Crimes ambientais

Dirigentes da Samarco podem pegar até 26 anos de prisão

Entre delitos estão a mortandade de peixes e danos irreversíveis ao meio ambiente

Por bernardo Miranda
Publicado em 26 de novembro de 2015 | 04:00
 
 
Distrito de Bento Rodrigues foi devastado pela lama da barragem FERNANDA CARVALHO / O TEMPO

Com o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central de Minas, a Samarco pode ter cometido ao menos nove crimes ambientais, que podem gerar uma pena de até 26 anos de prisão para os representantes legais da empresa. A punição ainda pode ser aumentada em alguns crimes, já que há agravantes, como o de causar danos irreversíveis ao meio ambiente. Apesar de a lei prever a restrição de liberdade, especialistas em direito ambiental alertam que parte das sanções pode ser revertida em multas e que há risco de ninguém ir para a prisão ao fim do processo.

Entre os crimes – previstos na Lei de Crimes Ambientais, de 1998 – que podem pesar sobre a Samarco estão matar espécies da fauna nativa, desmatar áreas de preservação ambiental, provocar poluição que cause mortandade de peixes, prejudique a saúde humana e provoque a suspensão de captação de água para abastecimento. Porém, para que os dirigentes respondam por esses crimes, é preciso que o Ministério Público ofereça a denúncia e a Justiça acate o processo.

Para o presidente da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Mário Werneck, mesmo que os dirigentes sejam processados, muito dificilmente eles serão presos. Isso porque a pena mínima somada desses delitos é de oito anos e três meses. Se o juiz considerar que os crimes foram culposos (sem intenção), essa pena ainda pode cair pela metade. Além disso, em três dos nove crimes previstos, o juiz pode decidir por substituir a prisão por multas.

“A lei prevê que os dirigentes são responsáveis pelas infrações das empresas. Mas o problema é que a legislação ambiental é muito branda. Esses crimes têm penas muito pequenas, o máximo em cada delito é de cinco anos, o que permite que sejam transformadas em prestação de serviço. Com os bons advogados e o poder econômico que as empresas envolvidas têm, ninguém vai ser preso”, analisa.

Já o professor Bruno Albergaria, da Faculdade Arnaldo, destaca que o tamanho do desastre deve sensibilizar os juízes para uma pena mais rigorosa. Ele destaca que os agravantes podem até dobrar a punição em alguns casos. “Eles cometeram uma boa parte de infrações dos crimes ambientais. Se essas penas forem somadas e aplicadas com rigor, os executivos vão ser condenados à prisão”, projeta.

O Ministério Público ainda está em fase de investigação, e o promotor do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais, Felipe Faria, é cauteloso ao falar sobre prisão. “Ainda é precipitado falar sobre a caracterização de responsabilidade criminal. Mas, seguramente, havendo a constatação de que houve crime, será feita uma denúncia pertinente”. A Samarco não respondeu à reportagem.

Mais delitos

Mortes
. Os 26 anos de prisão levam em conta só os crimes ambientais. O presidente da Samarco e os diretores da área operacional ainda podem responder na esfera criminal por homicídio. Até o momento são 12 corpos e 11 pessoas desaparecidas.

Memória. No caso da queda do viaduto Batalha dos Guararapes, em BH, a Polícia Civil chegou a indiciar os presidentes da construtora Cowan e da projetista Consol por homicídio culposo, mas o Ministério Público retirou esses crimes da denúncia.

Presidente da mineradora pede ‘calma’ a seus funcionários

Pela segunda vez desde a tragédia, Ricardo Vescovi gravou um vídeo direcionado à população e a seus funcionários. Nele, o presidente da Samarco diz ainda desconhecer as causas da tragédia e que o trabalho até lá será longo. “O que aconteceu não foi progressivo, foi repentino. Por isso, mais que ninguém, nós, da Samarco, queremos buscar todas as respostas”.

Vescovi reforça que os funcionários terão licença remunerada e férias coletivas até o início do ano – não há promessa de estabilidade após esse período. Ele afirma que a Samarco vai seguir em frente e pede calma aos trabalhadores.

MPMG. Vescovi foi intimado a prestar esclarecimentos ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A oitiva será feita pelo promotor Guilherme Meneghin, em Mariana, na região Central, local do rompimento da barragem.

Esta será a primeira vez em que Ricardo Vescovi será ouvido oficialmente pela promotoria. O encontro está agendado para a próxima terça-feira.

Assistência social

Barra Longa
. A Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social entregou o Plano de Assistência Social para Barra Longa, um dos mais distritos mais atingidos pela barragem. Foram 120 casas e 309 moradores atingidos. Entre as ações de curto prazo está a organização das doações. Os moradores precisam de material de higiene pessoal e roupas de cama e banho. Entre as medidas de médio prazo está a contratação de uma equipe de assistência social.

Mariana. O Plano de Ação da Assistência Social da cidade está em fase de implantação, com ações de curto e médio prazo, além de definir atribuições à Samarco em relação ao atendimento das famílias e dos indivíduos atingidos.

Meio Ambiente. A ministra Izabella Teixeira defendeu uma revisão da legislação ambiental no país. Ela disse que a tragédia ainda está causando efeitos. De acordo com Izabella, as próximas chuvas vão revolver a lama do fundo dos rios, provocando novas movimentações do material tóxico, e uma avaliação concreta do ocorrido só poderá ser feita após todos os efeitos aparecerem.

Promotoria quer atestar segurança

O Ministério Público de Minas abriu um novo inquérito sobre o rompimento da barragem de Fundão. Desta vez, vai apurar as condições de segurança das outras duas estruturas do complexo: Santarém e Germano.

O promotor Carlos Eduardo Ferreira quer atestar o grau de estabilidade delas para evitar novas tragédias. “Temos que atuar com o princípio da prevenção”.

PC. Peritos das polícias Civil e Federal sobrevoaram a região atingida pelos rejeitos da barragem. Segundo o diretor do Instituto de Criminalística da PC, Marco Paiva, o objetivo era definir o perímetro de trabalho da perícia. “Precisamos definir o mapeamento da fauna e da flora. Vamos sobrevoar os 853 km do leito do rio Doce”, disse.

Sobre a identificação dos corpos – quatro ainda não foram reconhecidos – Paiva trabalha na criação de um banco de DNA dos parentes. “As células vivas são danificadas pela lama tóxica. Por isso demora”. Doze pessoas já foram ouvidas e outras dez serão até o fim da semana.