Estratégias nas redes sociais, redução de pessoal e ampliação das ofertas de entrega a domicílio. É assim que boa parte dos estabelecimentos de Belo Horizonte e região metropolitana tem tentado sobreviver ao fechamento ainda indeterminado das lojas físicas, provocado pela pandemia do novo coronavírus.

Além disso, entregadores e comerciantes têm tido que redobrar atenção para que contato com cliente seja praticamente nulo, como orientam os médicos infectologistas.

A estimativa do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Belo Horizonte e Região Metropolitana (Sindhorb)  é de que 1.500 estabelecimentos da capital e cidades vizinhas estejam atuando com delivery nesses dias.

Localizada na Savassi, na região Centro-Sul da capital, a hamburgueria Severo Garage já registrou uma queda de 70% no faturamento. Desde a última sexta-feira, estabelecimento está funcionando apenas com entregas por aplicativo ou no próprio balcão.

“O impacto financeiro é muito grande. Como a nossa localização é privilegiada, tem um fluxo de público muito grande em busca de alimentação e lazer. Esse público representava dois terços do faturamento da casa, e o delivery um terço. Nesses primeiros dias, grande parte da população se abasteceu muito em casa, então isso também faz com que a demanda por delivery seja menor”, afirmou a proprietária do local, Natália Nogueira Dias Sana Neves. 

Para Natália, prejuízo é ainda maior porque grande parte da receita deve ser dividida com os aplicativos de entrega. “Já há queda de faturamento bastante expressiva e a margem desses aplicativos vai pesar ainda mais no resultado financeiro da empresa. A gente espera que as empresas revejam essas taxas, principalmente nesse momento, pra que quem ainda conseguiu se manter no mercado consiga ter um respiro financeiro”, ponderou. 

Em Betim

Dona da confeitaria Ganache, em Betim, na região metropolitana da capital, Bárbara Lima deu folga para parte dos funcionários e teme prejuízo com a Páscoa, que acontece em meados de abril.

“O impacto financeiro é principalmente por causa das entregas que a gente perde, por causa das festas canceladas, dos bolos cancelados. Isso é mais ou menos de 50% a 70% do nosso volume de venda do mês. Está todo mundo muito apreensivo. A Páscoa é o principal. Uma época muito esperada. Vai ter Páscoa? Vai ter venda? E o investimento que eu fiz?”, questionou a microempresária, que também intensificou o serviço de entregas.

Para Natália e Barbara, contudo, uma medida tem sido comum: orientar entregadores para que tenham o mínimo de contato com o cliente. “A gente tem mudado o procedimento na embalagem, mantido toda a limpeza, usado muito o álcool em gel. O entregador já tem um que fica com ele. A gente tem tido o cuidado de levar as entregas todas embaladas, pra gente colocar na bolsa do motoboy e recomendar para que o cliente também tire da bolsa”, disse Bárbara.

“Antes da entrega e após a entrega nossos funcionários higienizam as mãos. Temos um balcão da passagem e fizemos um fechamento para criar esse distanciamento mínimo”, completou Natália. 

Decoração

Mas não só os estabelecimentos ligados à alimentação tiveram que reinventar a forma de comercialização. Proprietário do Favani Outlet, de materiais de decoração, que fica na Pampulha, em Belo Horizonte, Rafael Santos ainda não trabalhava com delivery até o início da pandemia.

“A gente tinha um canal no Instagram que efetuava reservas, mas não chegava a entregar. Desde o início do corona a gente vem sentindo os efeitos. Tanto na China, por falta de produtos da linha importada, com o dólar alto e, agora, com o fechamento das lojas. Tem sido uma experiência nova. Está sendo uma descoberta. Temos gostado bastante, tem dado um resultado satisfatório. Nossa preocupação é só com as entregas agora. Estamos borrifando álcool nas embalagens para que tenha contato mínimo”, disse. 

Já acostumado a trabalhar com entregas, Larriam Oliveira, dono da loja Suplementos Club, que tem sede no bairro Santa Amélia, na região da Pampulha, tem buscado suprir a ausência de vendas físicas por meio das redes sociais.

