Imbróglio

Fiemg desiste de acordo para fazer a gestão da Sala Minas Gerais

Reportagem teve acesso a documento no qual o presidente da Fiemg comunica à Codemig o encerramento do contrato

Por Laura Maria e Alex Bessas
Publicado em 16 de abril de 2024 | 13:44
 
 
Sala Minas Gerais durante apresentação da Filarmônica Foto: Eugênio Sávio/Divulgação

A Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) anunciou que desistiu do acordo de cooperação técnica com a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig) para a gestão conjunta da Sala Minas Gerais, sede da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, e do Espaço Mineraria. O documento foi enviado à Codemig nessa terça-feira (16) e assinado pelo presidente da federação, Flávio Roscoe.

Em conversa com O TEMPO, Roscoe disse que desistiu da manutenção do acordo devido a “acusações infundadas” e que o espaço “perde uma ótima oportunidade.” “A Fiemg entrou nesse acordo para ajudar, tanto o governo, quanto a Filarmônica e a própria sociedade. Mas eu não fui ouvido em nenhum momento. Nosso objetivo era reduzir os custos da Filarmônica, mas nossa ação foi totalmente desvirtuada. Se eles não querem, então, não podemos fazer nada”, comentou.

O presidente falou do caso também na abertura do Minas Trend, que começa a partir desta terça-feira (16), no Minascentro. Assista:

Desde quando se tornou público, no dia 5 deste mês, o acordo tem sido alvo de polêmicas. Na última quinta-feira (11), durante concerto da Filarmônica de Minas Gerais, realizado na Sala Minas Gerais, o público protestou contra o acordo. Também na semana passada, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) de Minas Gerais havia recomendado a suspensão dos efeitos da cessão da Sala de Concertos Minas Gerais e do Espaço Mineiraria.

Segundo Roscoe, a federação não desistiu do acordo devido às pressões sofridas. “A FIEMG é pressionada o tempo todo, não é uma questão de ceder às pressões. Nós estávamos tentando ajudar, mas, se eles não querem ajuda, que se virem, então. Nosso interesse é ajudar à sociedade”, indica.

O documento de distrato a que a reportagem teve acesso expõe que “o instrumento de parceria firmado entre o SESI/MG e a Codemig (...) deverá ser encerrado no prazo de 30 dias a contar da data desta notificação.” De acordo com o presidente da Fiemg, isso significa que, caso o Instituto Cultural Filarmônica queira retomar as tratativas, tem esse prazo para contestar a desistência. “Na situação que está, não podemos seguir com esse contrato. Mas caso a Filarmônica queira retomar esse contato, tem esse tempo”, disse Roscoe.

Governo de Minas diz buscar soluções

No fim da tarde, o Governo de Minas emitiu uma nota se posicionando sobre mais um desdobramento do imbróglio envolvendo a concessão da Sala Minas Gerais ao Sesi Minas.

"Em busca de uma solução para que a Sala Minas Gerais e a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais possam, de maneira sustentável, ofertar uma programação cada vez melhor aos mineiros, o Governo de Minas iniciou, nesta terça-feira (16/4), conversas com o Conselho de Administração do Instituto Cultural Filarmônica (ICF)", registra.

"O Governo do Estado vai trabalhar para que a Orquestra Filarmônica e a Sala Minas Gerais exerçam todo o seu potencial de fomento à cultura, com sustentabilidade financeira e qualidade técnica", prossegue a nota, que ainda externa agradecimentos ao presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, e à própria Fiemg e ao Sesi, "pela proposta apresentada, acreditando na boa fé e na intenção de auxiliar o Estado para alcançar uma solução para a Sala Minas Gerais".

Filarmônica afirma que não foi notificada

A reportagem entrou em contato com Filarmônica, e esta informou que ainda não foi notificada da decisão. Na última quinta-feira, o diretor artístico e regente titular desde a fundação da orquestra, Fabio Mechetti, discursou contra a possibilidade da gestão do SESI sobre a Sala Minas Gerais pelos próximos cinco anos. 

Antes do início da apresentação, o público já se manifestava na Sala Minas Gerais, aplaudindo de pé, por quase dois minutos, os músicos da orquestra no momento em que eles ocuparam seus lugares no palco. Quando parte dos presentes entoaram gritos "Fora, Zema", Fabio Mechetti contemporizou: "Não precisamos disso". Na sequência, iniciou seu discurso em que, mais de uma vez, repetiu que "uma sede não se cede", pedindo desculpas. "Eu não gosto de falas antes de concertos, porque acho que a música tem que falar mais alto", afirmou.

O maestro assegurou que as notícias veiculadas recentemente e as naturais repercussões que se seguiram causaram uma grande consternação à Filarmônica – "e àqueles que entendem sua relevância e responsabilidade cultural".”Não vale a pena entrar aqui em detalhes do Acordo em si ou da maneira como o processo foi conduzido. Também não vale a pena responder, uma a uma, às diferentes narrativas que estão sendo veiculadas na imprensa e nas redes sociais. Mas, basta dizer que o acordo, do qual não somos partícipes ou signatários, manifesta uma atitude mal concebida, desnecessária e, acima de tudo, desrespeitosa. Nós, que estamos envolvidos com esse projeto desde sua criação, não compartilhamos dos argumentos oferecidos como justificativa", argumentou o maestro, para, em seguida, responder a falas de representantes das entidades envolvidas no acordo, que a Filarmônica diz desconhecer.

"Nós é que pedimos para devolver a Sala? Quem em sã consciência devolveria algo que tanto lutou para ter? A troco de quê, concordaríamos em entregar a Sala a uma outra instituição para sermos subservientes a ela? Uma Sede não se cede", disse, sendo aplaudido.

Mechetti lembrou que foi dito que o custo de manutenção da Sala é acima de R$ 4,5 milhões. “Isso é verdade. O que não foi comunicado na ocasião é o fato de que é o ICF quem paga esse custo, tendo que captar esses recursos na iniciativa privada. Portanto, do ponto de vista financeiro, a CODEMGE não sofre prejuízo nenhum com o atual arranjo com o ICF”, assegurou. 

"As partes signatárias do tal Acordo desconhecem que a Filarmônica utiliza a Sala uma média de 270 dias ao ano. Para cada concerto, como o desta noite, são necessários 5, 6 ensaios. Nada acontece por mágica assim que o maestro começa a agitar sua varinha de condão. Seria o mesmo que assumir que um time de futebol profissional que joga geralmente quartas e domingos, deixam seus jogadores ociosos no resto da semana. Parecem desconhecer que além de concertos de Assinatura temos atividades educacionais, didáticas, concertos de câmara, concertos e atividades da nossa Academia e a locação do espaço para outras apresentações. Só neste ano serão mais de 300 dias de utilização. Parecem também desconhecer que um equipamento como esse, carece de períodos de manutenção: manutenção esta que vem sendo paga não pelo proprietário do prédio, mas pelo ICF", complementou.

Na ocasião, o diretor da Filarmônica ainda sugeriu que há outras maneiras de a Fiemg apoiar o projeto. "Se a real vontade da FIEMG, expressa pelo seu presidente em declarações à imprensa, é simplesmente ajudar o governo e a cultura do estado, que o faça, não abrindo o espaço para que se transforme num salão de eventos, mas que abra as portas, com a força e influência que exerce entre as indústrias mineiras, para que mais delas passem a ser apoiadoras, patrocinadoras, parceiras deste projeto vencedor que é a Filarmônica. Esse tipo de colaboração da FIEMG seria visto como um ato visionário, efetivo e cidadão, trazendo não a desconfiança, mas a gratidão de toda a sociedade", avaliou.

Feita sob medida

No discurso, Fabio Mechetti ainda lembrou que a Sala Minas Gerais "não para ser mais uma sala de uso múltiplo como já temos na cidade, mas para ser a melhor sala de concertos do Brasil". "A Sala Minas Gerais foi criada para ser a Sede da Orquestra Filarmônica, como atestam documentos oficiais da própria Codemig publicados em 2011", lembrou, asseverando que cada item usado na construção do prédio foi escolhido tecnicamente para conferir ao lugar o status que ele hoje possui.

"Recentemente a Sala da Filarmônica de Nova York, o David Geffen Hall, passou por uma significante reforma acústica e contratou exatamente a mesma equipe de engenheiros acústicos que desenhou a Sala Minas Gerais. Ela é uma das únicas salas, no Brasil e na América Latina, especificamente planejada para a execução de concertos sinfônicos. O desenho acústico e arquitetônico que aqui temos foi propositadamente concebido para garantir as melhores condições acústicas", destacou.

