrair setores intensivos que buscam essa energia e que podem se beneficiar dos recursos naturais que nós temos aqui. Eu também gosto de citar, uma vez que eu estava viajando e vi um monte de planta solar em Boston, eu falei “gente, onde será que é melhor estar essa planta solar? Em Boston (EUA) ou em Montes Claros (MG)?”.
HL: Que tem sol o ano inteiro.
RP: Muito melhor, né, tem fatores de radiação solar… aquele mesmo painel, se ele estivesse em Montes Claros estaria gerando muito mais energia. Nós temos que aproveitar isso, são políticas e alinhamento entre setor privado e o setor público…
HL: E está tendo isso, Reynaldo?
RP: Eu acho que nós precisamos acelerar muito isso.
HL: É, eu também estou achando. Está a 50 km/h e tem que estar nos 300 km/h.
RP: É um assunto que nós… de novo aqui, você está me fazendo soltar muitas frases (risos), mas eu acho que o Brasil precisa pensar o futuro e não ficar defendendo direitos passados, mas entendo que o momento que nós estamos agora, com essa medida provisória, é um ótimo momento para se pensar uma reforma do setor elétrico que efetivamente permita a gente se acoplar com mais força nessa transição
HL: Para você, o que tinha que ter em uma reforma imediata, assim, no setor elétrico? O que tinha que vir primeiro?
RP: Eu vou no campo de vista de política pública, né. Quanto mais nós conseguirmos apoiar novas tecnologias e quanto mais a gente consiga sair de repetir incentivos e subsídios para tecnologias maduras, eu acho que mais nós vamos caminhar nesse sentido de permitir o Brasil ser líder na transição energética.
HL: E aí o que falta é destravar no Congresso…
RP: O que falta é ter políticas públicas que realmente se alinhem nesse sentido do futuro. Então, vou dar um exemplo aqui do data center, que a gente sempre comenta muito. A energia que nós podemos oferecer é extremamente competitiva, mas quando você vai fazer o custo total de implantação do projeto, aí o bicho pega. O equipamento e o imposto de importação sobre o equipamento deixam outros países mais competitivos.
HL: E aí o investidor vai investir lá no outro país, mesmo o Brasil tendo isso tudo aqui que a gente falou agora.
RP: Como alinhar e, por exemplo, ter a atratividade para trazer o data center para cá ou para trazer qualquer outra indústria intensiva que necessite de energia limpa, mas aí a gente tem que ter políticas mais amplas, como por exemplo, eventualmente, oferecer aí sim algum incentivo do ponto de vista do imposto de importação, mas por quê? Porque eu estou atraindo o novo.
HL: É com essa justificativa.
RP: É diferente de eu renovar um subsídio que existe hoje, por exemplo, em muitos setores de energia solar, geração distribuída.
HL: Que já são mercados maduros.
RP: São mercados com tecnologias já muito maduras.
HL: Já consolidadas e que não vão crescer muito mais do que aquilo, já dá para fazer um investimento maior.
RP: E que já tem rentabilidade independente…
HL: Já se pagam, né?
RP: Já se pagam.
HL: Então, é um novo olhar mais apurado de gente que entende para atrair esses investidores, esses grandes players, eles ficam olhando o mundo inteiro, né, Reynaldo? Você vai nessas rodadas de investimento, nesses roadshows mundo afora, você sabe o que que o investidor está querendo. Ele está querendo custo, ambiente de negócio, previsibilidade, é uma plataforma, então não dá para ser uma coisa ou outra.
RP: Então, assim, apoiar políticas pró energia renovável, não pró uso de combustíveis fósseis, apoiar políticas pró tecnologias inovadoras, não pró, vamos dizer, tecnologias maduras, acho que, para mim, são os caminhos. E aí, de fato, para falar de energia limpa, obviamente que aqui a Cemig é um grande exemplo, a gente tem muito orgulho de dizer que é 100% renovável, todo o parque de geração da Cemig é renovável. É hidrelétrica, eólica e solar, só. Nós tínhamos uma térmica, fechamos. Não é nem que a gente vendeu, a gente fechou, ou seja, não emite mais por outro, mas para o mundo seria equivalente. Não, hoje fechou, e a gente faz parte, a ação da Cemig faz parte do Dow Jones Sustainability Index faz 25 anos, a gente faz parte de um outro índice importante que se chama MSI, naquelas agências de classificação de risco para emissão de carbono também somos A, o melhor nível, e a gente também ganhou… saiu uma pesquisa, acho que é recente, nós estamos entre a 40 empresas mais limpas do mundo.
HL: Nossa, isso aí é um valor incomensurável, não dá nem para medir, você conseguir ficar entre as 40 do Mundo.
RP: As 40 empresas mais limpas do Mundo. Eu acho que isso é um orgulho do mineiro, temos que ter muito orgulho aqui do trabalho que nós fazemos. Então, isso mostra que se nós temos isso, é porque o Brasil tem isso, então, assim, eu repito, é só fazer agora, nós temos capacidade de trazer para o Brasil exemplos ou mais exemplos como nós temos na Cemig.
HL: Ou seja, é o clichê, né, é a vontade política para mudar esse panorama de imposto de importação para essas novas tecnologias.
RP: Assim, para coordenar, eu acho que aqui é assim, como é que a gente tem políticas públicas que coordene os interesses no sentido da transição energética? Então, eu acho que esse é o ponto central, é a gente coordenar os interesses, coordenar o setor privado e o setor público para esse caminho e não para outros caminhos que não são o caminho da sustentabilidade, do netzero, da descarbonização.
HL: É muito chão e que não depende só da Cemig, né, aí já depende de todo um cipoal, digamos assim.
RP: É, quando você fala em transição energética, de novo, outro número global é que o que se investe em transição energética, hoje, é praticamente o PIB do Brasil. Então, não é moda, o mundo ano passado investiu 1,7 trilhões de dólares em transição energética. O PIB do Brasil são 2 trilhões de dólares.
HL: E o quanto disso veio para o Brasil?
RP: Se a transição energética fosse um país, era praticamente do tamanho do Brasil. Se isso não for uma oportunidade….
HL: Não dá para ficar esperando muito, porque a gente vai perder essa oportunidade.
RP: É claro que a gente está ligado, mas eu gostaria de estar muito mais conectado nas grandes transformações e não nos incentivos a tecnologias maduras que já estão estabelecidas.
HL: Reynaldo, acredita que a gente já está terminando? Eu queria que você mostrasse como é que está o tamanho da Cemig, hoje. São quantos funcionários, como está o número de clientes, a inadimplência está sob controle, tem concurso? Às vezes o pessoal fica querendo saber, né.
RP: A Cemig, hoje, tem mais ou menos 5 mil funcionários. Quando a gente soma terceiros, tem mais 23 mil terceirizados, então estamos falando de um total de 28 mil colaboradores. Temos mais ou menos 9 milhões de clientes. A Cemig é de fato a maior área de concessão de distribuição atendendo 777 municípios. Os números, de fato, são todos muito grandes, quando a gente olha assim são milhões de atendimentos ao cliente por ano, são dezenas de milhões de atendimentos de clientes por ano. Falando mais do ponto de vista da nossa estruturação, da estrutura organizacional, nós sim temos discutido muito mais primarização, essa relação 5 para 23, eu acho que é uma relação que a gente tem que fazer crescer mais a primarização. Então, por exemplo o Cemig Agro. A gente está trazendo funcionários novos, concursados, então novos eletricistas, vamos soltar aí um novo edital para contratar, um novo concurso público.
HL: E vai ser quando? Já dá para falar?
RP: Acho que umas 2 semanas. Passou na diretoria, então, assim, já foi aprovado pela diretoria, inclusive com uma cota de 25% para negros, que eu acho um tema muito positivo do ponto de vista de diversidade. Acho que estamos num momento positivo de investimento e nós temos que viabilizar com gente, gente e gente, que ao final a empresa é gente. Eu acho que é isso, a gente está efetivamente fazendo, a gente está trazendo concursos públicos, aumentando a quantidade de pessoal próprio e ao mesmo tempo buscando treinar mais, é capacitação de toda a parte de terceiros, eu acho que também é um tema muito importante, temos aí muitos prêmios junto com os fornecedores, acho que aqui é toda uma política de segurança, política de compliance. Hoje, quando a gente pensa nos nossos fornecedores, eles de fato são parceiros.
HL: Eles têm que ser sustentáveis também, né? Não pode ter nenhuma situação análoga à escravidão, não dá para ter essas coisas, né.
RP: Não. Nós temos que ser sustentáveis no global.
HL: É na cadeia toda. Tem uma outra coisa também que eu achei muito importante, no volume total não é tão grande, mas passa uma visão de que quer reduzir custos. Vocês venderam as aeronaves, reduziram custos com hangar e tudo, R$ 16 milhões e manutenção que tinha com essas aeronaves de R$ 4 milhões para atender a diretoria, você até postou isso no seu LinkedIn, eu achei um exemplo para dar para outras empresas. Dá para fazer isso, dá para ter uma vida normal, não é porque é alto cargo que tem que andar de avião próprio, elevador próprio, ali tudo separado e pronto, está todo mundo no mesmo time.
RP: Isso mesmo, Helenice, quando eu falei lá daquele ajuste de eficiência, a empresa estava muito fora dos parâmetros de eficiência, fora das despesas regulatórias. Algumas coisas que a gente fez, eu acho que são esses exemplos de austeridade. Então, uma é isso mesmo, nós tínhamos dois aviões e um hangar na Pampulha, no melhor lugar da Pampulha, com piloto, garçom, então aquilo custava, só o hangar e essa estrutura, custava mais de R$ 3 milhões por ano, não estou falando de combustível, estou falando só a estrutura. Então, isso aí são R$ 3 milhões de economia por ano só com sair do hangar, né. Trocamos tudo isso por um convênio com a Polícia Militar. Ocasionalmente, se tiver uma urgência, a gente pode usar um avião executivo, mas eu mesmo só faço aviação comercial, e vendemos os aviões, então tínhamos 2 aviões, vendemos tudo isso para investir. Vou dar outro exemplo aqui: nós tínhamos, em termos de sede, a área que nós ocupamos hoje é 40% do que nós ocupávamos. Nós tínhamos o prédio da avenida Barbacena e o prédio onde está o Banco Inter. Aquele prédio onde está o Banco Inter era um prédio alugado para a Cemig, então nós devolvemos aquele prédio, a Gasmig estava num outro edifício, trouxemos a Gasmig para o prédio da sede, a Cemig SIM também tinha um outro local, também trouxemos tudo para a avenida Barbacena, e naquele prédio tem 21 andares, devolvemos 5. A Diretoria está num espaço que a gente chama de open space, ou seja, os diretores não têm sala, os diretores, vice-presidentes não tem sala própria. A minha sala…
HL: Era gigante, eu lembro, já fui lá. (risos)
RP: (risos) Era um apartamento daqueles bem grandes
HL: Para que, né? Fica um elefante branco.
RP: Hoje, eu tenho uma sala absolutamente normal
HL: É, não é essa a tradução de uma estatal.
RP: Não. A gente tinha, também, um elevador com ascensorista para a presidência
HL: É, eu me lembro disso, a gente não podia entrar não, era só para a presidência.
RP: Era um elevador com uma ascensorista, que obviamente custa.
HL: O elevador também, com os outros todos lotados.
RP: E que usava 2 vezes ao dia, para subir e para descer. Então, hoje a gente tem uma senha e se, eventualmente, vier uma autoridade, ela pode fazer um uso exclusivo. Em nível de estrutura, de assessores da presidência, eu acho que reduzimos mais de 80% de viagens, esses são números, realmente, que eu acho exemplos, e que quando a gente olha, todo superintendente tinha uma secretária. Acabou. Isso nos permite, de novo, alienar muitos imóveis, porque hoje eu ocupo menos espaço e aí eu consigo dar um uso melhor para esses imóveis. E de novo, tudo isso é para investir mais.
HL: O pessoal fala “mas essa economia é pequena”. Vai juntar tudo aí, por isso deram os R$ 14 bilhões, vai fechando as torneirinhas.
RP: E quanto custa manter tudo isso? Quanto custa pagar IPTU, vigilância, manutenção? Eu prefiro fazer poda de árvore, prefiro fazer limpeza de faixa. Então, assim, poda de árvore a gente faz 4 vezes mais, acho que fazia 150 mil, no ano passado fizemos 700 mil.
HL: A gente vivia vendo aquelas árvores caindo podres, né. “Ah, é porque a Cemig não veio”.
RP: A gente não fazia o que a gente chama de manutenção preventiva. Então, limpeza de faixa, também, acho que hoje fazemos 50 mil quilômetros, fazia-se 6 mil quilômetros, entendeu? Então, são números muito expressivos em que a gente está usando os recursos para melhorar o serviço, para podar árvores, para fazer manutenção preventiva, para fazer limpeza de faixa, e não, vamos dizer, com gastos que obviamente a gente entende que eram desnecessários, tanto que ocupamos um espaço que é 40% do espaço anterior.
