Há 10 anos, o Centro Cultural Banco do Brasil de Belo Horizonte (CCBB BH) abria suas portas pela primeira vez com a missão de repetir a bem sucedida experiência já vivida em outras praças – Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Uma aposta que, sem dúvida, deu certo. Afinal, desde aquele 27 de agosto de 2013, o espaço foi ganhando cada vez mais reconhecimento até se tornar um dos principais equipamentos culturais da capital mineira e destino certo, sobretudom das artes visuais, cênicas e da música que, ano a ano, reafirma sua vocação para uma programação diversificada, plural e acessível a um público igualmente diverso.
É o que se pode verificar diante dos expressivos números colhidos nessa primeira década em atividade, período em que o lugar – que integra desde seu nascimento o Circuito Liberdade, complexo cultural que reúne diversos espaços com as mais variadas formas de manifestação de arte e cultura em transversalidade com o turismo – realizou 457 projetos, atraiu um público superior a 7 milhões de visitantes e já figurou na lista dos museus mais visitados do mundo pela revista britânica “The Art Newspaper”.
“O CCBB BH, como instituição, aprendeu muito com a produção cultural local, estabelecendo esse diálogo com produtores e com a classe artística local, e, simultaneamente, conseguiu trazer coisas que estão acontecendo no mundo, linguagens e inovação para o público belo-horizontino. Além disso, temos um importante legado de formação de público, de ter uma diversidade de programação gratuita (não há cobrança de ingressos para as exposições de artes visuais) ou a preços acessíveis (a meia entrada para peças de teatro saem, atualmente, a R$ 15)”, avalia Gislane Tanaka, gerente geral do equipamento, ao falar sobre os principais legados deixados pela instituição até aqui.
“Eu, como belo-horizontina, tenho orgulho de ter um CCBB na minha cidade e, como gestora, tenho muito orgulho do que podemos oferecer para o público belo-horizontino”, complementa. Ao mesmo tempo que celebra os tantos feitos acumulados nesses 10 anos de história, Gislane tem sobriedade de reconhecer que o equipamento tem uma série de desafios pela frente – e um deles se arrasta desde antes da fundação do CCBB BH.
Estamos falando do desejo da realização de reformas que possibilitem o uso integral do prédio, que possui aproximadamente 8.000 m², mas ainda tem dois andares inativados. Ocorre que, instalado em uma construção histórica, projetada em meados de 1920 por Luiz Signorelli – que preserva a estética requintada do estilo neoclássico, característica das grandes edificações nas primeiras décadas de 1900 –, o lugar, antes do CCBB BH, já sediou a Secretaria do Interior do Estado de Minas Gerais e, posteriormente, a Secretaria de Estado de Segurança Pública de Minas Gerais e a Procuradoria Geral do Estado.
Heranças desse passado podem ser notadas no quarto e quinto pavimento do edifício, que não foram reformados e, por isso, permanecem sem uso. Tais áreas, visitadas no último 16 de agosto pela reportagem de O TEMPO, primeiro veículo de imprensa a circular nestes espaços, apresentam uma estrutura típica dos departamentos públicos do século passado, com pequenas salas que destoam dos andares modificados para receber amplas galerias.
Outra diferença para os pisos atualmente em uso – além da deterioração e de uma estética opressiva, com uso de gradis – é a presença de varandas e sacadas com vista para a praça da Liberdade e para o Edifício Niemeyer, no bairro Funcionários, Região Centro-Sul de BH.
“Essa ampliação sempre esteve no radar dos gestores da instituição. Mas a gente tem muitos desafios para fazer isso com o centro cultural funcionando, pois estamos falando de uma obra de reforma, restauro e adaptação do espaço muito complexa”, pondera Gislane, admitindo não haver, ainda, nenhuma previsão de quando esse projeto pode efetivamente sair do papel – “embora a gente já tenha estudos de como isso poderia acontecer e do que a gente gostaria de ter nesses dois andares”.
“Esta é, talvez, a missão que temos para esses próximos 10 anos”, reconhece a gerente, emendando que, hoje, o equipamento conta com aproximadamente 1.200 m² de galeria, o que inclui todo o terceiro andar, além de outros dois espaços expositivos no térreo. “Temos também dois teatros, sendo uma sala multiuso e um teatro de palco italiano com 260 lugares, além do pátio, que é nossa área de convivência, com cafés, e que também recebe atrações em um esquema de ocupações dinâmico. Recentemente, temos explorado também a ocupação de áreas laterais antes eram usadas apenas como estacionamento – realizamos nossa festa junina nesse espaço, por exemplo”, informa, dando testemunho do esforço de aproveitamento do prédio em sua integralidade.
Para todos
Outro desafio destacado por Gislane Tanaka é enfrentado por outras diversas entidades museológicas, que costumam ser associadas ao elitismo: a formação de público e a integração desses espaços com a comunidade. “Eu noto que a gente avançou tanto no sentido de estar mais disponível para novas formas de produção e linguagens quanto em relação a estabelecer diálogo com a população. Mas, apesar disso, entendo que esta não é uma meta já alcançada, sendo motivo de preocupação constante para nós”, assinala.
“Uma das estratégias a que recorremos nesse sentido é apostar na diversidade, pois sabemos que cada linguagem que trabalhamos nos conecta com um público diferente. E isso é o que a gente mais quer”, acrescenta. A gestora ainda cita outra característica que contribui para o lugar ser encarado pelos visitantes como um espaço acolhedor: “Se cada CCBB tem a sua personalidade, o de Belo Horizonte não é diferente. Eu percebo, por exemplo, que a nossa recepção é realmente especial, marcada por essa hospitalidade mineira, que não é um folclore: para nós, de fato, é muito caro receber bem os visitantes”, opina.
E a receptividade não é a única característica marcante do CCBB BH, avalia Gislane. “Além disso, outra coisa muito nossa vem de uma aposta feita lá no início: as sessões de peças teatrais nas segundas-feiras, um dia em que normalmente todos os museus estão fechados e nós, na contramão, seguimos funcionando”, relata, pontuando que nessas datas as salas costumam sempre ficar cheias. A gerente comenta que, por se tratar de uma experiência bem-sucedida, esse modelo de programação começa agora a ser incorporado por outras instituições de arte país afora.
Ponte
Para Gislane Tanaka, o equipamento cultural vem trilhando o caminho certo no sentido de cumprir com aquilo que está no cerne de sua missão: ser uma ponte entre Belo Horizonte e o mundo.
“O próprio Studio Drift (exposição inaugurada exatamente no aniversário do CCBB BH) é formado por uma dupla de artistas holandeses. Imediatamente antes dessa mostra, tivemos uma dedicada à obra do brasileiro Candido Portinari (1903-1962). Além destes, no passado já trouxemos nomes de destaque de diferentes vertentes das artes visuais, como Jean-Michel Basquiat (1960-1988), Wassily Kandinsky (1866-1944) e Piet Mondrian (1872-1944) – nomes de referência que já ganharam exposições em importantes equipamentos culturais no mundo inteiro e que, na impossibilidade de você viajar para o exterior, onde a maioria das mostras são pagas, a gente traz eles para BH e permite que a população desfrute desse contato gratuitamente”, pontua.
“Ao mesmo tempo, a gente se preocupa com essa conexão com a produção local, mantendo diálogo com a cidade, com o Estado, e levando esses trabalhos para outros territórios”, assegura, dizendo que, para a instituição, o mundo ideal é ser essa ponte que conecta Belo Horizonte com o mundo e conecta o mundo com Belo Horizonte.