"Juntos, Filarmônica e Sala se consolidaram ao longo dos anos como o maior e mais bem-sucedido projeto sinfônico da América Latina neste século. Uma relação baseada no comprometimento com a qualidade, integridade, ética e missão. É um tanto estranho termos que defender esse arranjo tão recorrente, é óbvio que é a relação de uma orquestra com sua Sala", ponderou, enumerando exemplos de salas pertencentes a orquestras em todo o mundo.

"Para citar apenas um exemplo mais próximo, mas igualmente relevante, a OSESP e Sala São Paulo. Em nenhuma dessas salas vê-se uma administração desvinculada da sua missão essencial, onde os interesses de suas orquestras e da cultura de seus respectivos centros não sejam incorporados e o respeito pelo patrimônio não seja prioridade", apontou.

Leia a íntegra do discurso de Fabio Mechetti, diretor artístico e regente da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais:

"Uma Sede não se cede

A Filarmônica celebrou seus 15 anos no ano passado. Mais do que um aniversário, tal efeméride representou a culminação de um trabalho de construção contínuo, exitoso, do qual todos nós podemos nos orgulhar. Foi premissa para sua criação conferir a Minas Gerais e ao Brasil não apenas mais uma orquestra, mas um projeto de excelência, diferenciado pela sua missão artística amparada por um modelo de gestão garantidor de seu sucesso. 15 anos depois não há dúvidas quanto ao fato de que a Filarmônica está entre as grandes orquestras brasileiras e sul-americanas, que se consolida a cada concerto pela sua qualidade artística, pelo investimento na formação de público e futuros músicos, no fomento à criação artística e difusão da música de concerto local, estadual (através de seus concertos nas praças e no interior do estado), nacional e internacional, graças às nossas gravações, turnês e transmissões. 

Parte crucial deste processo foi o feliz entendimento por parte do governo de que, para consolidar sua prodigiosa trajetória e para posicionar Belo Horizonte e Minas Gerais como polo nacional e internacional da música e da cultura, era necessário que uma Sala fosse adicionada a esse projeto. Não fosse a Filarmônica e o impacto de seu sucesso em seus primeiros anos de vida, a Sala Minas Gerais não existiria.

Ela foi concebida com o mesmo pensamento que definiu a formação da Filarmônica, não para ser mais uma sala de uso múltiplo como já temos na cidade, mas para ser a melhor sala de concertos do Brasil. A Sala Minas Gerais foi criada para ser a Sede da Orquestra Filarmônica, como atestam documentos oficiais da própria Codemig publicados em 2011 em que diz:

 “Uma orquestra, uma sede de TV e rádio, que são espaços acusticamente sensíveis, sem uma sede apropriada, com condições notáveis de escuta musical, tem condições muito limitadas de crescimento. O complexo que incorpora as sedes da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, da Rádio Inconfidência e Rede Minas, constitui uma importantíssima reversão neste quadro, trazendo para Minas e o Brasil uma posição de destaque no Continente”.  (processo 420/11).

Essa preocupação original, que deu início ao projeto do Centro de Cultura Presidente Itamar Franco, privilegiou a qualidade e a competência na escolha de profissionais de grande reconhecimento, tanto no Brasil como no exterior. Cada item de sua construção foi escolhido tecnicamente para conferir a ela o status que possui. Recentemente a Sala da Filarmônica de Nova York, o David Geffen Hall, passou por uma significante reforma acústica e contratou exatamente a mesma equipe de engenheiros acústicos que desenhou a Sala Minas Gerais. Ela é uma das únicas salas, no Brasil e na América Latina, especificamente planejada para a execução de concertos sinfônicos. O desenho acústico e arquitetônico que aqui temos foi propositadamente concebido para garantir as melhores condições acústicas: as velas laterais, o teto móvel, as paredes côncavas e convexas que a circundam, o tecido das poltronas, etc. Todos esses detalhes foram determinados carinhosamente para garantir sua qualidade e honrar o investimento financeiro e político do estado de Minas Gerais num projeto desta envergadura. Sua missão foi sempre a de ser uma sala dedicada à realização de concertos sinfônicos, recitais e apresentações de música de câmara, não uma casa de shows ou espaço para eventos de outra natureza. Para isso, já existiam e continuam a existir outros espaços em Belo Horizonte, até melhor equipados do que a própria Sala Minas Gerais.

Juntos, Filarmônica e Sala se consolidaram ao longo dos anos como o maior e mais bem-sucedido projeto sinfônico da América Latina neste século. Uma relação baseada no comprometimento com a qualidade, integridade, ética e missão. É um tanto estranho termos que defender esse arranjo tão recorrente e óbvio que é a relação de uma orquestra com sua Sala. Filarmônica de Viena e a Musikverein, Filarmônica de Berlim e a Philarmonie, Amsterdam e Concertgebow, Leipzig e Gewandhaus. E, para citar apenas um exemplo mais próximo, mas igualmente relevante, a OSESP e Sala São Paulo. Em nenhuma dessas salas vê-se uma administração desvinculada da sua missão essencial, onde os interesses de suas orquestras e da cultura de seus respectivos centros não sejam incorporados e o respeito pelo patrimônio não seja prioridade. Ao completar 25 anos neste ano, a SSP recebeu de presente o tombamento definitivo pelo IPHAN. A SMG, prestes a completar 10 anos no ano que vem, poderia esperar algo semelhante?

Há algumas semanas, pisou neste palco um dos maiores violinistas da atualidade, Vadim Gluzman. Vadim toca num Stradivarius, instrumento avaliado em milhões de dólares. Como é que um músico consegue investir milhões de dólares num instrumento? Obviamente nenhum deles, com raríssimas exceções, são donos de seus preciosos instrumentos. Em geral, eles pertencem a investidores, bancos, mecenas, alguns colecionadores milionários. Entretanto, esses investidores, confiam a guarda e o bom uso de seus instrumentos a solistas de renome que os tratam com o maior carinho, responsabilidade, apuro e amor, dando a eles o destino para o qual foram concebidos. Nenhum desses investidores confiaria a guarda e a manutenção desses instrumentos a um carpinteiro, por mais qualificado que fosse, sem o devido aprimoramento técnico. Por que falo isso? Porque a Sala Minas Gerais é um Stradivarius, um instrumento único, valioso, frágil, de qualidade ímpar como poucos no Brasil e no mundo. Sua guarda deve ser feita por aqueles que demonstram o mesmo carinho, competência, responsabilidade, apuro e amor que artistas conferem aos seus instrumentos.

As notícias veiculadas recentemente e as naturais repercussões que se seguiram causaram uma grande consternação à Filarmônica e àqueles que entendem sua relevância e responsabilidade cultural. Não vale a pena entrar aqui em detalhes do Acordo em si ou da maneira como o processo foi conduzido. Também não vale a pena responder, uma a uma, às diferentes narrativas que estão sendo veiculadas na imprensa e nas redes sociais. Mas, basta dizer que o acordo, do qual não somos partícipes ou signatários, manifesta uma atitude mal concebida, desnecessária e, acima de tudo, desrespeitosa. Nós, que estamos envolvidos com esse projeto desde sua criação, não compartilhamos dos argumentos oferecidos como justificativa. São eles:

Nós é que pedimos para devolver a Sala? Quem em sã consciência devolveria algo que tanto lutou para ter? A troco de quê, concordaríamos em entregar a Sala a uma outra instituição para sermos subservientes a ela? Uma Sede não se cede.

Em coletiva de imprensa realizada na semana passada foi dito que o custo de manutenção da Sala é acima de R$ 4,5 milhões. Isso é verdade. O que não foi comunicado na ocasião é o fato de que é o ICF quem paga esse custo, tendo que captar esses recursos na iniciativa privada. Portanto, do ponto de vista financeiro, a CODEMGE não sofre prejuízo nenhum com o atual arranjo com o ICF. 

As partes signatárias do tal Acordo desconhecem que a Filarmônica utiliza a Sala uma média de 270 dias ao ano. Para cada concerto, como o desta noite, são necessários 5, 6 ensaios. Nada acontece por mágica assim que o maestro começa a agitar sua varinha de condão. Seria o mesmo que assumir que um time de futebol profissional que joga geralmente quartas e domingos, deixam seus jogadores ociosos no resto da semana. Parecem desconhecer que além de concertos de Assinatura temos atividades educacionais, didáticas, concertos de câmara, concertos e atividades da nossa Academia e a locação do espaço para outras apresentações. Só neste ano serão mais de 300 dias de utilização. Parecem também desconhecer que um equipamento como esse, carece de períodos de manutenção: manutenção esta que vem sendo paga não pelo proprietário do prédio, mas pelo ICF.

Como afirmei anteriormente, a SMG não existiria não fosse a Filarmônica, e seu uso é, por definição e mérito, prioridade da Orquestra. Mas ela nunca foi pensada para ser de uso exclusivo da Orquestra. Isso não existe e nunca existiu. Essa visão não só é equivocada, mas vai de encontro às próprias necessidades da Orquestra, cujos recursos arrecadados por contratos com terceiros ajudam em sua sustentabilidade.

