A cena de uma garota de 17 anos sendo agredida e aprisionada à força dentro do porta-malas de um carro, em meio a outras pessoas inertes, circula nas redes sociais desde o último sábado (5). Ninguém que aparece ao redor de Larissa Estefany da Silva Rodrigues, de 17 anos, a vítima, é filmado tentando salvá-la ou chamando por ajuda. A adolescente só foi encontrada no dia seguinte, morta, dentro da Várzea das Flores, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte.

Os algozes de Larissa nem sequer tentaram se esconder das câmeras que os filmavam no momento em que a jogaram dentro de um HB20. O crime escancara a violência e o julgamento sem piedade ou sem defesa relacionados ao mundo do tráfico de drogas, do qual Larissa, em suas redes sociais, admitia fazer parte. Veja o vídeo:
 

A cena de uma garota de 17 anos sendo agredida e aprisionada à força dentro do porta-malas circula nas redes sociais desde o último sábado (5). Ninguém que aparece ao redor é filmado tentando salvá-la. A jovem só foi encontrada no dia seguinte, morta. pic.twitter.com/ta4l7p6Bdt

— O Tempo (@otempo) November 9, 2022
 
 
“Esse tipo de atitude (o crime) demonstra poder e que não se aceitam traição e deslealdade. E por que as pessoas não falam nada? Porque certamente são pessoas que convivem ali e que, se fizerem algo, também serão cobradas”, analisa a pesquisadora do Centro de Pesquisa em Segurança Pública (Cesp-Puc Minas), Roberta Fernandes Santos. 
 
A motivação para o assassinato de Larissa ainda não é explicada pela Polícia Civil, que informou, nessa quarta-feira (9), que um jovem de 26 anos foi preso e que as investigações prosseguem. Esse rapaz, chamado Daniel César de Siqueira Neves, revelou à Polícia Militar (PM) que Larissa morou em sua casa por alguns meses e que ela mantinha relações sexuais com ele e com outros dois amigos dele. No entanto, os quatro teriam se desentendido por causa dos negócios que tocavam juntos.


Entenda o crime

De acordo com o depoimento do jovem preso, após esse rompimento, a adolescente passou a andar acompanhada de alguns rapazes de Ribeirão das Neves, na região metropolitana da capital. Para mostrar poder, conforme o depoimento, ela aparecia com os novos aliados armados em ligações de vídeo para Daniel e os amigos – que teriam matado a jovem.
 
Daniel contou à polícia que esses amigos “resolveram o problema com Larissa” no sábado (5), em um baile funk em Contagem. Ele disse que não foi ao baile porque estava “muito louco”. O suspeito foi preso em uma oficina de Igarapé, também na região metropolitana, enquanto tentava adulterar a placa do HB20 usado no crime. Os outros dois suspeitos fugiram “para uma cidade a aproximadamente seis horas de distância”.


Atração pelo tráfico de drogas

Em seu perfil no Instagram, Larissa demonstrava interesse por uma vida de festas, diversão, boa aparência, além de itens caros. Em uma das fotos publicadas, ela aparece com uma grande quantidade de dinheiro na cintura. Em outra postagem, a garota escreve: “Olha quantos na pista querendo estar na vida (ter a vida dela)”. 
 
Para o delegado Daniel Reis, que atua no Departamento Estadual de Combate ao Narcotráfico, a vontade de possuir bens materiais de maneira rápida é o que motiva muitos adolescentes a entrarem no tráfico de drogas. “Quando uma criança ou adolescente vê um traficante se dando bem, ostentando, aquilo passa a ser algo que ele almeja. É muito comum você ver traficantes ostentando em redes sociais, por exemplo. A violência sempre fez parte do tráfico e vai continuar sendo, até por meio de garantir território”, explica o delegado.


Família tentou ajudar Larissa 

Em conversa com a reportagem, uma pessoa que era próxima de Larissa contou que a família tentava convencer a garota a sair do mundo do crime, com o qual se envolveu aos 13 anos. As motivações, segundo a fonte, que terá a identidade preservada por questões de segurança, seriam a revolta com o fato de os pais serem separados e más companhias. 

“Ela era uma boneca, uma menina linda e comunicativa. Mas, infelizmente, foi se transformando por causa de certas pessoas e também por uma rebeldia de ter os pais separados e de se sentir rejeitada. Ela prezava muito essa questão familiar. Tanto que todos estão falando da tatuagem que ela fez com um fuzil, mas é preciso que as pessoas saibam que ela tatuou os três irmãos em um braço e a avó, quem ajudou a criá-la, em outro”, contou a pessoa. 
 
Ainda de acordo com essa fonte, diante do envolvimento da Larissa com o tráfico e a prostituição, a família cogitou interná-la em uma clínica de reabilitação, pois ela era usuária de drogas e chegou a ser apreendida pela polícia, mas a garota ficou ainda mais revoltada com essa possibilidade e disse que “preferia ser morta a ser internada”. “Ela não precisava disso. Tinha estrutura familiar, pessoas que a amavam de verdade e queriam lhe proteger”, afirmou.

Para a  professora de ciência política e direitos humanos Daniela Mateus de Vasconcelos, sair do tráfico é difícil porque a pessoa cria vínculos naquele meio. “Acaba criando um sentimento de pertencimento e dependência”, explicou.
 
No próximo domingo (13), uma missa será celebrada para homenagear Larissa e também, segundo pessoas próximas à adolescente, conscientizar e alertar para a necessidade de políticas públicas de combate ao tráfico de drogas, que coloca em risco as vidas de milhares de jovens e adolescentes. O corpo da adolescente foi enterrado nessa terça-feira (8), em Juatuba, na região metropolitana de Belo Horizonte, onde ocorrerá a celebração de sétimo dia. 


Justiça por Larissa

Amigos de Larissa Estefany da Silva Rodrigues criaram um perfil no Instagram chamado “Justiça por Larissa”, em que pedem que os responsáveis pela morte da adolescente sejam presos. Na página, há fotos dos suspeitos e um resumo do crime. Conforme os criadores da página, “Larissa vendia seus conteúdos e fazia seus programas", mas foi brutalmente assassinada. Há fotos dos possíveis suspeitos, além de vídeos. O perfil já conta com mais de 20 mil seguidores. 
 
“Larissa não era nenhuma santa, mas morrer do jeito que ela morreu não é certo. Por isso, estamos atrás dos culpados”, diz uma das publicações. Em outra postagem, os criadores escrevem: “Nenhuma mãe é obrigada a ver isso. O que eles fizeram não tem perdão. Deus vai fazer a justiça”. 
 
Com colaboração de Cledemar Duarte