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Conheça o estúdio Engenho, lugar onde passa a música de BH

O estúdio, comandado por André Cabelo e Gustavo Campos, faz 20 anos como referência para artistas da capital

Por Johnatan Castro
Publicado em 08 de setembro de 2017 | 03:00
 
 
Os fundadores do estúdio, Gustavo Campos e André Cabelo (dir.) Fred Magno

Não é exagero dizer que pela sala do estúdio Engenho, em Belo Horizonte, já passou de tudo. No espaço que se tornou uma referência para a música da capital mineira – e que em 2017 completa 20 anos de fundação – já teve banda de thrash metal acendendo velas para invocar forças ocultas para ajudar na gravação, banda de forró promovendo encontros e querendo fazer churrasco, evangélicos e metaleiros se esbarrando pelos corredores, banda do interior que traz colchonetes para “acampar” durante o fim de semana e roqueiros tocando enquanto secavam latas e mais latas de cerveja. Nessas duas décadas de trabalho, os sócios André Tavares, conhecido como André Cabelo, 45, e Gustavo Campos, 41, colecionaram boas histórias, perrengues e amizades construídas da mesma forma que o estúdio, pouco a pouco e com as próprias mãos.

Embora tenha sido oficialmente fundado em 1997, a história do Engenho começou cerca de dez anos antes, a partir da relação de Cabelo com o rock e com a cena de metal de Belo Horizonte. Em 1985, depois de vibrar com a apresentação do Iron Maiden no Rock in Rio, ele decidiu que queria tocar guitarra e formou a banda Alma Gêmea. Mas foi depois de uma visita ao estúdio amador de Haroldo Ferretti, que viria a se tornar baterista do Skank, que Cabelo decidiu que poderia usar o porão da casa dos pais para fazer as suas próprias gravações.

“O tamanho do estúdio, que era no fundo da casa dele, era mais ou menos do mesmo tamanho de um porão que eu tinha em casa. Aí falei: ‘dá para fazer um estúdio assim também’. A geografia é mais ou menos a mesma”, conta o guitarrista e técnico de som, que depois de integrar a banda Vultur nos anos 80 e 90 entrou para a Chakal, que foi fundada nesse período e ainda está em atividade.
“Gravar em fita cassete era uma forma de ouvir. Naquela época, as bandas tinham a coisa de fazer shows e ensaiar, mas você não sabia o que estava tocando porque não tinha como ouvir. E quando você começa a ouvir, começa a querer melhorar seu som”, avalia.

Evoluir, aliás, é algo que combina com Cabelo e com o Engenho, localizado no bairro Jardim América, na região Oeste da cidade. Com um ritmo intenso de gravações, o estúdio sem placa na porta ou endereço no Google recebe atualmente nomes que vão de Geraldo Vianna, Sérgio Pererê e Túlio Mourão a Titane, Toninho Horta e Juarez Moreira. Também têm passagem pelo local as bandas Tianastácia, Uakti e Holocausto, além de artistas evangélicos e infantis e orquestras. O Engenho ainda desenvolve um trabalho de captação de áudio e trilha sonora para cinema e outras produções audiovisuais.

Tudo isso se deve ao trânsito dos sócios pela cena musical de Belo Horizonte. Cabelo já trabalhou em praticamente todos os estúdios musicais da cidade. Ele já conduzia ensaios de bandas, fazia gravações em cassete no porão de casa e trabalhava com o grupo Virna Lise quando, em 1994, começou a trabalhar no estúdio Gênesis, também em BH.

“Foi muito engraçado porque esse é o episódio que foi meu marco com estúdio. Fui para assistir a gravação e o Rui, que é o proprietário até hoje, pediu para eu ficar na mesa de som. Disse ‘aqui é o rec, aqui é o stop, aqui é o play”, diz Cabelo, que também comanda a mesa de som em eventos.

Mãos à obra. A transição dos trabalhos informais para a abertura da empresa se deu em função dos projetos no mercado da publicidade. Cabelo e Campos investiram em um terreno ao lado do estúdio original e construíram o novo Engenho, que tem cinco ambientes para gravação e salas de mixagem. “A gente literalmente fez esse estúdio. A parte elétrica, a parte acústica, a parte de marcenaria, tudo. O pedreiro entregou a parede no tijolo. Tudo foi feito na unha. E isso acaba dando uma relação com o lugar, você consegue extrair mais dele”, pontua Cabelo.

Os empresários precisaram até mesmo pedir pagamento adiantado para a primeira cantora que gravaria no lugar. “A gente pegou o dinheiro em novembro para conseguir gravar em março”.

Histórias de perrengues também não faltam no Engenho, como quando os técnicos pensaram ter perdido três horas da gravação de áudio de um comercial que gravavam com a dupla César Menotti e Fabiano.

“Era uma marca de carne. O cachê dos caras era milionário. No intervalo eu dei o play e não tocava nada. A gente foi ficando branco, sem saber o que fazer. Aí conectamos o HD no computador e estava tudo lá. Mas imagina dizer que perdemos 70% do trabalho? É fim de carreira”, destaca Campos.

Mas não foi o fim, e a empresa acabou se tornando um ponto de apoio para os artistas locais. “Deu uma nivelada no mercado de estúdio mundial. Basicamente o que se usa aqui se usa em qualquer lugar. Não tem mais segredo. Antigamente, o melhor estúdio tinha o melhor microfone, a melhor sala e a melhor mesa de som. Hoje, o melhor estúdio é o que tira o melhor som, independente se tem um microfone de U$S 1.000 ou de U$S 50 dólares”, finaliza Campos.