Música

A força delicada de Ceumar 

Cantora mineira radicada em Amsterdã apresenta canções de seu sexto disco, “Silencia, em dois shows nesta quarta

Por Luciana Romagnolli
Publicado em 20 de agosto de 2014 | 03:00
 
 
Dois. Cantora criou disco com violoncelista francês Vincent Ségal, que a acompanha no show da noite e propôs som popular camerístico TiÊ Coelho TodÃo/divulgação

“O que esse silêncio tem a dizer? Fico sozinho, fico calado pra perceber”, canta Ceumar em meio a uma melodia rarefeita delineada pelo violoncelo em “Silencia”. A canção encerra o disco homônimo da cantora mineira, base para os dois shows que ela realiza nesta quarta em Belo Horizonte.

À luz do sol, Ceumar faz uma apresentação solo no projeto Quarta Doze e Trinta, no Campus Pampulha da UFMG. À noite, sobe ao palco do Teatro Bradesco, às 21h, acompanhada do violoncelista francês Vincent Ségal, seu parceiro na direção musical deste sexto álbum, e de sua banda.

A ideia de silêncio não foi ponto de partida do disco, mas ao fim do processo, revelou-se como caminho trilhado. “Foi uma coisa bem intuitiva”, diz Ceumar, com a fala mansa. “Já era uma busca pessoal de silenciar um pouco em vários momentos da vida. Por que não na minha música? Eu percebia um cansaço de tanto barulho, tanta guerra. Para mim, o silêncio revela soluções, através da meditação, das orações. Mesmo que seja uma coisa mais interna e profunda do que sair gritando e querendo resolver os problemas do mundo”.

A crítica compreende redes sociais como o Facebook, mas vai além. “Eu me utilizo bastante dessa ferramenta, fiz muitos contatos com parceiros para o CD, mas vejo pessoas se expressando de maneira que parece uma fuga. Tenho cuidado de não extrapolar. Mas também (vejo isso) na TV, nos meios de comunicação em geral. Acredito que, quando você não tem uma solução para as coisas, o certo é viver a sua aldeia. Olhar para o seu vizinho primeiro, para depois expandir”.

Na sonoridade de “Silencia”, essas questões se transfiguram em uma vontade camerística. “Convidei o Vincent Ségal, que tem formação em música erudita e é uma sumidade em música brasileira, e ele chegou com essa proposta de um disco de música popular brasileira, mas com sonoridade de câmara. É uma dinâmica mais real de trabalhar os instrumentos a partir do som puro. Gravamos ao vivo, sem plugs, sem fones de ouvido. Isso dá mais vazão a espaços, pausas e respirações dentro da música”, comenta.

A delicadeza, em sua obra, não exclui a força. “Essas dualidades nunca estão separadas. Silêncio e som, sombra e luz, para ter um é preciso o outro”, comenta Ceumar. O jogo de contraste foi traduzido nos arranjos, forjados sobre cordas de violão, violoncelo e baixo, constituindo diferentes texturas para cada canção. “Sabíamos que queríamos uma mais cheia, outra mais vazia, mais colorida, mais densa”, exemplifica.

A reunião das 13 canções gravadas no álbum seguiu também trilha intuitiva. “Fechei o repertório e percebi que existia uma coerência entre as canções. Existe um rio permeando várias, falo de água, dessa metáfora do rio que corre para o mar, o que tem uma ligação com esse meu momento de saudade”, comenta.

Ceumar vive há cinco anos em Amsterdã, na Holanda. Mas gravou, em “Silencia”, a “Canção de Itanhandu”, em homenagem à cidade do sul de Minas onde nasceu. “Esse disco revela uma brasilidade e mineiridade mais intensas, porque estou fora agora. Talvez, antes, eu não tivesse essa consciência do meu lugar”, diz.

A escolha de viver além-mar, segundo ela, “tem a ver com liberdade”. “Eu gosto de estar em um lugar que não me pertence, poder usufruir daquilo, ver as pessoas e ouvir as línguas mil, ver os shows. Gosto dessa aventura de ser um pouco mais neutra no espaço”, conta.

Como artista, é um desafio inserir-se no novo cenário. “O processo é lento, construir uma carreira, como foi para mim aqui (no Brasil). Até hoje estou criando meu público”, diz.

Entre as experiências musicais que já teve por lá, das mais marcantes é o contato com a música africana em sua diversidade. “Eles têm muita abertura para as várias Áfricas, não só a dos ritmos, mas das melodias e instrumentos, como o kora, que eu adoro”, conta.

Dose dupla

Nesta quarta, às 12h30. Ceumar se apresenta pelo projeto Quarta Doze e Trinta na Praça de Serviços da UFMG, Campus Pampulha. Entrada franca.

Nesta quarta, às 21h. Show “Silencia”, no Teatro Bradesco (rua da Bahia, 2.244), (31) 3516-1360. R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia)