Crítica

Caixa com discos do Premê apresenta registros inéditos e canções censuradas

“Como Vencer na Vida Fazendo Música Estranha: Volume VII une humor popular a experimentalismo da linguagem

Por Raphael Vidigal
Publicado em 23 de julho de 2019 | 03:00
 
 
Atualmente o Premê conta com Marcelo Galbetti, Claus Petersen, Mário Manga e Wandi Doratiotto, que canta “Filme Triste” Alexandre Nunis/Divulgação

Censurada nos anos 80, a música “Casa de Massagem” surge em duas versões. A mais antiga traz o subtítulo “Quando Eles Eram Pobres”. Registrada em 2019, com o complemento “Depois Que Perderam Tudo: Um Plano”, a segunda versão inclui uma pergunta irônica na boca do narrador: “Tem golden shower lá?”, questiona.

Esse espírito irreverente e debochado marca a irregular carreira do Premê, grupo que nos primórdios era conhecido como Premeditando o Breque e que finalmente tem a sua obra relançada em um box com sete álbuns, entre eles “Como Vencer na Vida Fazendo Música Estranha: Volume VII”, onde aparecem as duas gravações citadas.

É nesse disco que estão os registros inéditos de canções que foram apresentadas somente em shows, o que o transforma no mais interessante da “Caixa do Premê”, batismo literal para a bonita embalagem em papelão que agrega os importantes álbuns “Premeditando o Breque” (1981), “Quase Lindo” (1983), “O Melhor dos Iguais” (1985), “Grande Coisa” (1986), “Alegria dos Homens” (1991) e “Vivo” (1996). 

Segundo colocado no Festival Universitário da TV Cultura em 1979, com a música “Brigando na Lua”, o Premê nunca foi um conjunto de sucessos populares, embora tenha tocado até em novela da TV Globo, com “São Paulo, São Paulo”, paródia para “New York, New York”. 

O fato de ter sido desbancado no referido festival da TV Cultura para “Diversões Eletrônicas”, de Arrigo Barnabé, esclarece o lugar que a trupe ocupava na música brasileira. Ao lado de nomes como Itamar Assumpção, Luiz Tatit, Eliete Negreiros e Tetê Espíndola, o Premê fez parte da chamada Vanguarda Paulista.

Novidades. A gênese do movimento, de propor uma nova linguagem para o cancioneiro tupiniquim, deu vazão a uma pretensão no trabalho do Premê: aliar o canto falado e o experimentalismo formal das melodias a um humor popular. Nas faixas de “Como Vencer na Vida Fazendo Música Estranha”, essas tentativas apresentam resultados diversos.

Responsável por abrir os trabalhos, “Balada de James Blenger” chega às raias do insuportável, com seus nove minutos de duração e a letargia intencional da letra, recheada de associações a experiências lisérgicas. “Zuleika e Gaspar” flagra um casal de meia-idade às voltas com as crises da vida conjugal e só rebobina clichês.

“Festival de Bolachas” muda o patamar do álbum e revela uma das qualidades do grupo. Ao criar um pastiche dos antigos sambas de breque, a ironia soa moderna e ganha frescor. “Valsa Didática” segue a mesma linhagem. “O Destino Assim o Quis” tem uma das melhores sacadas. “É muito nome pruma só muié/ E pra esse teu criado que se chama Zé”, lamenta o eu lírico ao comentar o fim do romance com Isabel de Lourdes Souza Admetirdes da Fonseca e Silva de Leão Monteiro. 

“Pinga com Limão” aposta mais no rock do ritmo do que no texto, ao contrário de “Frevo Franga”, a rigor um chorinho, com sua letra minimalista que diz muito: “Diz pra mim, Esmeralda/ Pra onde vai a passarada/ Quando chove de enxurrada, hein?”. “Drama de Angélica” acrescenta tempero operístico ao caldo, com rimas para lá de sagazes. “Baião” comprova a destreza musical dos integrantes. Já “Macho Ok” assusta pela atualidade de sua mordaz sátira sobre os costumes. 

Assista ao mais novo videoclipe do Premê: