Presídio

Familiares de detentos teriam sido forçados a limpar pátio da Dutra Ladeira

Presídio em Ribeirão das Neves estaria cheio de barro e fezes

Qua, 20/11/19 - 03h00
Segundo denúncia de visitantes, a entrega de kits foi condicionada à limpeza do local | Foto: redes sociais / reprodução

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Familiares de detentos do presídio Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte, denunciaram ter sido forçados a limpar o pátio da unidade por agentes penitenciários ontem. A entrega do kit de higiene – que ocorre uma vez a cada 15 dias – foi condicionada à limpeza do local, que estaria, repleto de barro e fezes.

“Eu cheguei na porta do presídio às 6h e já tinha umas 20 pessoas na fila. Normalmente, o portão abre às 8h para a entrega do material. Mas, desta vez, eles abriram a porta e já foram nos entregando rodos e vassouras”, conta a mulher de um dos detentos que não quis ser identificada.

Com receio de deixar os detentos sem itens básicos, como papel higiênico e sabonete, ao menos dez familiares aceitaram limpar o local. “Enquanto eles varriam, os agentes ficavam rindo. E, quando acabaram, muitos tiveram que ir embora com a calça suja de fezes”, diz.

Segundo a presidente da Associação de Amigos dos Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, Maria Tereza dos Santos, a situação teria sido em represália a uma reclamação feita após a visita dos parentes dos presos no fim de semana. “Os banheiros que ficam no pátio para uso dos familiares estava entupido e sujo. Algumas pessoas reclamaram. No dia seguinte, veio a resposta”, afirma.

Lotação

Os familiares de presos denunciam ainda que os detentos já vinham sofrendo os efeitos da superlotação da unidade prisional. Segundo o advogado Fábio Piló, o local teria estrutura para abrigar 1.200 pessoas e tem 2.500.

Abuso

Segundo o ex-presidente de assuntos carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas Gerais Fábio Piló, a situação é um abuso de autoridade. “Não podem condicionar o exercício de um direito a um ato não previsto em lei”, explicou. Ele esteve no programa do Laudívio Carvalho, na rádio Super 91,7 FM.

Dignidade ferida

Ainda segundo o advogado Fábio Piló, os agentes penitenciários envolvidos no abuso de autoridade devem ser punidos com demissão e na esfera criminal. “Essa situação feriu a dignidade da pessoa humana. Imagina ser obrigado a limpar privada se quiser levar comida para um familiar que está preso. Isso é um absurdo”, afirma.

Secretaria afirma que limpeza foi voluntária

Procurada, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp-MG) negou, em nota, que os familiares de presos tenham sido forçados a realizar a limpeza. “Alguns visitantes chegaram ao local antes de a limpeza ser realizada pelos presos e, voluntariamente, pediram para iniciar a limpeza do local. Portanto, não procede a informação de que os familiares precisam limpar o espaço para entregar pertences. O caso dessa terça-feira foi um fato isolado”, garantiu.


A pasta informou ainda que a limpeza é realizada por presos selecionados para essas atividades em troca de remição de pena. A cada três dias trabalhados, um é reduzido da sentença. Os representantes do sindicato dos agentes penitenciários não foram localizados para comentar.

Minientrevista

Maria Tereza dos Santos
Representante dos familiares de presos

Como podemos descrever o local que os familiares tiveram que limpar?

Foi um galpão onde os familiares que visitam a unidade ficam. Lá tem dois banheiros, um feminino e um masculino, e um bebedor de água, que fica encostado na porta do banheiro. Quase nunca tem água, nem no banheiro, para dar descarga, mas tem água que fica vazando do lado de fora, e fica tudo cheio de lama.

Por que os familiares aceitaram sem denunciar?

Limparam para poder entregar o kit. E passaram por essa humilhação calados porque familiar não pode falar nada. Se falam, ainda tomam suspensão da visita por desacato.

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