Cinema

Dia de homenagem a Chaplin 

No Festival de Veneza, “La Rançon de la Gloire, do francês Xavier Beauvois, presta tributo ao cineasta britânico

Por Da Redação
Publicado em 29 de agosto de 2014 | 03:00
 
 
Xavier Beauvois com as atrizes Seli Gmach e Nadine Labak Andrew Medichin/ap

 

Veneza, Itália. Com “La Rançon de la Gloire” (“O Preço da Fama”), concorrente ao Leão de Ouro, o diretor francês Xavier Beauvois faz uma divertida e terna homenagem a Charlie Chaplin. Homenagem, digamos também, meio enviesada.

A história tem como protagonistas uma dupla de amigos, Eddy (Benoit Poelvoorde) e Osman (Roschdy Zem). Osman espera Eddy na saída da prisão e o leva para casa, onde mora com a filha. Sua mulher está no hospital curando-se de um problema ortopédico. Eddy é um tipo meio trapalhão e logo aparece em casa com uma série de presentes, entre os quais uma televisão. O primeiro programa que veem traz a notícia da morte de Charles Chaplin, no dia de Natal de 1977. Osman não tem dinheiro para tratar da mulher, mas Eddy logo bola um plano mirabolante para tirá-los das dificuldades financeiras.

O filme foi bem recebido e, de fato, é simpático. Um momento de leveza entre obras sérias e pesadas que têm chegado ao Lido. Em entrevista, Beauvois contou que tudo surgiu de Chaplin, do mistério e encantamento com esse homem, cuja carreira começou nos primórdios do cinema e cujo personagem – Carlitos – seduz a todos ainda hoje.

Para muitos, e para Beauvois, Chaplin é o gênio definitivo desta arte. Beuvois contou também que leu em algum lugar a história de dois vagabundos que, três meses depois do enterro de Chaplin, violaram o túmulo, sequestraram o caixão e exigiram resgate para devolver o corpo. Parecia mentira de tão incrível, mas, pesquisando na internet, descobriu que a história era rigorosamente verdadeira. Daí teve a ideia do filme. Com uma trama dessas, teria mesmo de fazer um trabalho leve, bem-humorado e que se torna, afinal, num preito ao humor e ao humanismo do velho Chaplin.

Filmando em Vevey, na Suíça, Beauvois trabalha com cores sóbrias e depois passa a um colorido mais intenso quando Eddy encontra sua vocação circense pelas mãos da bela Chiara Mastroianni. Muito do acerto cômico de “O Preço da Fama” se deve à boa química entre os atores, em especial entre os dois protagonistas. Há entre eles aquela tensão que vem da disparidade de temperamentos, um mais sonhador, outro mais pé no chão. Nada que você não tenha visto em dezenas de outros filmes. O inusitado aqui é a história. E o fato de Beauvois ter conseguido imprimir tom chapliniano àquilo de relata. Pode não ser um grande filme (e não é), mas foi um saboroso refresco neste início de festival, um tanto pesado embora de boa qualidade.

O peso maior veio do documentário “The Look of Silence”, sobre o genocídio na Indonésia de Suharto, no qual mais de um milhão de pessoas foram massacradas, acusadas de serem comunistas. Quem o dirige é o texano Joshua Oppenheimer, que já havia visitado o tema em “Act of Killing”. Ele disse que se sentiu tão impactado pela tragédia política do país que resolveu revisitá-la sob outro ponto de vista. Em “Act of Killing”, eram os torturadores e assassinos que descreviam suas ações em minúcias. Agora, traz-se o olhar das vítimas. E, metaforicamente, quem conduz a investigação é um técnico em oftalmologia, que visita camponeses para detectar seus problemas de visão e receitar-lhes óculos. Esse personagem, que interroga as pessoas e chega aos criminosos confessos, permanece anônimo por questão de segurança. Boa parte da equipe também prefere ficar no anonimato. As imagens em alta definição jogam o espectador no ambiente da tragédia.