Artes cênicas

A vida por trás do picadeiro 

Artistas do Circo Maximum falam das dificuldades e delícias de viver de cidade em cidade fazendo a alegria do povo

Por Natália Oliveira
Publicado em 04 de outubro de 2015 | 03:00
 
 
Sérgio Brasil não usa os camarins para se arrumar Douglas Magno

“O difícil é ter que sorrir mesmo estando triste”. A frase dita com um sotaque carregado, um misto de português com espanhol, deixa escapar os traços de uma vida itinerante. Debaixo das tendas do circo, Geovani La Fuente Baldrrama, 37, nasceu no Brasil, cresceu na Bolívia e passou pela Argentina. De cidade em cidade, ele é um dos artistas que sobe ao picadeiro para arrancar sorrisos e deslumbramento do público.

Por trás das cortinas do palco, Baldrrama esperava para exibir um dos seus números, quando recebeu uma ligação da mãe da Bolívia. “Minha irmã, que também é do circo, tinha caído de uma altura muito grande e corria risco de morte. Enquanto ela era socorrida, raptaram meu sobrinho. Eu comecei a chorar muito, mas mesmo assim tive que subir ao palco e fazer as pessoas rirem, por que esse é o meu trabalho e o público esperava por isso”, relatou o artista.

Debaixo da lona, o clima do circo é de total alegria. Do lado de fora, a vida dos artistas é permeada por dificuldades e paixão pelo picadeiro. O trailer é a casa deles e a estrada, o quintal. Mudando de cidade periodicamente, é preciso deixar os amigos e a família para trás e seguir em busca de encantar cada vez mais públicos diferentes.

No palco do circo Maximus, dirigido por paranaenses, se apresentam artistas de todo mundo, Baldrrama é um deles. Ele é uma espécie de “faz tudo”, se equilibra sobre cilindros, se pendura nas alturas, desce em faixas, se arrisca no Globo da Morte e se apresenta com seu personagem mais famoso, o Caraca Maluco, uma versão do Michael Jackson misturada com um maluco, que arranca sorrisos e leva o público ao delírio.

Por trás das cortinas, ele também diverte os outros artistas. Brincalhão, ele passou a ser carinhosamente chamado de “maluco” pelos colegas. Diferente do palhaço, que, embora seja a figura mais engraçada do picadeiro, nos bastidores é mal-humorado. Quando soube que seria entrevistado, Sérgio dos Santos Brasil,39, fechou a cara e ficou em silêncio e só depois de alguns segundos sorriu e brincou: “Vejam só um palhaço mal- humorado”.

De família circense, desde quando era criança, Brasil já sonhava em ser palhaço. O personagem é um dos maiores sucessos do circo, mas ao mesmo é uma das funções mais desafiadoras. “O mais difícil é você conseguir arrancar um sorriso de uma pessoa, porque você não sabe o que ela passou ao longo do dia. Para você fazer chorar é fácil, agora para arrancar o sorriso é mais difícil. Então isso deixa o trabalho do palhaço mais emocionante, temos que arrancar o sorriso tanto de um adulto como o de uma criança,” enfatiza Brasil.

De segunda a segunda, pouco antes de subir ao palco, Brasil se arruma por trás da lona do circo. Com muita simplicidade, ele não usa os camarins. Sentado em uma cadeira de plástico, ele retira a maquiagem de uma lata, um pequeno espelho e começa a se transformar no personagem. Veste a roupa calmamente e complementa com os famosos sapatos enormes.

Acostumado com a rotina, ele diz que quem nasce no circo se apaixona pelo picadeiro e não se importa com a vida itinerante. “Não foi o circo que entrou na minha vida, fui eu que entrei na vida do circo, logo quando eu nasci”, relata. No entanto, como a maioria dos artistas, ele já não trabalha mais com a família.

“Chega um dia que eles pegam as coisas deles e vão embora”. É com essas naturalidade que o dono do circo, Maximus Clodimar de Jesus Vieira, 35, fala sobre as idas e vindas dos artistas que trabalham com ele. A família que gerencia o circo é do Paraná, mas Maximus já recebeu e continua recebendo profissionais de vários Estados do Brasil e do mundo. Ao todo cerca de 60 pessoas trabalham no espaço. Para ele, quem entra no circo, carrega junto o amor pela estrada.

“Em dezembro e janeiro, quando eu volto para minha terra no Paraná de férias, eu, minha mulher e meus filhos continuamos dormindo no trailer. Eu tenho a casa do meus pais, mas já me acostumei com o trailer”, declara Vieira. A casa com rodas tem toda infraestrutura, com TV de plasma, geladeira, fogão e chuveiro, afinal abriga a família também de fevereiro a novembro, durante a temporada circense.

Vieira já nem sabe há quanto tempo o Circo Maximus existe, já que foi passado de geração em geração e a mais longe que ele se lembra é a do avô, gerenciando o espaço. Agora, os filhos dele também já fazem parte do picadeiro. “Ele querem seguir carreira e um dia vão ser os herdeiros de tudo”, se orgulha.

Com as mudanças constantes de cidade, as crianças precisam trocar de escola quase mensalmente. Mesmo assim, o pai garante que isso não atrapalha o rendimento delas. “Nós colocamos eles em escolas particulares e os professores ajudam com o conteúdo, eles não saem prejudicados”, esclarece.

Por dois meses, o público belo-horizontino pôde aproveitar as atrações circenses, com a tenda montada no Boulevard Shopping, e na Pampulha, em uma área do Via Brasil, na avenida Pedro I e logo os artista vão pegar a estrada novamente em busca de despertar o deslumbramento e colocar o sorriso no rosto do público, que varia de crianças aos idosos, por outras cidades do Brasil.

 

Veja nosso registro sobre a vida dos artistas do Circo Maximus: