Belo Horizonte

Motorista 'se cansa' e abandona ônibus na Savassi

Condutor discutia com uma passageira que reclamava do serviço dele, antes de encerrar a viagem; cerca de 20 pessoas estavam no coletivo da linha SC02 A (praça Sete/Savassi)

Por Fernanda Viegas
Publicado em 28 de setembro de 2016 | 10:19
 
 
Passageiros tentaram convencer motorista de não deixar o veículo Foto: Paula Meireles/Web repórter

Um motorista "se cansou" e abandonou o ônibus que dirigia, na manhã desta quarta-feira (28), na Savassi, em Belo Horizonte. Cerca de 20 pessoas estavam no coletivo da linha SC02 A (praça Sete/Savassi) e precisaram ser realocadas em um outro veículo da mesma linha para continuarem a viagem.

"Na Getúlio Vargas com Gonçalves Dias, ele (motorista) parou um pouquinho antes do ponto e entraram algumas pessoas, só que uma senhora ficou na calçada. Parecia que ela queria que ele parasse exatamente na frente do ponto. Aí, ela deu sinal e ele parou um pouco adiante, onde ela entrou, e já foi pedindo o nome dele para a cobradora, dizendo que ia fazer uma reclamação", narrou a assessora de imprensa Paula Meireles, 31, que já estava dentro do circular.

Também, segundo a testemunha, o bate-boca entre o motorista e a passageira continuou, com ela o acusando de não saber como atender bem as pessoas, afirmando que ele precisa de uma reciclagem. Ele, enquanto dirigia, falava que havia parado no espaço reservado para embarque e desembarque de passageiros.  

Contudo, quando o ônibus passou pela praça da Savassi e parou em um ponto na rua Alagoas, o motorista levantou e disse aos passageiros que não tinha mais condições de continuar e que poderia acabar colocando a vida de todos em risco. Em seguida, desceu do coletivo e pegou um ônibus que passava, indo embora.

Algumas pessoas tentaram fazer com que ele voltasse atrás, mas ele não voltou ao volante. " Não sei se ele não estava se sentindo bem, porque a gente sabe que este trabalho é bem estressante, mas todo mundo que estava ali tinha um compromisso, não é?", disse Paula, que nunca tinha passado por este tipo de situação.

Em meio a confusão, a mulher que discutia com o condutor chegou a dizer que chamaria a Polícia Militar, mas foi embora. A cobradora do ônibus realocou os passageiros em um veículo da mesma linha, que parou no ponto, minutos depois.

"Os passageiros ficaram reclamando com a mulher, porque todo mundo diz que este motorista é super educado", recordou Paula, que usa esta linha todos os dias.

A Polícia Militar (PM) afirmou à reportagem de O TEMPO que não registrou nenhuma ocorrência, relacionado ao fato. Um processo será aberto pelo Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans) para levantar detalhes do ocorrido e a empresa de ônibus pode ser punida, caso seja confirmado que ela deixou de prestar o serviço contratado, como realizar o número de viagens acordadas.

Caso não é novidade

Esta não é a primeira vez, na capital, que um motorista deixa o ônibus no meio do seu trajeto. Em 2014, o motorista da linha 61 (estação Venda Nova/centro) parou o veículo em um ponto da avenida Santos Dumont, anunciou que iria lanchar e não voltou. 

O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (Setra/BH) informou à reportagem que não há um levantamento de casos de abandono de ônibus por motoristas, em Belo Horizonte. O Setra-BH acompanha as apurações do caso.

O Sindicato dos Trabalhadores do Transporte Rodoviário de Belo Horizonte (STTRBH) informou que casos como esse estão ligados às estressantes jornadas de trabalho dos motoristas. “30% dos profissionais tem problemas de saúde, a maioria emocional”, afirmou José Márcio Ferreira, diretor de comunicação do STTRBH. 

Morte invisível

Entre junho e agosto, o jornal O TEMPO acompanhou de perto a rotina de motoristas de ônibus, trocadores, caminhoneiros e taxistas e radiografou um quadro crescente de adoecimento e afastamento do trabalho causado por longas jornadas, clima hostil, ambiente estressante e estrutura precária.

Nos dias ao lado desses profissionais e em conversas com especialistas, a reportagem catalogou mais de 30 doenças desenvolvidas ou agravadas relacionadas aos trabalhadores do transporte no país. Desde conjuntivites provocadas por excesso de poluição no trânsito até casos complexos de embolia arterial em razão da postura e do sedentarismo, passando por todo tipo de transtorno psicológico, a saúde de quem vive ao volante pede socorro.

Em Belo Horizonte, por exemplo, um em cada três condutores e cobradores de lotação (35%), em um período de 12 meses, se licencia por problemas de saúde decorrentes da atividade profissional, de acordo com estimativas do sindicato dos rodoviários e de levantamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), realizado em 2013. Essa espécie de epidemia invisível se esconde em meio a um cotidiano de muita fumaça, quadro de horários rígido, assaltos, buzinas, reclamações e empurra-empurra.

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