Depois de quatro anos convivendo com a crise, um banho de realidade no que se refere ao consumo de supérfluos em Minas Gerais. Pesquisa realizada pelo grupo Mercadológica com exclusividade para O TEMPO, revela que quatro em cada dez entrevistados acham que não voltarão ao padrão de consumo que tinham antes da recessão iniciada em 2014. Além disso, a crise econômica e política foi apontada por 61% dos entrevistados como a razão para este recuo. “O cenário é de incerteza, não vejo em um futuro próximo a recuperação, pois não se trata apenas da economia crescer, mas de como ela vai ser distribuída”, opina a professora de história Valéria Giacchero de Pádua, 44. Para ela, o seu padrão de consumo hoje é pior do que há quatro anos.

Essa também é a sensação de cerca de metade (47,3%) dos entrevistados pelo grupo Mercadológica. “Isso é uma resposta a pior recessão econômica vivida pelo Brasil, seguida de um ano ruim como 2018. Não tivemos o crescimento esperado e isso impacta a renda, dando a sensação de que o consumidor não vai conseguir retornar à capacidade de compra”, diz o economista e coordenador do curso de administração do Ibmec-BH, Eduardo Coutinho. 

Diante do desânimo com a situação econômica e política do Brasil, a terapeuta ocupacional Cristiane Luísa Renger, 42, decidiu deixar o país no início de 2019. “Somos quatro irmãos e sou a única que ainda está no Brasil, pois temos cidadania alemã”, conta. “Não vejo, para os próximos 20 anos, uma melhora significativa. Por isso, estou indo para a Alemanha”, acrescenta Cristiane. 

A falta de perspectiva no longo prazo afeta a confiança do consumidor. “Depois da recessão, mesmo quando os índices econômicos melhoram, até as pessoas acreditarem que já é possível voltar a consumir, demora”, afirma a professora de estratégia e marketing da Fundação Dom Cabral, Luciana Faluba. O Indicador de Confiança do Consumidor da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) de julho aponta que 84% dos consumidores acreditam que o cenário atual se mantém ruim ou muito ruim.

A psicóloga Ludmila Cioffi, 30, afirma que sente essa insegurança. “Como autônoma, vi minha renda cair porque muitas pessoas cortam a terapia no momento de crise. Minha televisão quebrou há dois anos e não comprei outra, queria trocar a minha cama e estou adiando”, conta. “Outra decisão que tomei foi vender o carro. Com opções de mobilidade como os aplicativos de transporte, não vejo porquê mantê-lo, diante dos gastos com IPVA, seguro e gasolina”, diz.

Novo padrão. A crise também traz novos padrões de consumo, de acordo com Luciana Faluba. “Depois que a pessoa se acostuma e experimenta alternativas que solucionam sua vida, o padrão não volta”, avalia. Ela explica que o consumo discricionário, feito com o dinheiro que sobra depois das contas fixas pagas, é o mais impactado. “Isso afeta as empresas porque após passada a crise, elas tem que enfrentar uma nova relação com as compras. Precisarão se reinventar para reconquistar o cliente”, completa.

É o que está acontecendo com a desenhista Mariana Lapouble, 33. “(Cortamos) maquiagem, passeios, cinema, sair com as amigas. Criamos um lema: se pode continuar sua vida sem isso, então não é necessário”, diz.

Mariana perdeu o emprego há quatro anos e seu marido, que é pequeno empresário, sustenta a família.