Sim, este prédio é um ativo da CODEMGE. Todo prédio, por mais grandioso que seja, é apenas um corpo sólido, estático.  Mas, quando o aço frio de uma estrutura é transfigurado pela chama ardente da criação artística, no nosso caso específico: a música, ele deixa de ser um ativo. Este corpo adquire alma e, com esse intangível, mas inegável valor agregado, torna-se patrimônio imaterial pertencente a toda sociedade. É na qualidade e constância dessa produção contínua e incomparável realizada aqui toda a semana que ele transcende seu status imobiliário e adquire relevância cultural. E assim, como patrimônio que é, a Sala Minas Gerais não pode ser tratada com desrespeito, descaso e desvio de sua finalidade essencial. Sua custódia deve ser honrada àqueles que vem demonstrando competência, seriedade, amor e responsabilidade com a coisa pública.

Independente das versões de um lado ou de outro e dos acirramentos que isso infelizmente traz, o que afinal queremos? O certo. Martin Luther King disse: Nunca é a hora errada para se fazer a coisa certa. Não podemos deixar que esta seja a hora certa para se fazer a coisa errada. O certo sempre deveria ser legal. O certo é o diálogo e não subterfúgios. O certo é a transparência das ações e não artimanhas sub-reptícias. O certo é confirmar, antes da celebração dos 10 anos dessa maravilhosa Sala, sua vocação de Sede da Filarmônica e uma Casa aberta a todos que compartilham da alegria de poderem se utilizar dela como fonte de cultura e símbolo de orgulho de todos os mineiros. Uma Sede não se cede. Queremos que nos deixem trabalhar e nos incentivem a continuar a realizar nosso papel enquanto instituição produtora de cultura. Queremos educar. Queremos enriquecer a vida das pessoas. Queremos continuar a dar orgulho a Minas Gerais. 

Se a real vontade da FIEMG, expressa pelo seu presidente em declarações à imprensa, é simplesmente ajudar o governo e a cultura do estado, que o faça, não abrindo o espaço para que se transforme num salão de eventos, mas que abra as portas, com a força e influência que exerce entre as indústrias mineiras, para que mais delas passem a ser apoiadoras, patrocinadoras, parceiras deste projeto vencedor que é a Filarmônica. Esse tipo de colaboração da FIEMG seria visto como um ato visionário, efetivo e cidadão, trazendo não a desconfiança, mas a gratidão de toda a sociedade. Enfim, queremos somar e não dividir. 

E a nossa Orquestra? Grupo extraordinário de verdadeiros servidores da Cultura em nosso estado e vítimas inocentes das artimanhas ardilosas que visam não o bem da Filarmônica, como sugerem os signatários desse acordo, mas enfraquecer o projeto a ponto de o tornar insustentável. Por que é tão difícil para aqueles que realizam um trabalho de excelência, não só nós, mas várias outras organizações culturais no Brasil, fazer entender aos órgãos públicos a dimensão do que fazemos e os resultados positivos que isto traz à saúde da sociedade e à imagem do estado e do país? A excelência não se dá por acaso ou insistência. Se dá pelo trabalho abnegado, dedicado, competente, exemplar que nossos músicos trazem ao palco, semana após semana. Ao invés de minarem nossa habilidade de prosperar, governo e iniciativa privada deveriam investir ainda mais naquilo que comprovadamente dá certo, construindo assim um legado comum em benefício da sociedade como um todo.

Eu tive o privilégio de estudar com um dos maiores músicos do século XX: Leonard Bernstein (aquele do filme Maestro). Na ocasião do assassinato de John F. Kennedy, ele realizou um concerto com a Filarmônica de Nova York, executando a Segunda Sinfonia de Mahler, no qual disse: “Como músicos, esta será nossa resposta à violência: fazer música mais intensamente, mais lindamente e mais devotadamente do que nunca o fizemos antes.” Creio ser esse o verdadeiro papel das artes e da cultura no processo civilizatório da humanidade, e isso é o que continuaremos a fazer.

Enfim, Filarmônica e Sala são irmãs que carregam o mesmo sobrenome, unidas por Minas Gerais. Uma Sede não se cede. Vida longa à Nossa Filarmônica. Vida longa à Nossa Sala Minas Gerais!"