Reforma

Hospital do Ipsemg tem salas novas, mas ociosas por falta de funcionário

Servidores denunciam que Estado não estaria repassando contribuição de 890 mil beneficiários

Sex, 22/03/19 - 03h00
Há cerca de cinco anos, terceira torre do hospital, que tem 11 andares, está interditada | Foto: Leo Fontes - 4.9.2016

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O Hospital Governador Israel Pinheiro, do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), está com salas e leitos prontos para atendimento desativados por falta de verba, funcionários e insumos básicos, segundo denúncias de servidores. Um dos motivos seria a não aplicação do valor pago pelos mais de 890 mil contribuintes do plano na instituição.

“Está sucateado. A enfermaria tem leitos reduzidos, por causa de uma reforma que nunca acaba, e outros interditados, porque não tem pessoal trabalhando. No bloco cirúrgico, faltam enfermeiro e anestesista. Além disso, há consultórios fechados e uma UTI com 15 leitos desmantelada”, diz um médico do hospital que pediu para não ser identificado. O hospital, que já teve 526 leitos, agora funciona com 300 de internação, 30 de UTI adulto e 18 de CTI pediátrico.

Entre os espaços ociosos, segundo o profissional da saúde, estão blocos cirúrgicos de ao menos cinco setores, leitos de enfermaria e internação, além do Centro de Terapia Intensiva (CTI). Ao menos cinco salas que iriam abrigar novos espaços para hemodiálise, fisioterapia e quimioterapia também estariam prontas, mas desativadas.

“Estão espalhadas (as salas novas) pelo hospital principal, na alameda Ezequiel Dias, e pelo Centro de Especialidades Médicas, na (rua) Domingos Vieira. São salas novas, que aliviariam as filas, mas que não são usadas”, afirma outro servidor.

Outro médico denuncia que o motivo de todo o sucateamento e da falta de pessoal é a ausência de repasses ao hospital pelo governo. “Por lei, funciona com a contribuição do funcionário (de 3,2%), e o governo completa com 1,6%. O governo não está repassando nem o que desconta, nem o que deve. Esse dinheiro está vazando. É um crime”, disse. “Dá dó porque os pacientes são pessoas que têm renda baixa e não estão sendo atendidas”, concluiu.

Ala B

Há cerca de cinco anos, a terceira torre do hospital, a ala B, que tem 11 andares, está interditada, de acordo com o próprio Ipsemg. No local, até 2014, funcionavam enfermarias e salas de exames e internações. Mas uma reforma que deveria ter sido concluída em 2015 foi suspensa e transformou o espaço em um depósito.

 

Menos sete médicos até fim do mês

Até o fim de março, a cardiologia do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg) deve perder sete médicos. Os contratos dos profissionais, que não são concursados, vão vencer, e não há, conforme fontes ouvidas pela reportagem que pediram para não ser identificadas, previsão de reposição de pessoal. “O contrato está vencendo, e o presidente interino não assina nenhum documento. O pedido já foi feito”, disse um médico do hospital.

Três desses profissionais atuavam na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do centro de saúde e já foram desligados do hospital. Outros dois terão os contratos vencidos até o fim de março. “No ambulatório (cardiológico), há um médico cujo contrato vence no fim do mês. Depois disso, ele não vai atuar mais. E tem mais um nessa situação no ecocardiograma”, disse um enfermeiro.

A falta de médicos não atinge somente a cardiologia, segundo o médico que falou com a reportagem em anonimato. “Isso está acontecendo em todas as clínicas. O Centro de Tratamento Intensivo (CTI) pediátrico está com esse problema também. No pronto-socorro, há vários plantonistas que estão nessa situação (contrato sem renovação)”, especificou o médico.

Uma professora aposentada de 72 anos, que falou sob sigilo, está vivenciando as consequências disso. Há três meses, ela aguarda uma cirurgia cardíaca. “Eu ligo todos os dias. Toda semana, eu venho pessoalmente, e nada. A justificativa é que a fila é imensa. Se eu tiver um infarto ou qualquer outra coisa a qualquer momento, vai ser culpa de quem? O problema foi diagnosticado, mas não fazem nada. Acham que isso é normal? É um absurdo”, desabafou.

A aposentada precisa de uma angioplastia e disse que se sente desconfortável de ter que lidar com a doença e o atraso da cirurgia. “Contribuo há 50 anos com esse hospital e, quando preciso usá-lo, sou deixada de lado. Eu me sinto um lixo”, finalizou.

Sobre a renovação dos contratos com esses médicos, o governo não respondeu. (Aline Diniz/MN)

 

Pacientes do interior procuram atendimento

Na porta do principal hospital do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), no centro da capital, é comum ver vans de outras cidades que levam pacientes que precisam de algum tipo de atendimento especializado. No entanto, o sucateamento e a constante falta de pessoal fazem com que esses usuários voltem para casa sem ser atendidos ou tenham que passar a noite em BH.

Um servidor de limpeza aposentado, de 65 anos, que pediu sigilo, é um exemplo. No último dia 11, ele viajou de Teófilo Otoni, no Vale do Mucuri, e não conseguiu fazer a hemodiálise: “Como teve o Carnaval, quando vim fazer o tratamento, não consegui ser atendido porque tinha muita gente já nas salas, e eu só conseguiria mandar fazer o remédio no dia seguinte. Tive que dormir em BH, e foi um gasto”. (AD/MN)

 

Saiba mais

Posição

Sem negar ou confirmar a existência das salas ociosas, o governo do Estado disse que podem ser identificados leitos “momentaneamente” não ocupados porque há “prazo para higienização e preenchimento das autorizações de internação, além da disponibilidade do corpo clínico”.

Ala B

O Estado disse, por meio de nota, que a reforma foi suspensa pelo governo da última gestão.

Normal

O governo atual garantiu que o atendimento de “hemodiálise, quimioterapia, fisioterapia e internação em leitos e CTI estão em pleno funcionamento”.

Protesto

Servidores. No dia 26, a partir das 14h, cerca de mil servidores devem se reunir na Assembleia Legislativa em protesto contra as condições do hospital, segundo o sindicato da categoria.

 

Promessa

“Abandonaram o Ipsemg. Tudo foi tirado da gente. Alguns setores foram reformados e estão parados. Os servidores estão preocupados com este governo. Tivemos uma reunião com ele (Romeu Zema) nas eleições, e ele nos prometeu que iria olhar com carinho, que podia deixar o hospital ser administrado por nós, servidores, mas, agora, mudou.”

Armando Siqueira 

Diretor do Sindicato dos Servidores do Ipsemg

 

Humilhação

“Sou contribuinte há 35 anos e nunca precisei utilizar o Ipsemg, até sentir uma dor forte no peito, no dia 15, e vir correndo. Cheguei aqui e esperei nove horas entre ser atendido e ter um exame pronto. Desde o momento em que tomei um remédio até quando fui liberado, foram mais seis horas. Eu nunca fui tão humilhado. Prefiro morrer a pisar aqui de novo.”

Professor aposentado

65 anos, sob anonimato

 

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