Frutas em conserva, transformadas em compotas e doces em calda, são uma cultura interiorana que representa parte de uma história de tradições da cozinha mineira. Amostras dessas preciosidades podem ser contempladas em qualquer loja em Tiradentes, cidadezinha histórica mineira, a 200 km de Belo Horizonte, que recebeu pela segunda vez a Feira Literária de Tiradentes (Fliti), que encerrou suas atividades neste domingo (17). Com doceiros tradicionais e produção de queijos artesanais, esses insumos são comuns em menus de sobremesas pelos restaurantes da cidade. Mas com um detalhe: os ingredientes são transformados pelos chefs, com técnicas apuradas que exaltam ainda mais a cultura doceira da região. 

Durante o Fartura Tiradentes, um dos mais importantes festivais de gastronomia do país, que aconteceu no mês passado, o chef Ricardo Martins, do restaurante Uaithai, cozinhou ao lado de Paulo Shin, chef do restaurante Komah. No menu, a sobremesa ganhou destaque. As referências da gastronomia do Sudeste Asiático foram mescladas com a cozinha mineira com a valorização de produtos locais na sobremesa feita com arroz de jasmim sobre melaço de cana e com mangaba produzida na casa. O doce é finalizado com flor de sal, lascas de coco e coentro – e acabou ficando fixo no cardápio. 

“A minha cozinha retrata o que acontece no mundo, que é uma globalização total, mas sem perder essa nossa essência. É sobre a modernidade da cozinha, mas sem perder a nossa mineiridade”, disse Ricardo Martins. 
Já no restaurante Ora, o chef Felipe Oliveira usa a goiabada cascão, do distrito de Bichinho, bem pastosa com a textura certa para criar um crème brûlée, uma das sobremesas mais contempladas na França. Para finalizar, a casquinha crocante é obtida com boas camadas de queijo canastra. 
“Meus pratos são produzidos com técnicas francesas, mas sempre uso produtos da região, para fomentar economicamente a cidade de Tiradentes também”, explica. 

LOCAL. Em BH, Thiago Medrado, chef do restaurante Noca, sempre produz compotas de frutas na casa, para serem usadas nas sobremesas que também obedecem à sazonalidade. Uma musse de chocolate já ganhou presença na compota de limão, e o semifreddo – sobremesa gelada tradicional na Itália, feita à base de creme – é servido com compota de laranja. 

“Trabalhamos com ingredientes orgânicos e agroecológicos aqui no restaurante e os utilizamos de diversas maneiras. Uma forma de valorizar sem perder é fazendo as compotas. Com as laranjas, por exemplo, fazemos suco, a assamos na brasa e, com o que poderia se perder, fizemos as compotas para aproveitar sem desperdiçar”, explicou o chef. 

No Mocca Coffee and Meals, o tradicional doce de leite de Viçosa, cidade da Zona da Mata mineira – que desde 1980 é reconhecido como um dos melhores do Estado – foi a base da sobremesa idealizada pelo chef Bruno Marques. “É um doce bem concentrado, saboroso e com pouco açúcar, ideal para o preparo de novas receitas”, disse ele, que criou uma panacota com calda de queijo canastra – combinação até clássica para os mineiros, mas com uma nova textura ao paladar.