Com a promessa de planos mais baratos e diversificação do mercado, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) editou em agosto dois atos normativos que mudam as regras que regem seguros automotivos. O objetivo é flexibilizar produtos oferecidos por seguradoras. A primeira novidade autoriza que as empresas utilizem peças genéricas ou usadas no conserto de veículos, desde que exista previsão no contrato. A segunda permite que empresas ofereçam seguros intermitentes. Dentre outras coisas, essa categoria libera planos conhecidos como “liga e desliga”, que são acionados, por exemplo, quando o veículo está na rua, mas não quando está na garagem.

Esse tipo de serviço permite que seguradoras ofereçam produtos personalizados, possibilitando que, na teoria, valores menores sejam cobrados por coberturas mais básicas ou específicas. A Susep afirma que as medidas visam modernizar o mercado, expandir possibilidades para clientes e seguradoras e adequar os produtos às necessidades do usuário.

Representantes do ramo aprovam. Em nota, a Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg) classificou as mudanças como um avanço. “Abre caminho para a oferta de produtos das mais variadas modalidades, feitos sob medida para atender os consumidores”, diz o texto. Procuradas pela reportagem, três grandes seguradoras não quiseram se manifestar sobre as mudanças no regramento e afirmam que ainda é cedo para fazer projeções do impacto no mercado. As empresas assinalaram que estão estudando novas propostas, mas não informaram prazos para que cheguem ao consumidor.

“É excelente para o mercado e para o cliente”, avalia o professor da Escola Nacional de Seguros José Varanda. Ele diz que a abertura vai possibilitar “uma nova era de seguros populares”. “Pessoas com carros mais antigos ou com menor aporte financeiro poderão contratar os serviços. O mercado vai entrar com tudo em propostas mais baratas”, explica. Varanda acredita que a possibilidade de contratação de seguros intermitentes será útil para pessoas que têm uso específico do veículo. Por exemplo, quem dirige só nos finais de semana poderá optar por planos que cubram apenas esse período.

Revoltada

“As empresas lucram mais a cada ano, na casa dos bilhões, e eu, que sou da classe trabalhadora, com carro financiado, sofro uma batida e preciso aceitar uma peça que não é original?”, questiona a estudante de medicina Luísa Chaves, 23. No ano passado, um motorista bateu em seu carro e acionou o seguro dele para fazer o conserto. Após deixar o veículo com a seguradora, ela foi informada que o prazo seria de uma semana, mas ficou dois meses sem o veículo. Depois, descobriu que uma segunda peça havia sido trocada pela seguradora. “Me senti muito desrespeitada”, lamenta.

Por outro lado, a esperança de preços menores anima alguns consumidores. A corretora de imóveis Henileid Gabriella Martins, 30, conta que, desde comprou seu carro, em 2014, não teve condições de arcar com seguro. Em 2016, um motorista bateu no carro dela e não assumiu os custos. A corretora afirma que, com preços mais baixos, ela contrataria um seguro para evitar situações como essa. “Me sinto desassistida. Todos deveríamos ter seguro, é uma proteção”, conclui.

Não ter apólice é um “risco calculado”

Há seis anos, o doutor em contabilidade e finanças Alexandre Bossi não contrata seguros tradicionais, mas apenas para terceiros – que cobre danos causados a outros veículos. Com isso, ele economizou cerca de R$ 30 mil no período. “Prefiro e correr o risco. Mas ressalto que, no meu caso, é um risco calculado”, explica. Bossi conta que é motorista há 35 anos. Em 2013, percebeu que, por manter sempre os carros em garagens, não fazer longas viagens e nunca ter batido, não valia a pena contratar o serviço.

A única situação que fez o contador repensar a decisão foi quando o carro do filho dele foi roubado, em 2014. Assaltantes levaram o veículo e vários pertences que estavam nele. Apesar disso, a Polícia Militar conseguiu recuperar os bens do contador poucos dias depois. “Reforçou a minha vontade de não fazer o seguro. A chance de roubo é pequena, e a possibilidade de as autoridades encontrarem o veículo é alta”, disse.

“É claro que posso ser roubado novamente, ou bater o carro um dia. Mas, calculando friamente as probabilidades, não vi sentido em continuar pagando. Não sou contra o seguro, mas é algo que varia de pessoa para pessoa”, argumenta. Contudo, Bossi admite que a decisão deve ser analisada caso a caso, e não recomenda abrir mão do seguro. “É uma análise de risco, na verdade. Vale a pena fazer um levantamento de seus hábitos e condições antes de decidir”, aconselha.