Resistência

Maternidade é cura para dor  

Mulheres que perderam filho para trombofilia insistem em nova gestação, mas monitorada

Por Luciene Câmara
Publicado em 17 de maio de 2015 | 03:00
 
 
Após quase morrer e perder a filha, Isabela teve Pedro e está grávida de cinco meses MARIELA GUIMARAES / O TEMPO

“Superação” é um termo que não cabe na vida de quem perdeu um filho. Mas é na própria maternidade que essas mulheres acham cura e acalento para a dor. Mesmo com o risco de novas complicações em decorrência da trombofilia (que provoca barreiras na circulação sanguínea, como a trombose), elas encararam de novo o desafio de engravidar, dessa vez com apoio especializado para gestação de alto risco. Com o bebê no colo, elas são a prova de que é possível vencer a doença.

A psicóloga Carolina Oliva Rangel, 29, guarda o enxoval de João, que morreu com oito meses de gestação, em abril de 2013. A gravidez corria bem, e o parto estava programado para o mês seguinte. Até que ela sonhou que o bebê nascia de parto natural, mas era levado por alguém vestido de branco. Ao acordar, não sentia João se mexer. No ultrassom, ela descobriu que já não havia mais líquido amniótico e que ele estava morto.

“Achei que fosse mentira de 1º de Abril”. Em choque, ela optou pelo parto natural induzido para que pudesse engravidar o quanto antes – se fosse cesárea, teria de esperar ao menos seis meses. Foram 22 horas de trabalho de parto, dor menor que a morte de João. Um exame confirmou que a causa da morte foi infarto da placenta provocado por trombose, o que poderia ter sido descoberto antes, pelo baixo peso de João.

Um mês e meio após o parto, ela engravidou de Rafael, hoje com mais de 1 ano. “Um filho não substitui o outro, mas acalenta”, disse Carolina. Na segunda gestação, ela tomou 240 injeções do anticoagulante heparina, uma por dia, durante oito meses. “O segredo da trombofilia é o monitoramento”.

A jornalista e blogueira Letícia Murta, 35, fez igual. Despedaçada pela morte de Francisco na véspera do parto, engravidou de Iolanda cinco meses depois. Foi uma gestação monitorada semanalmente, com doses diárias de heparina. Hoje, a menina tem 10 meses e um “irmão-anjo” chamado Francisco. “Consigo falar e viver porque tenho a Iolanda. Mas há um buraco dentro de mim impreenchível”.

Notificação
A Secretaria Municipal de Saúde da capital informou que em 2014 houve 190 mortes por fenômenos como embolias e tromboses. A Secretaria de Estado de Saúde informou que não tem esses dados específicos porque, entre outras razões, o diagnóstico costuma ser conhecido dois meses após o óbito.