Dono de um salão de estética no Centro de Belo Horizonte, Eduardo da Silva, 50, vive seu sonho de mobilidade: hoje, ele reside a poucos quarteirões do trabalho, desce apenas alguns andares para malhar na academia do seu prédio e consegue pesquisar preços em vários supermercados a pé. Ele é uma das 175 mil pessoas que moram sozinhas em BH e ajuda a impulsionar uma tendência ainda tímida na capital, a de apartamentos com até 30 m², planejados para um só morador e vendidos pelas construtoras com o mote da praticidade. Para Eduardo, deu certo: “Por ser pequeno, meu apartamento é prático para limpeza, custos e veio ao encontro dessa praticidade e vida simples que estou buscando. Foi um ganho legal em termos financeiros, minha despesa baixou”, conta.

Em uma década, o número de pessoas que moram sozinhas na capital aumentou 66%, acima da média nacional, que teve uma escalada de 44%, segundo levantamento da startup do ramo imobiliário Quinto Andar, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Hoje, sete a cada cem belo-horizontinos vivem dessa forma. Alguns fatores ajudam a explicar o fenômeno: “A maior parte das pessoas que moram sozinhas no Brasil são idosas e BH tem uma população mais velha que outras capitais. Além disso, as famílias são cada vez menores. Outro fator importante é a vocação universitária da cidade, que também atrai muitos jovens. A construção civil observa esse movimento e constrói apartamentos menores em todo o Brasil. O mercado de BH começa a ver essa transição”, lista o especialista de dados do Quinto Andar, Pedro Capetti.  

Impulsionado por essa tendência, o mercado imobiliário volta os olhos à oferta de apartamentos de até 30 m², que o Quinto Andar chama de microapartamentos, ou um pouco maiores, mas de um só quarto. Hoje, eles ainda são exceção e apenas 2,8% das vendas em 2020, 111 residências em BH, foram de unidades desse tipo, de acordo com o Sindicato da Construção Civil do Estado de Minas Gerais (Sinduscon). Mas o cenário tende a mudar no futuro próximo, avalia o presidente da entidade, Renato Michel.

“Essa tendência vai chegar em Belo Horizonte. Você troca um apartamento maior em uma região periférica por um menor na região central”, pontua. A pandemia acentuou a procura por casas maiores e não necessariamente perto do trabalho dos moradores, em um momento de ascensão do home office e pressão do isolamento social. Por outro lado, para grande parte das pessoas, pontua Michel, o trabalho remoto ficou no passado e a facilidade de deslocamento voltou a ser um desejo. “O mercado oferece opções para atender os mais diversos públicos. O empreendedor busca construir o que está sendo demandado”, conclui ele.

E, hoje, reflete a presidente do braço mineiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU-MG), Edwiges Leal, a demanda em Belo Horizonte aproxima-se um pouco mais do que já se via em São Paulo e no Rio de Janeiro há décadas. “O mineiro sempre foi mais conservador e precisou de quarto, sala, sala de jantar, cozinha.. Desde 30, 40 anos atrás, quando eu estudava arquitetura, via as kitnets, quarto e salas e flats no Rio e em São Paulo. Essa realidade agora vem, como o AirBnB, Uber e todas essas mudanças de estilo de vida, trazer uma nova perspectiva”, diz. Ela destaca a vocação do Centro para a mudança: “Ele foi abandonado há muito anos e, agora, é uma tendência redescobrir os centros”.

30 m², R$ 240 mil: condomínios mais completos e localização são trampolim de preço para apartamentos pequenos

Para atender à demanda de quem mora sozinho, especialmente no Centro de BH, o setor lança mão de uma estratégia de reciclagem: o retrofit. Esse processo de modernização estética e estrutural de um edifício utiliza a “casca” do prédio, mas troca totalmente a estrutura elétrica e hidráulica e empresta um ar contemporâneo ao empreendimento, que geralmente tem academia, lavanderia e outros serviços. Eduardo, do início da reportagem, vive em um dos exemplos mais emblemáticos de retrofit da cidade: o Edifício Excelsior, em frente à praça Rio Branco e à rodoviária. 

A construção de 25 andares dos anos 60 abrigava originalmente um hotel e foi reformada para comportar 152 apartamentos, aproximadamente metade deles com cerca de 30 m² e preço inicial ao redor de R$ 240 mil. Hoje, sua ocupação passa de 90%, segundo a gerente comercial da construtora Diniz Camargos, que conduziu a reforma, Liliana Camargos. “O perfil de moradores é bem variado. Há pais que compram apartamento para os filhos do interior morarem perto da faculdade; há profissionais liberais que trabalham no Centro, como dentistas, médicos e lojistas; e pessoas ativas da terceira idade”, exemplifica.

A construtora também foi responsável pelo retrofit do Chiquito Lopes, na rua São Paulo. Na rua Espírito Santo, o Edifício Pio XII, quase na esquina com a avenida Augusto de Lima, passou pelo mesmo processo. “Os apartamentos menores foram os mais procurados do prédio, pelo baixo valor do ticket, abaixo de R$ 300 mil. A maioria de quem comprou é investidor, que quer fazer uma locação futura”, explica o diretor da Fox Imobiliária, Fabrício Rodrigues.

O presidente do Sinduscon-MG, Renato Michel, completa que a concentração de prédios vagos no Centro da cidade favorece o retrofit. “Há vacância e precisamos criar soluções. Até pelo ponto de vista do meio ambiente é mais barato ‘retrofitar’, porque já se consumiu energia e recursos naturais para construir aquele prédio. É muito mais racional ocupá-lo”, diz.  

Também há unidades novas em folha na região Centro-Sul. Na última semana, a Fox Imobiliária iniciou as vendas de um novo empreendimento na rua dos Tupis, no Barro Preto, perto da esquina com a avenida Bias Fortes, com apartamentos de um quarto anunciados por R$ 264 mil na planta, com previsão de ser inaugurado em 2025. Na mesma rua, outro empreendimento deve ser entregue em 2024, com apartamentos a partir de um quarto e menos de 40 m² de R$ 345 mil.

Os preços desse tipo de empreendimento, justificam os construtores, devem-se tanto à localização central quanto à oferta de serviços dos condomínios — os mais novos costumam ter lavanderia, coworking e outros espaços comuns para além dos tradicionais salões de festa. “Regiões centrais são mais valorizadas. As pessoas hoje querem mais praticidade e apartamentos menores fazem muito sentido”, conclui Renato Michel, do Sinduscon-MG.