Depois da crise na Americanas, que anunciou em janeiro um rombo de R$ 20 bilhões na contabilidade e a saída do presidente Sergio Rial, outras empresas do varejo demonstraram que também estão enfrentando momentos difíceis, como a Marisa e a Livraria Cultura.
Nesta semana, a Marisa também anunciou a renúncia do presidente-executivo Adalberto Pereira Santos e informou que vai contratar uma assessoria para renegociar as dívidas da empresa. A Marisa deve R$ 566 milhões, segundo o último balanço divulgado, do terceiro trimestre de 2022. A dívida cresceu 8% em relação a 2021 devido ao aumento das despesas.
Já a Livraria Cultura teve a falência decretada pela Justiça, nessa quinta-feira (9), após descumprir termos do acordo de recuperação judicial de 2018. Desde esse período, a empresa tenta pagar as dívidas de R$ 285 milhões, mas sem sucesso. A Cultura alega que o interesse por livros caiu por causa da estagnação da economia brasileira, a partir de 2014, e devido à nova geração, que não tem hábito de ler e prefere assistir séries na TV e interagir nas redes sociais.
Mas, afinal, há relação na crise envolvendo estas três empresas do varejo? Sim, segundo o economista especialista em mercado financeiro e renda variável, Gustavo Gomes. “5 anos atrás, a gente tinha um investimento muito alto nas empresas de varejo. Havia uma disponibilidade de capital muito mais fácil. E os juros eram muito menores. De lá pra cá essas dívidas começaram a ser cobradas e, com a alta dos juros, a gente vê que as margens ficaram cada vez mais apertadas. Então essa dívida fica cada vez mais cara e o lucro começa a diminuir”, explica.
Com as empresas em dificuldade financeira, os bancos enxergam maior dificuldade em receber as parcelas das dívidas e evitam renegociar com essas companhias. “É basicamente o que aconteceu com a Marisa. Os bancos estão vendo se tem alguma viabilidade, se a empresa vai realmente conseguir quitar suas dívidas. Eles pegaram alguns empréstimos e isso acaba abalando a confiabilidade dos bancos. E depois do que aconteceu com a Americanas, os bancos estão tomando uma posição defensiva e se protegendo cada vez mais”, explica.
Nesta semana, o Bradesco divulgou o lucro do quarto semestre de 2022, de R$ 1,5 bilhão, com queda de 76% devido a uma provisão extraordinária de R$ 4,9 bilhões para cobrir a exposição de todo o valor emprestado à Americanas, que pediu recuperação judicial na semana passada.
“O Bradesco fez isso porque não tem perspectiva de receber este valor. A Americanas tinha uma classificação muito boa com relação a risco de crédito e foi tudo por água abaixo no começo deste ano. Então, nesse caso, os bancos endurecem o tom não só com a Americanas e a Marisa, mas com todo mundo que tem crédito com eles, né? Para não tomar um tombo maior. E assim começa a apertar de todos os lados”, avalia o economista.
Após o anúncio da renúncia do presidente e a tentativa de renegociação de dívidas, a Marisa viu suas ações despencarem 22% na quinta-feira (9), ficando abaixo de R$ 1 pela primeira vez na história da companhia, que entrou na Bolsa em 2007. Nesta sexta-feira (10), nova queda, desta vez de 7,32%, com os papéis da empresa sendo negociados a R$ 0,76. “No caso da Marisa, pode ser que a empresa já tenha informado aos bancos que vai precisar renegociar algumas linhas de crédito, então isso fez com que o ativo caísse”, diz Gomes.
O caso da Livraria Cultura também se enquadra nesta situação de forte risco de inadimplência, segundo o economista. “Foi algo bem parecido também, visto que a Cultura falou que não conseguiria quitar algumas das suas dívidas. Isto fez com que, primeiro, a empresa perdesse a confiança dos bancos e não conseguisse mais pegar empréstimo, e, segundo, que ela desse calote em alguma parte dessa dívida”, conclui.