Música

Diversos tons de Bituca 

Coletânea “Mil Tom celebra carreira do compositor mineiro com 30 releituras contemporâneas

Por lucas buzatti
Publicado em 18 de abril de 2015 | 03:00
 
 
Gustavo Andrade/O Tempo

A década em curso tem sido importante para Milton Nascimento. Em 2012, o cantor e compositor mineiro completou 50 anos de carreira e comemorou, também, os 40 anos do icônico Clube da Esquina. Mas os festejos não param por aí: no início de 2015, o produtor musical Pedro Ferreira iniciou um projeto com o intuito de celebrar a obra de Bituca por meio de releituras de artistas e bandas contemporâneas. O resultado é o disco “Mil Tom”, que já está em gravação e será lançado gratuitamente pelo site “Scream & Yell”, no início de junho.

O trabalho contará com 30 faixas, divididas em dois discos e interpretadas por 32 artistas, de 11 Estados e diferentes gêneros – do rap ao pop, do rock à música instrumental. “Milton é uma influência forte para muitos grupos atuais, não só de Minas mas de todo o país”, pontua o produtor. “Suas composições, voz marcante e riqueza melódica o colocam entre os artistas mais importantes do país. Quando se pensa em voz, no Brasil, vêm à cabeça Milton, Elis Regina e Tim Maia”, opina.

Ferreira afirma que escolheu artistas que se inspirara na música de Milton Nascimento. “É importante lembrar que não se trata de um disco de covers, mas de releituras. Portanto, deixei os convidados a vontade para criarem suas versões”, pontua. “A ideia de misturar gêneros é fugir do comum. Seria óbvio fazer uma homenagem ao Milton apenas com artistas da MPB. Eu queria pegar diferentes estéticas e gerações musicais, para mostrar essa multiplicidade de tons que a música dele tem”. Outro parâmetro para a escolha dos grupos foi a proximidade de cada um com o próprio Milton. “Tem o Tono, do Rio, banda do Bem Gil, filho do Gilberto, que é amigo do Milton. Tem o Dani Black, que é um cantor de São Paulo que é muito amigo dele. Milton já disse até que aprende mais com o Dani do que o contrário. Tem a Thaís Gulin, que faz um trabalho autoral que o Milton adora”, exemplifica.

A curitibana Thaís Gulin conta que a voz “de outro mundo” do cantor mineiro a impressiona desde criança. “Minha mãe escutava Milton, e aquela voz me fascinava”, diz. “Sempre escolho canções lado B para regravar. Mas, dessa vez, quis pegar ‘Amor de Índio’, que é um clássico. Vai ser desafiador. O disco tem artistas muito criativos, acho que o público vai pirar”, aposta.

Já Aline Calixto interpreta “Vera Cruz”, que passeia entre o mainstream e o lado B. “É um música bem conhecida dos fãs de Milton, embora não seja um de seus clássicos. Tem melodias lindas, me toca muito. E não é uma canção fácil de interpretar. Mas com dedicação tudo é possível”, pontua. “Nasci no Rio, mas fui criada em Minas. Como o Milton, sempre me chamam de mineira, título que absorvi com naturalidade. Afinal, apesar de fazer samba, bebo da fonte de artistas mineiros e me preocupo muito com a harmonia e a melodia”, conta Aline.

Outro representante mineiro em “Mil Tom” foi o Dom Pepo, promissora banda de Belo Horizonte. “Milton é um grande ídolo nosso. Tem um marca enorme nas nossas composições e é trilha sonora constante de viagens e encontros”, relata o baixista André Miniza. “A escolha de ‘Credo’ caiu como uma luva. É uma música revolucionária. Tem tudo a ver conosco, já que montamos a banda na época das manifestações e ocupações de 2013. E fazer uma interpretação contemporânea de um cara vivo e importante como Milton é uma grande honra”, sublinha.

Esse é a segunda coletânea realizada por Pedro Ferreira – jovem produtor musical de 23 anos, residente e natural de Mariana. A primeira foi “Re-Trato”, que contou com 32 releituras de Los Hermanos. “Foi um disco que teve grande alcance, com mais de 600 mil acessos. A releitura que o Cícero fez de ‘Conversas de Botas Batidas’ ganhou o Prêmio Multishow, em 2012, na categoria versão do ano”, conta. “Muito desse sucesso foi por conta do apoio do Los Hermanos. A banda compartilhou o disco várias vezes. Quando os encontrei, estavam super agradecidos. Lembro que o Barba (bateria) disse que a versão do Fusile para ‘Azedume’ tinha sido sua preferida”, completa o produtor.‘Na raça’.

Pedro Ferreira ressalta que os discos foram realizados de forma totalmente independente – sem qualquer tipo de apoio, patrocínio ou incentivo estatal. “São homenagens bem sinceras, que só conseguimos realizar dessa forma, de graça, na internet. Sem fins lucrativos e sem burocracia de direitos autorais”, pontua.

“É tudo feito ‘na raça’. Dá um trabalho grande, principalmente a produção executiva. Ligar para tantos artistas, explicar o projeto, escolher as músicas. A gravação fica por conta dos artistas, que me enviam as músicas prontas. No caso do ‘Mil Tom’, todas as versões serão finalizadas até 15 de maio, para que possamos organizar o disco e lançá-lo logo no começo de junho”, explica o produtor musical.

Mas o que motiva Pedro Ferreira a se dedicar tanto? “Essas coletâneas servem como vitrine para novos artistas, jogando luz nessa geração musical. Sem contar que fazem perpetuar o legado importantíssimo de figuras como a do próprio Milton”, conclui.