“Estamos focando o máximo possível no Instagram. Vamos começar com campanhas pagas. Colocamos mensagens para todos os clientes falando que estamos higienizando os produtos, que se precisar vamos entregar grátis independente do valor. Colocamos clientes e amigos próximos para postarem também. Estamos orientando os clientes para que assim que eles receberem o produto, joguem a sacola fora e o higienizem novamente”, afirmou.

O que dia a CDL

Para a Câmera de Diligentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), o esforço tem sido canalizado em tranquilizar comerciantes e, ao mesmo tempo, reforçar a conscientização.

“Nossa grande preocupação neste momento é com a continuidade das operações das lojas. É que quando passar essa crise as lojas continuem abertas, funcionando, e com a mesma quantidade de empregos. A gente acha que essa modalidade de reestudar para que possa fazer o delivery ameniza bastante o prejuízo, mas com certeza ele vai vir”, afirmou o presidente da instituição, Marcelo de Souza e Silva. 

A Picolé do Amado, empresa tradicional de São João Del Rei, na região Central do Estado, e que tem lojas em Tiradentes e Belo Horizonte, também teve que implementar o delivery pela primeira vez. “Estamos no mercado desde 1965 e é a primeira vez que passamos por uma fase dessas. Tivemos que fechar todas as nossas lojas por causa da pandemia do Covid-19 e tivemos que adequar as necessidades. Estamos trabalhando há cinco dias com delivery. Está sendo muito bem aceito, um sucesso. Tivemos que adequar para levar conforto, refrescar e adoçar a vida dos nossos clientes”, afirmou Fernanda Machado, uma das proprietárias da empresa. (Com Tatiana Lagôa)

Especialista reforça cuidados de higienização nas entregas 

Para o médico infectologista Guilherme Lima qualquer ponto possível de infecção deve ser evitado neste momento tanto para entregadores como para os clientes que recebem produtos vindos de outros locais. 

“Tem que evitar o contato próximo, de menos de um metro de distância. O entregador tem que higienizar as mãos com álcool antes e após contato com cartões e dinheiro, além de higienizar frequentemente a moto ou o carro com álcool 70%. O uso de adornos não é proibido, mas está desencorajado, sobretudo anéis e alianças, que podem dificultar a correta higiene das mãos. O cliente deve não só higienizar as mãos como, se possível, higienizar também a embalagem da encomenda”, explicou o médico. 

A recomendação tem sido reforçada pelos principais aplicativos de entregas que atuam na capital e região. Uber Eats, iFood, 99Food e Rappi criaram a opção de “entrega sem contato” em suas plataformas. Assim, usuários podem optar por realizarem o pagamento on-line e combinarem a entrega do produto com o entregador.

Todas as empresas também informaram que elaboraram cartilhas educacionais tanto para os estabelecimentos como para os entregadores. A 99Food e a Rappi informaram que farão, ainda, distribuição de máscaras e álcool em gel para os entregadores nos próximos dias.

A Rappi informou à reportagem que notou um crescimento no número de cadastros de estabelecimentos para o delivery nos últimos dias em Belo Horizonte, mas não soube precisar qual foi o aumento. 

Dez mil pessoas da área alimentícia devem perder empregos em Belo Horizonte nos próximos dias, estima entidade

O fato de os estabelecimentos comerciais estarem impossibilitados de abrirem lojas, restaurantes e bares por tempo indeterminado na capital mineira deve gerar um rombo na oferta de emprego ainda no mês de março, segundo o Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Belo Horizonte e Região Metropolitana (Sindhorb).

De acordo com o presidente da entidade, Paulo César Pedrosa, a previsão é de que 10.000 vagas sejam fechadas. “A crise é muito brava. Estamos esperando o fechamento de cerca de 50 hotéis. Só no mês de março 10.000 trabalhadores estarão perdendo o emprego, podendo chegar a 50 mil no Estado. Como vamos fazer se a gastronomia toda está fechada? Apenas 1% ou 2% é delivery. Como vou pagar IPTU se estou com empresa fechada? A situação é de medo, incerteza total”, afirmou.