HL: E não está funcionando até melhor? Porque a comunicação fica até mais rápida sem paredes.
RP: Eu gosto muito mais.
HL: Eu também, acho que é outra visão, mais moderna, e traduz o que a empresa quer atualmente, que é isso, né, essa remodelagem completa, total.
RP: E traduz uma acessibilidade. Assim, precisa falar com a gente, fala, minha porta está aberta, não precisa passar por três assessores, aquela coisa quase inaceitável. Então, outra coisa, de fato hoje a gente criou um negócio, também, que eu gosto muito, que são as regionais. Você imagina que a Cemig fazia todo o atendimento, de todo o Estado, da área que nós servimos, só através da Regional de Belo Horizonte, então às vezes a gente tinha pessoal que fazia cálculo e investimento de linha nova no Triângulo Mineiro, desde Belo Horizonte. Então, hoje nós criamos 6 regionais: uma regional em Montes Claros, uma regional em Governador Valadares, uma regional em Juiz de fora, uma regional em Uberlândia, uma regional em Pouso Alegre, a regional de BH, e cada regional está ali e tem o contato do prefeito, e tem o contato com as principais indústrias, com toda a área de serviços, ela está ali para atender aquela população. A gente fez a inauguração chamando todas as autoridades para todas essas regionais, e o que eu estou dizendo é que as nossas portas estão abertas, nós estamos aqui de cara aberta, não é para você ligar no 0800 e não saber com quem você está sendo atendido. Hoje, a gente está dizendo o seguinte: “é isso mesmo, nossa função é poder te atender, você sabe o meu telefone, é esse aqui, o meu endereço é aquele ali”.
HL: São pagos para isso, né, para servir.
RP: Então, acho que quando a gente fala nisso, open space, quando a gente fala em muito menos, vamos dizer, aqueles controles todos, aquela liturgia, é para mostrar isso, que a gente é acessível, porque o que a gente quer é servir o público, é a nossa função. Obviamente que ficamos muito felizes quando eu recebo… hoje, antes de vir aqui, tinha lá um produtor grande de feijão de Patos de Minas, e ele estava muito feliz me mostrando lá os investimentos dele, mas elogiando o que a gente estava conseguindo atendê-lo. Então, são essas coisas que deixam a gente feliz, eu vou sair da reunião com ele aqui feliz, assim, olha que legal, a gente perceber que tudo isso aqui é para gerar mais emprego, para gerar mais desenvolvimento.
HL: Mais renda, mais investimento, porque antes, na primeira reclamação, o pessoal vinha logo falando “não, porque a Cemig não dá apoio, estrutura”, e agora esse discurso já vem mudando.
RP: Vem mudando e, assim, a gente sabe com quem você tem que falar. Então, para nós esse é o nosso propósito, é o que a gente quer, e se tiver coisa que nós temos que melhorar, nós estamos aqui para ouvir e para poder melhorar.
HL: Você vem, dá entrevista, transparência total, falou de todos os assuntos sem censura, sem nada, é isso mesmo que tem que ser feito de um gestor, né, você é um gestor.
RP: E é o nosso propósito. De fato, ser indutor do desenvolvimento de Minas, transformar vidas com a nossa energia. Nossa campanha, que a gente acabou de lançar, é uma campanha de coragem, é uma campanha que no fundo está dizendo “olha, eu quero te atender”. A gente diz “pode sonhar, pode produzir, pode crescer, a energia da Cemig está com você”. É cara aberta.
HL: Está lá apoiando, é isso. O pessoal da diretoria da Faemg, que representa 600 mil produtores rurais, eu falei “vou entrevistar o presidente da Cemig”, e eles “nossa, manda um abraço para ele. Agora sim, no campo a gente está conseguindo produzir e a resposta é rápida, não fica mais 3 dias com luz desligada, agora vem logo o pessoal e liga perguntando se já foi resolvido”, quer dizer, tem até o feedback, né, que era uma coisa que antigamente não tinha.
RP: E tenho que dizer mais uma coisinha, assim, temos muito orgulho de dizer que somos o maior patrocinador cultural de Minas.
HL: Vocês nunca abandonaram, né.
RP: Não, a gente de fato investe muito na mineiridade e na cultura de Minas.