Belo Horizonte

Rede municipal de saúde já tem 19 profissionais infectados pelo coronavírus

Dos 1.044 exames realizados para detectar a doença em médicos, enfermeiros e técnicos dos centros de saúde e hospitais municipais da capital, 350 ainda estão em investigação

Por Lucas Morais e Franco Malheiro
Publicado em 15 de abril de 2020 | 19:42
 
 
Apesar de ser referência, Hospital Eduardo de Menezes, na região do Barreiro, ainda não registrou nenhum profissional com coronavírus Foto: Ramon Bitencourt

Na linha de frente de combate ao coronavírus, médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem se dedicam diariamente ao tratamento de pacientes, mesmo com os problemas de superlotação e falta de estrutura que se multiplicam há anos na rede pública. Diante do contato com tantos casos suspeitos, esses profissionais também se expõem aos riscos da contaminação. 

E um balanço divulgado pela Secretaria Municipal de Saúde mostra que, desde o início da pandemia em Belo Horizonte, 19 funcionários dos postos de saúde e hospitais municipais já foram infectados pelo coronavírus. De acordo com a pasta, ao todo 1.044 pessoas que atuam na rede realizaram exames, sendo que 663 foram descartados e outros 350 seguem em análise.

Só no Centro de Saúde Havaí, na região Oeste de Belo Horizonte, foram registrados dois casos, conforme o Sindicato Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Belo Horizonte (Sindibel). Na UPA Leste, outras três enfermeiras seguem afastadas devido à Covid-19 – uma delas está internada no CTI por conta de complicações respiratórias. Um funcionário que atua na unidade e preferiu não se identificar disse que, até hoje, os profissionais da unidade não receberam o treinamento para atuar na pandemia. 

"O atendimento ainda não está sobrecarregado, mas já começou a aumentar desde segunda-feira. E até hoje não participamos de nenhum treino, só recebemos informes e notas técnicas", conta. Ainda segundo o profissional, só os médicos recebem a máscara N95, que é mais efetiva na prevenção da doença. "Recebemos por plantão capote, máscara e gorro, mas a outra só fica com quem atua diretamente nos casos suspeitos e para os médicos", reclama.

Além disso, ele fala que na sala de urgência da unidade faltam ventiladores e o filtros de ar usado em pacientes com quadros respiratórios graves. "Temos quatro leitos sem os equipamentos, que são essenciais", acrescenta. 

Proteção da saúde

O médico e diretor do sindicato, Bruno Pedrosa, alerta que os equipamentos de proteção individuais são cruciais na proteção da saúde, tanto dos profissionais quanto dos pacientes. "Eles evitam que eles adoeçam, transmitam o vírus para seus familiares e desfalquem o atendimento à população", resume. 

Conforme o dirigente, apesar dos profissionais da linha de frente receberem máscaras, luvas e outros equipamentos, as pessoas que atuam no apoio, como nas farmácias, laboratórios, coleta de exames e vacinas, não recebem o material. "É um problema grave e prefeitura desrespeita uma nota técnica da própria Anvisa, que traz recomendações para que esses profissionais também usem os EPIs", disse. E essa situação fez a entidade acionar o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que já determinou a manifestação do Executivo municipal sobre o fornecimento das máscaras cirúrgicas, estoque, aquisições e tempo de uso dos equipamentos.

Rede estadual também confirma casos

Já nos onze hospitais da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), foram confirmados três casos de coronavírus entre os profissionais de saúde: no Hospital João Paulo II, Maternidade Odete Valadares e Instituto Raul Soares – ainda há outros cinco suspeitos que aguardam a finalização dos exames. Em relação à síndrome gripal, que contempla outras doenças respiratórias, foram outros 63 funcionários infectados e afastados. 

A diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sind-Saúde), Neuza Freitas, disse que já solicitou à Fhemig o número de pessoas que deixaram de atuar devido às doenças, mas não teve resposta. "São muitas denúncias e a fundação tenta minimizar os problemas. No Hospital Eduardo de Menezes, por exemplo, falta também equipamento de proteção, como aventais. Só são fornecidos os descartáveis, que não são tão eficientes", disse.

Além disso, há a preocupação com a reposição dos funcionários na já deficitária rede hospitalar. "O governo diz que os hospitais estão preparados para o pico da pandemia, mas na realidade o que vemos é número de trabalhadores reduzidos e falta de equipamentos. E se não fornece, eles vão adoecer amanhã", finaliza.

Outro lado

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde alegou que não foi intimada sobre a decisão judicial. A pasta ainda enfatiza que segue todas as recomendações das notas técnicas elaboradas por especialistas e a rede municipal está abastecida em relação aos equipamentos de proteção individual. "A secretaria mantém as compras para abastecer os estoques das unidades e os fornecedores têm mantido entregas regulares", informa.

Em relação à falta de equipamentos, a secretaria afirmou que a UPA Leste possui três respiradores e, neste momento, apenas um é utilizado. O órgão alega que as capacitações dos profissionais foram iniciadas no início do ano e várias notas técnicas divulgadas com atualização contínua do conhecimento. "Os profissionais da Rede SUS-BH foram sensibilizados e capacitados em relação ao diagnóstico, assistência, monitoramento e tratamento diante de casos suspeitos de Covid-19", informa.

A Fhemig também alegou que as unidades possuem todos os materiais de proteção necessários. "Sabemos que esses itens se encontram em falta no mercado e é necessário que haja um contingenciamento para evitar extravios e o uso indiscriminado, o que acarretará, realmente, em riscos para servidores e pacientes", reconhece. 

Sobre os profissionais afastados, a rede disse que já realizou chamamentos emergenciais  para reforçar o quadro de profissionais da linha de frente. Ainda conforme a fundação, "o servidor que apresentar febre e sinais ou sintomas respiratórios característicos da covid-19 (tosse, falta de ar, coriza, congestão nasal) deverá ser orientado pela chefia imediata a preencher a autodeclaração e a permanecer em quarentena domiciliar por 14 dias e, se necessário, buscar atendimento médico".